Náufragos da modernidade líquida
(Frei Beto)
Qual o próximo centro financeiro? Nos séculos XIII e XIV,
foi Bruges, com o advento do mercantilismo; nos séculos XIV a
XVI, Veneza, com suas corporações marítimas e a conquista do
Oriente; no século XVI, Antuérpia, graças à revolução gráfica
de Gutenberg.
Em fins do século XVI e início do XVII, foi Gênova,
verdadeiro paraíso fiscal; nos séculos XVIII e XIX, Londres,
devido à máquina a vapor e a Revolução Industrial; na primeira
metade do século XX, Nova York, com o uso da energia elétrica;
na segunda, Los Angeles, com o Vale do Silício. Qual será o
próximo?
Tudo indica que o poderio econômico dos EUA tende a
encolher, suas empresas perdem mercados para a China, a
crise ecológica afeta sua qualidade de vida. Caminhamos para
um mundo policêntrico, com múltiplos centros regionais de
poder.
A agricultura se industrializa, a urbanização invade a zona
rural, o tempo é mercantilizado. Há o risco de, no futuro, todos
os serviços serem pagos: educação, saúde, segurança e lazer.
Torna-se difícil distinguir entre trabalho, consumo,
transporte, lazer e estudo. A vida urbana comprime multidões
e, paradoxalmente, induz à solidão. O salário se gasta
predominantemente em compra de serviços: educação, saúde,
transporte e segurança.
Antes de 2030, todos se conectarão a todas as redes de
informação por infraestruturas de alta fluidez, móveis e fixas,
do tipo Google. A nanotecnologia produzirá computadores
cada vez menores e portáteis. Multiplicar-se-ão os robôs
domésticos.
O mundo envelhece. As cidades crescem. Se, de um
lado, escasseiam bens insubstituíveis, de outro, produzem-se
tecnologias que facilitam a redução do consumo de energia,
o tratamento do lixo, o replanejamento das cidades e dos
transportes.
O tempo se torna a única verdadeira raridade. Gasta-se
menos tempo para produzir e mais para consumir. Assim, o
tempo que um computador requer para ser confeccionado não
se compara com aquele que o usuário dedicará para usá-lo.
Os produtos postos no mercado são “cronófagos”, isto é,
devoram o tempo das pessoas. Basta observar como se usa
o telefone celular. Objeto de multiuso, cada vez mais ele se
impõe como sujeito com o poder de absorver o nosso tempo, a
nossa atenção, até mesmo a nossa devoção.
Ainda que cercados de pessoas, ao desligar o celular
nos sentimos exilados em uma ilha virtual. Do outro lado
da janelinha eletrônica, o capital investido nas operadoras
agradece tão veloz retorno...
Náufragos da modernidade líquida, há uma luta a se travar
no que se refere à subjetividade: deixar-se devorar pelas
garras do polvo tecnológico, que nos cerca por todos os lados,
ou ousar exercer domínio sobre o tempo pessoal e reservar
algumas horas à meditação, à oração, ao estudo, às amizades
e à ociosidade amorosa. Há que decidir!
(Disponível em: http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artld=5121.
Acesso em: 02/07/2015)
No quinto parágrafo, o autor mostra a existência de um paradoxo que está corretamente materializado, segundo a ideia desenvolvida, pelo seguinte par de vocábulos: