SóProvas


ID
1883923
Banca
IDECAN
Órgão
SEARH - RN
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                    Uma esperança


      Aqui em casa pousou uma esperança. Não a clássica, que tantas vezes verifica‐se ser ilusória, embora mesmo assim nos sustente sempre. Mas a outra, bem concreta e verde: o inseto.

      Houve um grito abafado de um de meus filhos:

      – Uma esperança! e na parede, bem em cima de sua cadeira! Emoção dele também que unia em uma só as duas esperanças, já tem idade para isso. Antes surpresa minha: esperança é coisa secreta e costuma pousar diretamente em mim, sem ninguém saber, e não acima de minha cabeça numa parede. Pequeno rebuliço: mas era indubitável, lá estava ela, e mais magra e verde não poderia ser.

      – Ela quase não tem corpo, queixei‐me.

      – Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.

      Ela caminhava devagar sobre os fiapos das longas pernas, por entre os quadros da parede. Três vezes tentou renitente uma saída entre dois quadros, três vezes teve que retroceder caminho. Custava a aprender.

      – Ela é burrinha, comentou o menino.

      – Sei disso, respondi um pouco trágica.

      – Está agora procurando outro caminho, olhe, coitada, como ela hesita.

      – Sei, é assim mesmo.

      – Parece que esperança não tem olhos, mamãe, é guiada pelas antenas.

      – Sei, continuei mais infeliz ainda.

      Ali ficamos, não sei quanto tempo olhando. Vigiando‐a como se vigiava na Grécia ou em Roma o começo de fogo do lar para que não se apagasse.

      – Ela se esqueceu de que pode voar, mamãe, e pensa que só pode andar devagar assim.

      Andava mesmo devagar – estaria por acaso ferida? Ah não, senão de um modo ou de outro escorreria sangue, tem sido sempre assim comigo.

      Foi então que farejando o mundo que é comível, saiu de trás de um quadro uma aranha. Não uma aranha, mas me parecia “a” aranha. Andando pela sua teia invisível, parecia transladar‐se maciamente no ar. Ela queria a esperança. Mas nós também queríamos e, oh! Deus, queríamos menos que comê‐la. Meu filho foi buscar a vassoura. Eu disse fracamente, confusa, sem saber se chegara infelizmente a hora certa de perder a esperança:

      – É que não se mata aranha, me disseram que traz sorte...

      – Mas ela vai esmigalhar a esperança! respondeu o menino com ferocidade.

      – Preciso falar com a empregada para limpar atrás dos quadros – falei sentindo a frase deslocada e ouvindo o certo cansaço que havia na minha voz. Depois devaneei um pouco de como eu seria sucinta e misteriosa com a empregada: eu lhe diria apenas: você faz o favor de facilitar o caminho da esperança.

      O menino, morta a aranha, fez um trocadilho, com o inseto e a nossa esperança. Meu outro filho, que estava vendo televisão, ouviu e riu de prazer. Não havia dúvida: a esperança pousara em casa, alma e corpo.

      Mas como é bonito o inseto: mais pousa que vive, é um esqueletinho verde, e tem uma forma tão delicada que isso explica por que eu, que gosto de pegar nas coisas, nunca tentei pegá‐la.

      Uma vez, aliás, agora é que me lembro, uma esperança bem menor que esta, pousara no meu braço. Não senti nada, de tão leve que era, foi só visualmente que tomei consciência de sua presença. Encabulei com a delicadeza. Eu não mexia o braço e pensei: “e essa agora? que devo fazer?” Em verdade nada fiz. Fiquei extremamente quieta como se uma flor tivesse nascido em mim. Depois não me lembro mais o que aconteceu. E, acho que não aconteceu nada.

               

  (LISPECTOR, Clarice. Uma esperança. In: Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.)

Considere o trecho “[...] e como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.” (5º§) e os comentários a seguir assinalando o verdadeiro.

Alternativas
Comentários
  •    – Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.

    a) A forma verbal são concorda com o sujeito "filhos"

    B) “que se falavam das duas esperanças”, mudaria o sentido pois "ele" o filho é quem falava.

    C) Se o "ele" fosse retirado, o verbo não iria obrigatoriamente para o plural.

    D) "como filho é surpresas para nós", estaria correto pois o verbo deve ser flexionado de acordo com o sujeito. 

  • Por favor!

    Qual a explicação para "surpresas" ficar no plural na letra D?

  • Alguém reparou que no texto o trecho aparece da seguinte forma: "– Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós,"? Ou seja, com vírgula depois do "e", o passo que no comando da questão não apresenta essa vírgula!

    Erro da banca? 
           ou
    Erro do Qc?

  • O idecan é campeã de recursos! pqp! cada questão! 

  • Questão TOP!

  • Banca podre

  • Cliquem em "Indicar para comentário" para que o professor comente a questão!!!

  • Mas que SURPRESAS de questão, espero não ter uma SURPRESAS dessa na prova. =D

  • Concodância ideológica. Analisem a idéia e verão que faz sentido. Comparem com "meus filhos é minha alegria". Parece feio, mas a alegria do sujeito é uma só, sendo tal alegria os filhos. =D

  • Então galera, eu acertei a questão, e, como vi que o pessoal tá com dúvida, vou expor como cheguei à solução.

    Bom, sabemos que o verbo ser tem algumas regras especiais de concordância, podendo concordar com o sujeito ou com o predicado. O ponto aqui é que quando um dos elementos (sujeito ou predicado) for pessoa e o outro for uma coisa, faz-se a concordância com a pessoa. Por esse motivo, discordo da posição do colega ali em baixo. Vamos lá:

    "como filho (pessoa - singular) é (concorda com a pessoa) surpresas (coisa - plural) para nós."

    "Meus filhos (pessoa - plural) são (concorda com a pessoa) minha alegria (coisa - singular)"

     

     

     

  • Pessoal, o entendimento é da seguinte forma:

    Foco no verbo "É" (ser) e pergunte para "ele": quem é surpresas? RESPOSTA: filho - portanto, filho é o sujeito desse verbo, que deve, obrigatoriamente, concordar com ele. 

    Pronto, só isso!

  • Posição oficial da banca quanto ao gabarito:

     

    "Recurso Improcedente. Ratifica-se a opção divulgada no gabarito preliminar.

    A alternativa D) Uma possibilidade de reescrita em que há correção gramatical, desconsiderando alteração de sentido, seria: “... e como filho é surpresas para nós...” não afirma que o texto original esteja em desacordo com a norma padrão da língua. A alternativa D) Uma possibilidade de reescrita em que há correção gramatical, desconsiderando alteração de sentido, seria: “... e como filho é surpresas para nós...” é considerada correta, pois, o verbo “ser” fica obrigatoriamente no singular quando se deseja fazer prevalecer a importância do sujeito sobre a do predicativo. Ex.: “Justiça é tudo, é as virtudes todas.” “Minha vida é essas duas crianças.” A alternativa “C) Caso o termo “ele” fosse omitido, a forma verbal “falava” seria empregada, obrigatoriamente, no plural; tendo em vista seu antecedente.” não pode ser considerada correta, pois, o trecho “[...] e como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.” (5º§) ficaria “[...] e como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que falavam das duas esperanças.” (5º§) não podendo ser aceita. A forma verbal “falava” está ligada ao sujeito “ele” ( singular) que, mesmo sendo omitido, o trecho “– Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.” mostra que o pronome “ele” é remissivo, fazendo referência a “meu filho”, a forma verbal permanece no singular."

     

    Fonte: https://idecan.s3.amazonaws.com/concursos/228/62_01022016091845.pdf

  • MONTE DE BISONHO!

  • Ordem de prioridade do verbo SER:


    1º - nomes próprios

    2º - pronomes pessoais

    3º - nomes personativos ( aluno, filho, médico, sobrinho, esposa)

    4º - palavras no plural

    5º - palavras no singular


    Ex.: Minhas filhas(3º) são (5º)benção.

  • Essa realmente cobra daqueles que estudam :D

  • Concordância com o verbo "SER"

    Obs.: admite-se a concordância no singular quando se deseja fazer prevalecer um elemento sobre o outro. Por exemplo:A vida é ilusões.

    gabarito (D) e como filho é surpresas para nós...”

  • a) "São" concorda com filhos, então tem que ficar no plural mesmo.

    b) Não mantém o sentido porque altera o sujeito. Reparem que, no primeiro caso, o sujeito é "ele". Já no segundo, o sujeito é simplesmente ignorado.

    c) O sujeito ficaria implícito, mas, dentro do contexto, seria possível saber que o referente é "filho" no singular. Sem falar que itens muito extremistas tendem a ser incorretos.

    d) Existe uma regra que diz que, com o verbo ser, a concordância pode ser com o Sujeito ou com o Predicativo.

    Ele é surpresas = correto/ Ele são surpresas = correto.

  • Cuidado com a letra C. É importante considerar a contextualização no texto

  • Q estranho!!!

  • Excelente Questão!!!                    gabarito: D

    a) "são" está concordando perfeitamente com o sujeito

    b) "se falavam" é uma construção com uso do índice de indeterminação do sujeito, o que torna o sujeito indeterminado. Se o sujeito passa a ser indeterminado, há alteração de conteúdo.

    c) retirar "ele" implica fazer sujeito oculto, nada impede

    d) Concordancia de acordo!!

  • Questão de quem realmente domina concordância verbal. Normalmente não é tão comum bancas cobrando regras de concordância tão específicas para o verbo ''ser'', que inclusive, são variadas.

    Porém, (Dá para fazer a questão por eliminação também!)

  • Acertei por eliminação e um pouco de sorte. Acho que essa banca só pode ta querendo pegar o título de "carrasca" da FGV

  • Gabarito: D

  • GABARITO - D

    A) A forma verbal “são” prejudica a compreensão textual tendo em vista a expressão no singular “uma surpresa”.

     filhos são uma surpresa para nós

    Na concordância com o verbo ser é possível estabelecer a concordância com o sujeito ou com o predicativo.

    ________________________________________________

    B) Uma alternativa de construção , mantendo o sentido original, para “que ele falava das duas esperanças” é “que se falavam das duas esperanças”.

    ele falava das duas esperanças

    se falavam das duas esperanças

    Há uma alteração de sentido..

    ________________________________________________

    C) Caso o termo “ele” fosse omitido, a forma verbal “falava” seria empregada, obrigatoriamente, no plural; tendo em vista seu antecedente.

     descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.”

    A omissão do sujeito não levaria o verbo ao plural.

     descobri com surpresa que falava das duas esperanças.”

    ______________________________________________

    D) Uma possibilidade de reescrita em que há correção gramatical, desconsiderando alteração de sentido, seria: “... e como filho é surpresas para nós...”

    Na concordância com o verbo ser é possível estabelecer a concordância com o sujeito ou com o predicativo.

  • Perdi uns 4 min, mas deu certo