- ID
- 1606867
- Banca
- FCC
- Órgão
- TRT - 3ª Região (MG)
- Ano
- 2015
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Céu da Boca
Uma das sedes da nostalgia da infância, e das mais
profundas, é o céu da boca.
A memória do paladar recompõe com precisão instantânea,
através daquilo que comemos quando meninos, o
menino que fomos. O cronista, se fosse escrever um livro de
memórias, daria nele a maior importância à mesa de família, na
cidade de interior onde nasceu e passou a meninice. A mesa
funcionaria como personagem ativa, pessoa da casa, dotada do
poder de reunir todas as outras, e também de separá-las, pelo
jogo de preferências e idiossincrasias do paladar − que digo? da
alma, pois é no fundo da alma que devemos pesquisar o
mistério de nossas inclinações culinárias.
A mesa mineira era grande, inteiriça e de madeira clara.
À esquerda e à direita, estiravam-se dois bancos compridos, em
que irmãos e parentes em visita se sentavam por critério
hierárquico. À cabeceira, na cadeira de jacarandá e palhinha, o
pai presidia.
A comida, imune a influências no meio ilhado entre
montanhas, era simples, simples a lembrança que deixou; e
quem dela se nutriu quase sempre torce o nariz aos requintes,
excentricidades ou meras variedades culinárias de outras terras.
(Adaptado de: ANDRADE, Carlos Drummond de. A bolsa e a
vida. São Paulo, Companhia das Letras, 2012, p. 91-92.)
Uma característica do gênero crônica verificável no texto é: