SóProvas


ID
1648909
Banca
IESES
Órgão
MSGás
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

O homem que espalhou o deserto

    Quando menino, costumava apanhar a tesoura da mãe e ia para o quintal, cortando folhas das árvores. Havia mangueiras, abacateiros, ameixeiras, pessegueiros e até mesmo jabuticabeiras. Um quintal enorme, que parecia uma chácara onde o menino passava o dia cortando folhas. A mãe gostava, assim ele não ia para a rua, não andava em más companhias. E sempre que o menino apanhava seu caminhão de madeira (naquele tempo, ainda não havia os caminhões de plástico, felizmente) e cruzava o portão, a mãe corria com a tesoura: tome filhinho, venha brincar com as suas folhas. Ele voltava e cortava. As árvores levavam vantagem, porque eram imensas e o menino pequeno. O seu trabalho rendia pouco, apesar do dia a dia constante, de manhã à noite. 

      Mas o menino cresceu, ganhou tesouras maiores. Parecia determinado, à medida que o tempo passava, a acabar com as folhas todas. Dominado por uma estranha impulsão, ele não queria ir à escola, não queria ir ao cinema, não tinha namoradas ou amigos. Apenas tesouras, das mais diversas qualidades e tipos. Dormia com elas no quarto. À noite, com uma pedra de amolar, afiava bem os cortes, preparando-as para as tarefas do dia seguinte. Às vezes, deixava aberta a janela, para que o luar brilhasse nas tesouras polidas. 

      A mãe, muito contente, apesar do filho detestar a escola e ir mal nas letras. Todavia, era um menino comportado, não saía de casa, não andava em más companhias, não se embriagava aos sábados como os outros meninos do quarteirão, não frequentava ruas suspeitas onde mulheres pintadas exageradamente se postavam às janelas, chamando os incautos. Seu único prazer eram as tesouras e o corte das folhas.

      Só que, agora, ele era maior e as árvores começaram a perder. Ele demorou apenas uma semana para limpar a jabuticabeira. Quinze dias para a mangueira menor e vinte e cinco para a maior. Quarenta dias para o abacateiro que era imenso, tinha mais de cinquenta anos. E seis meses depois, quando concluiu, já a jabuticabeira tinha novas folhas e ele precisou recomeçar. 

     Certa noite, regressando do quintal agora silencioso, porque o desbastamento das árvores tinha afugentado os pássaros e destruído ninhos, ele concluiu que de nada adiantaria podar as folhas. Elas se recomporiam sempre. É uma capacidade da natureza, morrer e reviver. Como o seu cérebro era diminuto, ele demorou meses para encontrar a solução: um machado. 

     Numa terça-feira, bem cedo, que não era de perder tempo, começou a derrubada do abacateiro. Levou dez dias, porque não estava acostumado a manejar machados, as mãos calejaram, sangraram. Adquirida a prática, limpou o quintal e descansou aliviado. 

     Mas insatisfeito, porque agora passava os dias a olhar aquela desolação, ele saiu de machado em punho, para os arredores da cidade. Onde encontrava árvore, capões, matos, atacava, limpava, deixava os montes de lenha arrumadinhos para quem quisesse se servir. Os donos dos terrenos não se importavam, estavam em via de vendê-los para fábricas ou imobiliárias e precisavam de tudo limpo mesmo.

      E o homem do machado descobriu que podia ganhar a vida com o seu instrumento. Onde quer que precisassem derrubar árvores, ele era chamado. Não parava. Contratou uma secretária para organizar uma agenda. Depois, auxiliares. Montou uma companhia, construiu edifícios para guardar machados, abrigar seus operários devastadores. Importou tratores e máquinas especializadas do estrangeiro. Mandou assistentes fazerem cursos nos Estados Unidos e Europa. Eles voltaram peritos de primeira linha. E trabalhavam, derrubavam. Foram do sul ao norte, não deixando nada em pé. Onde quer que houvesse uma folha verde, lá estava uma tesoura, um machado, um aparelho eletrônico para arrasar. 

     E enquanto ele ficava milionário, o país se transformava num deserto, terra calcinada. E então, o governo, para remediar, mandou buscar em Israel técnicos especializados em tornar férteis as terras do deserto. E os homens mandaram plantar árvores. E enquanto as árvores eram plantadas, o homem do machado ensinava ao filho a sua profissão.

BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Cadeiras proibidas. São Paulo: Global, 2002. 

Com relação à concordância verbal e nominal, observe os seguintes períodos retirados do texto.

Havia mangueiras, abacateiros, ameixeiras, pessegueiros e até mesmo jabuticabeiras."

“Importou tratores e máquinas especializadas do estrangeiro."

I. Existem alguns verbos particulares como haver e fazer que são denominados impessoais e não têm sujeito. Tais verbos ficam sempre na terceira pessoa do singular.

II. O verbo haver quando empregado com o sentido de existir ou acontecer tem sujeito com o qual, evidentemente, concorda.

III. No segundo período, o adjetivo especializadas concorda com o substantivo mais próximo dele (máquinas). De acordo com a regra, teríamos outra possibilidade de concordância: “tratores e máquinas especializados". Nesse caso, como os substantivos são de gêneros diferentes, prevalece o adjetivo no masculino plural.


Assinale a alternativa correta: 

Alternativas
Comentários
  • Verbo ''haver'' e suas diferentes construções

    Por Thaís Nicoleti

    “Haverão mudanças, mas creio que serão pequenas.” (errado)

    O verbo “haver”, no sentido de “ocorrer” ou “existir”, é impessoal. Isso quer dizer que permanece na terceira pessoa do singular, pois não tem sujeito.

    A confusão é frequente não só na hora de escrever mas também na hora de falar. Muita gente faz a flexão do verbo, como se seu objeto direto fosse seu sujeito. É possível que a origem do erro esteja na analogia com os verbos “existir” e “ocorrer”. Estes têm sujeito – e, portanto, as flexões de número e pessoa – e costumam antepor-se a ele. Assim:

    Ocorrerão mudanças.

    Existirão mudanças.

    Com o verbo “haver”, a história é outra:

    Haverá mudanças.

    É importante observar que os verbos auxiliares assumem o comportamento dos verbos principais. Assim, temos o seguinte:

    Deverão ocorrer mudanças.

    Deverão existir mudanças.

    Deverá haver mudanças.

    Não se pode, no entanto, dizer que o verbo “haver” nunca vai para o plural, pois isso não é verdade. Ele pode, por exemplo, ser um verbo auxiliar (sinônimo de “ter” nos tempos compostos), situação em que pode ir para o plural. Assim:

    Eles haviam chegado cedo.

    Eles tinham chegado cedo.

    Como verbo pessoal (com sujeito), pode assumir o sentido de “obter”:

    Houveram do juiz a comutação da pena.

    Como sinônimo de “considerar”, também tem sujeito:

    Nós o havemos por honesto.

    O mesmo comportamento se observa quando empregado na acepção de “comportar-se”:

    Eles se houveram com elegância diante das críticas.

    O plural também pode aparecer quando usado com o sentido de “lidar”. Assim:

    Os alunos houveram-se muito bem nos exames.

    Fique claro, portanto, que é no sentido de “existir” e de “ocorrer”, bem como na indicação de tempo decorrido (Há dois anos...), que o verbo “haver” permanece invariável. Assim:

    Haverá mudanças, mas creio que serão pequenas.

    Fonte: http://educacao.uol.com.br/dicas-portugues/verbo-haver-e-suas-diferentes-construcoes.jhtm


  • Na primeira assertiva, o SEMPRE não torna ela falsa? Visto que ocorrem algumas variações dependendo do contexto..

  • Gabarito A

    I- CERTA

    II- ERRADA:O verbo Haver no sentido de existir, acontecer não tem sujeito.E sempre fica na 3ª pessoal do singular.

    II-CERTA

  • Gabarito: A


    I - CORRETA

    Verbo "HAVER" e "FAZER" indicando tempo decorrido -------> 3ª pessoa do singular

    Verbo "HAVER" com sentido de "existir" ---------> 3ª pessoa do singular


    II - ERRADA

    O verbo "HAVER" quando empregado com o sentido de existir ou acontecer NÃO tem sujeito.


    III - CORRETA

    Quando o adjetivo vier depois dos substantivos, há 2 possibilidades de concordância:


    - o adjetivo concorda com o mais próximo.

     Ex.: “Importou tratores e máquinas especializadas do estrangeiro."


    - substantivos de gêneros diferentes prevalece o masculino.

    Ex.: "Tratores e máquinas especializados."



    Meus caros, vamos pensar igual à banca. Nesta questão, não se preocupe com o "SEMPRE" do item I. 

    Por quê?

    Repare que não há nenhuma assertiva tecendo que, apenas, o item "III" está correto. Portanto, no contexto da questão em tela, a única alternativa aceitável é, mesmo, a letra "a".

    Minha dica: não vá de encontro a, mas sim ao encontro da banca.


  • Fazer não é verbo impessoal sempre. A meu ver está correta apenas a afirmativa III.

  • Haver e Fazer indicando tempo é impessoal e fica sempre na 3ª pessoa do singular.

    Haver com valor existencial fica na 3ª pessoa do singular, em outros sentidos o verbo "haver" se flexiona normalmente.
    Questão fácil de ser anulada.

  • Adjetivo posposto a mais de um substantivo: a concordância acontece com ambos (no masculino, quando há pelo menos um termo masculino), ou com o substantivo mais próximo.

  • Conforme leciona Fernando Pestana página 696, o verbo haver com sentido de existência, ocorrência ou tempo decorrido é verbo impessal, isto é, não tem sujeito e são usados na 3 pessoa do singular. Entretanto, o verbo haver pode ser pessoal, ou seja, ter sujeito, se fizer parte de uma locução verbal como auxiliar ou se tiver outros sentidos:  'Os criminosos se houveram com a justiça''. 'Os rivais se houveram no ringue''. Adicionalemente, ele fala que o verbo fazer também pode ser pessoal, ou seja, ter sujeito. Logo, não é possível afirmar que SEMPRE serão ficaram na terceira pessoa do singular.

  • GABARITO A

     

     

    GABARITO A

     

     

    VERBO FAZER NO SENTIDO DE TEMPO TRANSCORRIDO FICARÁ NO SINGULAR.

    VERBO HAVER NO SENTIDO DE EXISTIR SERÁ SEMPRE IMPESSOAL E POR ISSO FICARÁ SEMPRE NO SINGULAR.

     

    bons estudos.