- ID
- 2310553
- Banca
- Instituto Excelência
- Órgão
- Prefeitura de Lauro Muller - SC
- Ano
- 2017
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Este texto é referente à questão.
BRUXAS NÃO EXISTEM
Quando eu era garoto, acreditava em
bruxas, mulheres malvadas que passavam o
tempo todo maquinando coisas perversas. Os
meus amigos também acreditavam nisso. A prova
para nós era uma mulher muito velha, uma
solteirona que morava numa casinha caindo aos
pedaços no fim de nossa rua. Seu nome era Ana
Custódio, mas nós só a chamávamos de “bruxa”.
Era muito feia, ela; gorda, enorme, os
cabelos pareciam palha, o nariz era comprido, ela
tinha uma enorme verruga no queixo. E estava
sempre falando sozinha. Nunca tínhamos entrado
na casa, mas tínhamos a certeza de que, se
fizéssemos isso, nós a encontraríamos
preparando venenos num grande caldeirão. Nossa
diversão predileta era incomodá-la. Volta e meia
invadíamos o pequeno pátio para dali roubar
frutas e quando, por acaso, a velha saía à rua
para fazer compras no pequeno armazém ali
perto, corríamos atrás dela gritando "bruxa,
bruxa!".
Um dia encontramos, no meio da rua, um
bode morto. A quem pertencera esse animal nós
não sabíamos, mas logo descobrimos o que fazer
com ele: jogá-lo na casa da bruxa. O que seria
fácil. Ao contrário do que sempre acontecia,
naquela manhã, e talvez por esquecimento, ela
deixara aberta a janela da frente. Sob comando do
João Pedro, que era o nosso líder, levantamos o
bicho, que era grande e pesava bastante, e com
muito esforço nós o levamos até a janela.
Tentamos empurrá-lo para dentro, mas aí os
chifres ficaram presos na cortina.
- Vamos logo - gritava o João Pedro -,
antes que a bruxa apareça. E ela apareceu. No
momento exato em que, finalmente,
conseguíamos introduzir o bode pela janela, a
porta se abriu e ali estava ela, a bruxa,
empunhando um cabo de vassoura. Rindo,
saímos correndo. Eu, gordinho, era o último.
E então aconteceu. De repente, enfiei o pé
num buraco e caí. De imediato senti uma dor
terrível na perna e não tive dúvida: estava
quebrada. Gemendo, tentei me levantar, mas não
consegui. E a bruxa, caminhando com dificuldade,
mas com o cabo de vassoura na mão,
aproximava-se. Àquela altura a turma estava
longe, ninguém poderia me ajudar. E a mulher
sem dúvida descarregaria em mim sua fúria.
Em um momento, ela estava junto a mim,
transtornada de raiva. Mas aí viu a minha perna, e
instantaneamente mudou. Agachou-se junto a mim e começou a examiná-la com uma habilidade
surpreendente.
- Está quebrada - disse por fim. - Mas
podemos dar um jeito. Não se preocupe, sei fazer
isso. Fui enfermeira muitos anos, trabalhei em
hospital. Confie em mim.
Dividiu o cabo de vassoura em três
pedaços e com eles, e com seu cinto de pano,
improvisou uma tala, imobilizando-me a perna. A
dor diminuiu muito e, amparado nela, fui até minha
casa. "Chame uma ambulância", disse a mulher à
minha mãe. Sorriu.
Tudo ficou bem. Levaram-me para o
hospital, o médico engessou minha perna e em
poucas semanas eu estava recuperado. Desde
então, deixei de acreditar em bruxas.
E tornei-me grande amigo de uma senhora que
morava em minha rua, uma senhora muito boa
que se chamava Ana Custódio.
(SCLIAR, Moacyr. In: revista Nova Escola, seção
Era uma vez. São Paulo: Abril, agosto de 2004).
Ao ler o conto “Bruxas não existem”, se percebe
que, a maioria dos verbos presentes ao longo da
história, como na frase “E tornei-me grande amigo
de uma senhora que morava em minha rua”
estão: