SóProvas


ID
1884256
Banca
FUNCAB
Órgão
EMSERH
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto para responder a questão.

O embondeiro que sonhava pássaros

     Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.

   Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:

  – Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.

    Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito. 

   Mas aquele ordem pouco seria  desempenhada.

   [...]

   O homem então se decidia a sair, juntar as suas raivas com os demais colonos. No clube, eles todos se aclamavam: era preciso acabar com as visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se haveria de pensar. 

   No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si: 

  – Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora. 

   Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?

    O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.

     Fosse por desdenho dos grandes ou por glória dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o passarinheiro foi virando assunto no bairro do cimento. Sua presença foi enchendo durações, insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela música se estranhava nos moradores, mostrando que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal, os pássaros desautenticavam os residentes, estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber que seus passos descalços não cabiam naquelas ruas. Os brancos se inquietavam com aquela desobediência, acusando o tempo. [...] 

     As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...] 

    Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.

COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto – 1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71. (Fragmento). 

De acordo com os estudos de regência verbal e com o padrão culto da língua, leia as afirmações sobre os verbos destacados em “Os senhores RECEAVAM as suas próprias suspeições - TERIA aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles CARECIAM de acesso?”

I. Como o verbo é transitivo indireto, é obrigatório o uso do acento indicativo da crase em AS, que compõe o complemento da primeira oração.

II. Na segunda oração, o verbo TERIA constitui por si só o predicado de uma oração.

III. O verbo CARECIAM, como é transitivo indireto, está ligado a seu complemento por meio de uma preposição.

Está(ão) correta(s) apenas a(s) afirmativa(s):

Alternativas
Comentários
  • como obrigatório se está anteposto a um pronome possessivo?

  • O artigo definido é facultativo diante de pronome possessivo. Mas, para a crase ser facultativa, esse pronome possessivo deve ser feminino singular.

     

    Refiro-me a minha amiga - Crase facultativa

    Refiro-me às suas amigas - Crase obrigatória.

  • Adenilton Nascimento, entendi a sua explicação, mas não entendi os exemplos... no segundo exemplo, que estão no plural, não seria "Crase obrigatória"?

  • A. H., corrigido.

  • Por que a crase é obrigatória se o verbo da primeira oração, RECEAR, é transitivo direto?

     

    Afinal, quem receia, receia alguma coisa. Neste caso, "as suas próprias suspeições".

  • Quem receia, receia a algo, é isso pessoal?

     

  • QUEM TEM RECEIO TEM RECEIO DE ALGUMA COISA ou A ALGUMA COISA. Sendo assim, o verbo é TRANSITIVO INDIRETO devendo está presente a preposição regida pelo verbo. Como existe o artigo no plural anteposto o pronome possessivo, deve-se obrigatoriamente colocar o sinal indicativo de crase para demonstrar a existência da preposição regida.

    A crase é FACULTATIVA ANTES DE PRONOMES POSSESSIVOS FEMININOS NO SINGULAR, que não é o caso.

  • Isso ta errado, a crase não é obrigatória na primeira proposição, e sim facultativa, pois está anteposta a um pronome possessivo.

  • hugo esse caso de facultatividade é somente se estiver no singular... pois a preposição A é invariável. o que varia é o artigo. e se está no plural é pq obrigatoriamente tem o A no plural (AS) + a preposição A

  • O uso da crase será Facultativo nos casos de Pronome Possessivos. EX: Leve o presente à/a sua amiga.

  • Errei essa porque não sabia a regência do verbo recear. Existem milhares de verbos, se o "cara" da banca quiser que nós erremos, ele vai nos fazer errar. Como saber a regência de todos os verbos? '-'

  • ESSA QUESTAO APARECE MAIS ADIANTE COM ENUMERADAS 18 ASS SOCIAL 19 ENFERMEIRO E 20 NUTRICIONISTA COM O GABARITO CORRETO MARCANDO AS OPÇOES QUE TEM AOS ALGARISMOS ROMANOS I E III LOGO A CORRETA AQUI É A LETRA A MAS POR ALGUM MOTIVO O QC ERROU O GABA

  • Alguém poderia indicar a fonte que classifica recear como transitivo indireto (em casos similares)? Por enquanto penso como Daniel Batista, que seja transitivo direto neste caso.

  • banca escrota, nunca vi  a FUNCAB elaborar uma questão inteligente..

  • O verbo RECEAR é VTD e VTI

     

    1.

    transitivo direto, transitivo indireto e pronominal

    ter receio ou medo de; ter apreensão quanto a; assustar(-se), preocupar(-se).

    2.

    transitivo direto

    estar quase convencido de; achar, crer, acreditar.

    "ele receia que estejas certo"

  • Marquei a Letra C nessa questão.

    Mas vendo os comentários, o colega Hugo Horácio falou o certo motivo pelo qual o uso da crase no item I é obrigatória.

    Em regra, diante de pronome possessivo a crase é FACULTATIVA.

    Ex: Ele fez referência a/à (a + a) nossa cultura.

    Na questão, a crase torna-se obrigatória devido a variação do artigo.

    Ex.: ...RECEAVAM as suas...

    a (preposição é INVARIÁVEL)

    a (artigo é VARIÁVEL)

    (a + as) = às

    Logo, a crase é obrigatória, pois o verbo é Transitivo Indireto e admite a preposição a.

  • Pessoal, além da ocorrência obrigatória da crase quando houver verbo que exige a preposição a e artigo no plural anteposto ao pronome possessivo, existe ainda outro caso de obrigatoriedade em relação a este tipo de pronome: o pronome possessivo substantivo (aquele que não acompanha um substantivo). Veja:

    Ex. Não gosto de sua coordenadora, mas da minha. (minha, pronome processivo substantivo, portanto, o uso do artigo é obrigatório).

    Ex. Não obedeço a sua coordenadora, mas à minha. (Como o verbo exige a preposição a, o acento indicador de crase será obrigatório).

     

    Fonte:http://portugues.uol.com.br/gramatica/crase-antes-pronomes.html

     

  • Acabei marcando a letra C. Mas consultando minhas anotações referente a Crase, o caso de crase facultativa diante de pronome possessivo feminino, o mesmo precisa estar no SINGULAR. diferentemente do item l que está no plural.

    GAB. A