SóProvas


ID
1758802
Banca
FCC
Órgão
TJ-SE
Ano
2015
Provas
Disciplina
Direito Civil
Assuntos

Considere o seguinte texto: Propende o Direito moderno para atender mais ao conjunto do que às minúcias, interpretar as normas com complexo ao invés de as examinar isoladas, preferir o sistema à particularidade. Se isto se diz da regra escrita em relação ao todo, por mais forte razão se repetirá acerca da palavra em relação à regra. Ater-se aos vocábulos é processo casuístico, retrógrado. Por isso mesmo se não opõe, sem maior exame, pode a deve, não pode a não deve (soll e muss, kann nicht e darf nicht, dos alemães; may e shall, dos ingleses e norte-americanos) (cf. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 270).

Agora, compare o artigo 924 do Código Civil de 1916 com o artigo 413 do Código Civil de 2002, cujas disposições são as seguintes, respectivamente:

Art. 924, CC/1916. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento.

Art. 413, CC/2002. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

À vista do texto doutr inário e das disposições legais acima,

Alternativas
Comentários
  • Correta Letra C) no artigo 924 do Código Civil de 1916, ao verbo poder era possível conferir o efeito de dever.


    É uma questão de interpretação de texto. O doutrinador, no trecho transcrito, rechaça a interpretação puramente literal da norma ("Ater-se aos vocábulos é processo casuístico, retrógrado") e defende uma interpretação sistemática ("Propende o Direito moderno para atender mais ao conjunto do que às minúcias, interpretar as normas com complexo ao invés de as examinar isoladas, preferir o sistema à particularidade."). Sob essa perspectiva, a partir de uma interpretação sistemática (mormente considerando a vedação de enriquecimento ilícito, os princípios da razoabilidade e proporcionialidade, etc.), é possível atribuir ao vocábulo "poder" a acepção de "dever", referido no art. 924, CC/1916 (Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento), ou seja, passando a se compreender que o juiz não possui a mera faculdade/arbítrio de reduzir proporcionalmente a pena, mas de um dever jurídico para evitar situações desproporcionais, readequando a pena pecuniária face ao cumprimento parcial da obrigação.


    Espero ter sido claro.


    Bons Estudos. 

  • Acrescentando, enunciado 356 da V Jornada de Direito Civil- " art. 413. Nas hipóteses previstas no arti. 413 do Código Civil, o juiz DEVERÁ reduzir a clásula penal de ofício."

  • GABARITO: C

     

  • Candidato que sé decora código não sabe fazer essa questão, muito boa. GAB C, o CC16 deve ser interpretado a luz da CF88, implicando num dever do juiz.

  • É cada questão 

  • Consegui resolver a questão sob uma outra ótica. Sistematicamente falando, tanto no CC/16 quanto no de 2002, a redução da cláusula penal pode ser realizada de ofício, a diferença é que no CC/16 utilizava-se o princípio da proporcionalidade (ou seja, o juiz reduzia de acordo com o "quantum" já cumprido da obrigação). Hoje no CC/02 o princípio aplicado é o da equidade, o juiz deve reduzir verificando caso a caso a natureza e a finalidade do contrato.

    Talvez tenha dado sorte, mas isso pode ajudar os colegas futuramente.

    Bons estudos, pessoal!

  • Art. 924, CC/16. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento.

    Art. 413, CC/02. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

  • Embora a operabilidade seja uma característica muito mais associada ao CC/2002, o que me ajudou a resolver a questão foi observar a data em que foi escrito o texto cujo trecho foi transcrito (1979).

    Assim, mesmo antes da CF/88 e do próprio CC/02, o texto está reconhecendo a necessidade de se interpretar sistematicamente e finalisticamente o próprio CC/16.

    Bons estudos!

  • A questão trata da interpretação e aplicabilidade das normas jurídicas.

    Código Civil de 1916:

    Art. 924, CC/1916. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento.

    Código Civil de 2002:

     

    Art. 413, CC/2002. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

    Interpretação sistemática: relaciona-se com a interpretação lógica. Daí por que muitos juristas preferem denominá-la interpretação lógico-sistemática. Parte do pressuposto de que uma lei não existe isoladamente e deve ser interpretada em conjunto com outras pertencentes à mesma província do direito. Assim, uma norma tributária deve ser interpretada de acordo com os princípios que regem o sistema tributário. Em determinado momento histórico, por exemplo, predominava o princípio da autonomia da vontade. Com o surgimento do intervencionismo na economia contratual, a interpretação sistemática conduziu à proteção do contratante mais fraco. (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Esquematizado v. 1. – 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014).

    Os conflitos entre as regras do Direito, porventura revelados, deverão ser solucionados mediante a interpretação sistemática. O aplicador do Direito, recorrendo aos subsídios da hermenêutica jurídica, deverá redefinir o Direito Positivo como um todo lógico, como unidade de fim capaz de irradiar segurança e justiça.

    Ainda que mal elaboradas sejam as leis,10 com visível atraso em relação ao momento histórico; ainda que apresentem disposições contraditórias e numerosas lacunas ou omissões, ao jurista caberá, com a aplicação de seu conhecimento científico e técnico, revelar a ordem jurídica subjacente. Em seu trabalho deverá submeter as regras à interpretação atualizadora, renovando a sua compreensão à luz das exigências contemporâneas; deverá expungir, não considerar, as regras conflitantes com outras disposições e que não se ajustem à índole do sistema; preencher os vazios da lei mediante o emprego da analogia e da projeção dos princípios consagrados no ordenamento. (Nader, Paulo. Introdução ao estudo do direito / Paulo Nader – 36.a ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014).

    As disposições, consideradas individualmente, não possuem sentido e constitui uma temeridade a leitura isolada de preceitos, sem o conhecimento prévio do conjunto em que se inserem. A íntima vinculação existente entre as partes de um código influencia nos critérios de interpretação. Esta deve ser sistemática. Ao interpretar, o hermeneuta procede à exegese do Direito, ainda que a sua atenção esteja voltada para um artigo, pois cada fragmento do código só possui vida e sentido quando relacionado com o texto geral. Igualmente procede o juiz. Quando fundamenta a sua decisão em um dispositivo do código, aplica, na realidade, não apenas o dispositivo isolado, mas o ordenamento jurídico em vigor. (Nader, Paulo. Introdução ao estudo do direito / Paulo Nader – 36.a ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014).

    A) tanto no artigo 924 do Código Civil de 1916, como no artigo 413 do Código Civil de 2002, só é possível interpretar os verbos poderdever no sentido de mera faculdade conferida ao juiz.

    No artigo 924 do Código Civil de 1916, através da interpretação sistemática, era possível conferir ao verbo “poder" o sentido de “dever", não sendo uma mera faculdade conferida ao juiz.

    Incorreta letra “A".



    B) o texto do artigo 924 do Código Civil de 1916 é irremediavelmente antinômico ao do artigo 413 do Código Civil de 2002.


    O texto do artigo 924 do Código Civil de 1916 não é irremediavelmente antinômico (contraditório, oposto) ao do artigo 413 do Código Civil de 2002. A redação do artigo é diferente, mas possui o mesmo sentido, o que se alcança através da interpretação.

    A maior diferença entre os dois textos está na forma em que a penalidade deverá ser reduzida: no art. 924 do CC/16 a penalidade deverá ser reduzida de forma proporcional, e no art. 413 do CC/02 a penalidade deverá ser reduzida de forma equitativa.

    Incorreta letra “B".


    C) no artigo 924 do Código Civil de 1916, ao verbo poder era possível conferir o efeito de dever.


    No artigo 924 do Código Civil de 1916, ao verbo poder era possível conferir o efeito de dever.

    Correta letra “C". Gabarito da questão.


    D) ambos os textos legais só comportam interpretação literal, não sendo possível aproveitar o texto doutrinário.

    Ambos os textos legais comportam interpretação sistemática, sendo possível aproveitar o texto doutrinário.

    Incorreta letra “D".



    E) o texto doutrinário é inaplicável ao Direito brasileiro, porque o autor só invoca o que ocorre entre os alemães, ingleses e norte-americanos.

    O texto doutrinário é aplicável ao Direito brasileiro, mesmo que o autor invoque o que ocorra entre alemães, ingleses e norte-americanos. As regras devem ser submetidas à interpretação atualizadora, renovando-se a sua compreensão às exigências contemporâneas.

    Incorreta letra “E".



    Resposta: C

    Gabarito do Professor letra C.

  • Apesar dos comentários de todos os colegas, o fato de a questão cobrar conhecimento sobre o Código Civil de 1916 e o sistema jurídico da época torna a questão nula, a meu ver.

     

    Os motivos são os seguintes:

     

    1. O texto diz que o significado literal não deve ser considerado absolutamente, mas não determina que deva prevalecer "pode ou deve", logo não era razoável se pautar pelo texto para resolver a questão. Então não é uma questão estrita de interpretação de texto.

     

    2. A interpretação à luz da Constituição também não permitira resolver a questão apenas com base nisso, pois são anteriores a 1988 tanto o texto da questão (1979) quanto a norma (1916).

     

    Logo, seria necessário demonstrar conhecimento a respeito da interpretação da norma à luz do sistema jurídico anterior à CF atual, o que nem consta no edital nem ostenta qualquer aplicabilidade prática para um juiz, num concurso de 2015, ano em que a esmagadora maioria dos casos práticos envolvendo essa matéria já se encontrava prescrita.

  • Como disseram acima, foi sorte acertar. quem disser que entendeu totalmente a pergunta está mentindo. até porque esta questão de dever e poder assume interpretações diversas na doutrina. ora servindo como faculdade, ora como obrigação. Só quem estudava pelo código de 1916 sabe que a palavra poder era possível conferir o efeito de dever.

  • marcelo b, o texto doutrinário é anterior a CF/88.

  • Essa questão exigiu o conhecimento da teoria do poço, criada por Trimagasi: "Óbvio" kkk

  • Da Cláusula Penal

    408. Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

    409. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora.

    410. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.

    411. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal.

    412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

    413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

    414. Sendo indivisível a obrigação, todos os devedores, caindo em falta um deles, incorrerão na pena; mas esta só se poderá demandar integralmente do culpado, respondendo cada um dos outros somente pela sua quota.

    Parágrafo único. Aos não culpados fica reservada a ação regressiva contra aquele que deu causa à aplicação da pena.

    415. Quando a obrigação for divisível, só incorre na pena o devedor ou o herdeiro do devedor que a infringir, e proporcionalmente à sua parte na obrigação.

    416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo.

    Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente.

  • Art. 413, CC/2002. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

    Convém acrescentar que trata de norma de ordem pública, cabendo a decisão de redução ex officio pelo juiz, independentemente de arguição pela parte. (Enunciado n. 356 do CJF/STJ).

    Fonte: Manual Tartuce