- ID
- 1855528
- Banca
- IBAM
- Órgão
- Prefeitura de Santo André - SP
- Ano
- 2015
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
O que é que houve?
Resolvi fazer um check-up. Havia tempo que não fazia e o redondo número de minha idade vinha
ultimamente chamando a minha atenção para a cadeirinha do plano de saúde que carrego na carteira. Não
tinha nenhum sintoma. Era apenas uma checagem para não vir a ter nenhum sintoma.
Entrei na sala para o primeiro exame:
— O que é que houve? — me perguntou o doutor.
A pergunta me pegou de surpresa. Fiquei envergonhada. Tive medo de parecer hipocondríaca.
— Nada. Apenas rotina.
O exame foi feito. Tudo normal. Saí da sala aliviada por minha ausência de manchas, mas um tanto
constrangida por mobilizar a atenção daquele médico que poderia estar se dedicando a outros abdomens,
que, doentes, esperam por suas imagens em filas gigantescas pelos hospitais da cidade.
Segui para o próximo. O laboratório parecia um shopping. Gente circulando, o café lotado, televisões
ligadas, pessoas concentradas em seus celulares e revistas, parecendo esbanjar saúde. Entrei na sala e,
mais uma vez, veio a pergunta:
— O que é que houve?
Parecia que eles tinham combinado. Tive vontade de sair correndo dali, cantando e dançando pra celebrar
minha saúde. Não o fiz. Que Deus me livrasse, mas, àquela altura, eu também já queria ver se tinha alguma
coisa. Mais uma vez, e com a graça de Deus, não tinha nada.
Saí do laboratório sentindo um alívio desconfortável e entrei no táxi pensando numa melhor maneira de
responder à tal pergunta.
— O que é que houve, doutor? Tenho a sorte de poder pagar um bom plano de saúde. Por isso, acabo
achando normal usar todo este equipamento e estes médicos bem formados para investigarem no meu
abdômen a eventual possibilidade de eu vir a ter o sintoma que não tenho.
Uso minha carteirinha para o que chamam de medicina preventiva, fazendo jus à mensalidade que tenho
pago por medo de precisar usar o que não poderei pagar. Eles bem sabem o quanto fico feliz em pagar
mais do que uso porque obviamente me oferecem um produto que não quero precisar usar. De certa
maneira, me dão a bênção de perder o que paguei. E, assim, sem nem sequer me dar conta, me vingo
minimamente, fazendo exames de rotina enquanto outras pessoas morrem nas filas dos hospitais. É bem
esquisito, não é, doutor?
(autoria: Denise Fraga, colunista do jornal Folha de São Paulo, texto retirado do site:
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/denisefraga/2015/ Data: 20/09/2015)
A conjugação do período “É bem esquisito, não é, doutor?" no futuro do pretérito é a apresentada em qual alternativa?