Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe
beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos
e eu parti.
Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha
instalação.
Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por
um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor
que de tempos a tempos reformava o estabelecimento,
pintando-o jeitosamente de novidade, como os
negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de
última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado
crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a
simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo
vistoso dos anúncios.
O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família
do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o
seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda
pelas províncias, conferências em diversos pontos da
cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares,
fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido
concurso de professores prudentemente anônimos,
caixões e mais caixões de volumes cartonados em
Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte
com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas,
em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se
ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos
confins da pátria. Os lugares que os não procuravam
eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita,
espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a
farinha daquela marca para o pão do espírito.
POMPÉIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.
Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o
narrador revela um olhar sobre a inserção social do
colégio demarcado pela