SóProvas


ID
2328016
Banca
IESES
Órgão
Prefeitura de São José do Cerrito - SC
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

LÍNGUAS MUDAM

Por Sírio Possenti. Adaptado de:
http://www.cienciahoje.org.br/noticia/v/ler/id/3089/n/linguas_mudam
Acesso em 13 jan 2017.

Que as línguas mudam é um fato indiscutível. O que interessa aos estudiosos é verificar o que muda, em que lugares uma língua muda, a velocidade e as razões da mudança.
Desde a década de 1960, um fator foi associado sistematicamente à mudança: a variação. Isso quer dizer que, antes que haja mudança de uma forma a outra, há um período de variação, quando as duas (ou mais) ocorrem – inicialmente em espaços ou com falantes diferentes. Aos poucos, a forma nova vai sendo empregada por todos; depois, a antiga desaparece. [...].
Os sociolinguistas, eventualmente, fazem testes para verificar se um caso de variação é ou não candidato à mudança. O teste simula a passagem do tempo verificando qual é a forma adotada pelos falantes mais velhos e pelos mais jovens. Por exemplo: se os mais velhos escrevem ou dizem sistematicamente “para fazer uma tese é preciso que...” e os mais jovens, “para se fazer uma tese...”, este é um indício de que o infinitivo sem sujeito, nesta posição, tende a desaparecer com o desaparecimento dos falantes mais idosos (e “para se fazer” será a forma única, pelo menos durante um tempo).
De vez em quando, há discussões sobre certos casos. Dois exemplos: o pronome ‘cujo’ e a segunda pessoa do plural dos verbos (‘jogai’ etc.). Minha avaliação (bastante informal) é que ‘cujo’ desapareceu. O que quer dizer “desapareceu”? Que não se emprega mais? Não! Quer dizer que não é mais de emprego corrente; só aparece em algumas circunstâncias – tipicamente, em textos muito formais (em geral de autores idosos). E, claro, em textos antigos.
Que apareça em textos antigos é uma evidência de que a forma era / foi empregada. Que apareça cada vez menos é um indício de que tende a desaparecer. Com um detalhe: desaparecer não quer dizer não aparecer nunca mais em lugar nenhum. Quer dizer não ser de uso corrente. Para fazer uma comparação, ‘cujo’ é como a gravata borboleta: só usamos esse item em certas cerimônias, ou seu uso é uma idiossincrasia [...].
Outro caso é a segunda pessoa do plural, em qualquer tempo ou modo. Recentemente, um colunista defendeu a tese de que a forma está viva. Seu argumento: aparece em cartazes de torcedores em estádios de futebol, especialmente do Corinthians, no apelo “jogai por nós”. Mesmo que este seja um fato, a conclusão é fraca. A forma é inspirada numa ladainha de Nossa Senhora, toda muito solene, muito mais do que formal. E é bem antiga, traduzida do latim. [...] A cada invocação, os fiéis respondem “rogai por nós”. “Jogai por nós” é uma fórmula inspirada em outra fórmula, típica desta oração.
Para que se possa sustentar que a segunda pessoa do plural não desapareceu, seria necessário que seu uso fosse regular. Que, por exemplo, os corintianos também gritassem “Recuai, Wendel”, “Não erreis estas bolas fáceis, Vagner Love”, “Tite, fazei Malcolm treinar finalizações” e, quando chateados, gritassem “Como sois burro!”. Espero que nenhum colunista sustente que isso ocorre...
[...] O caso “jogai” me faz lembrar outro, da mesma natureza, de certa forma. Se há um fato consensual em português (do Brasil) é que não se diz naturalmente “ele o/a viu, vou fazê-la sair”. Estas formas pronominais objetivas diretas de terceira pessoa são verdadeiros arcaísmos. Só são parcialmente aprendidas na escola. Os alunos começam a empregá-las depois de alguns anos, um pouco por pressão, um pouco porque se dão conta de que cabem em textos mais monitorados. Mas essas formas nunca aparecem na fala deles (e são muitíssimo raras também na fala de pessoas cultas, como as que aparecem em debates na TV).
Curiosamente, uma das formas de manifestar chateação, com perdão da expressão, é “p*** que o pariu”! Aqui, o pronome oblíquo aparece! Entretanto, ninguém vai dizer que esse é um argumento para sustentar que o pronome oblíquo está vivo. Se disser...
Sírio Possenti
Departamento de Linguística - Universidade Estadual de Campinas

Observe as duas construções a seguir, com atenção à colocação do pronome oblíquo:
I. “Para que se possa sustentar que a segunda pessoa do plural não desapareceu [...]”.
II. “Se há um fato consensual em português (do Brasil) é que não se diz naturalmente [...]”.
Agora considere as alternativas e marque a que contenha análise correta. 

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: C

     

    Lista de palavras atrativas de próclise:

     

    a) palavras com sentido negativo: não, nunca, jamais, ninguém, nada, nenhum, nem, etc. 

    b) advérbios (sem vírgula): aqui, ali, só, também, bem, mal, hoje, amanhã, ontem, já, nunca, jamais, apenas, tão, talvez, etc. 

    c) pronomes indefinidos: todo, tudo, alguém, ninguém, algum, etc. 

    d) pronomes ou advérbios interrogativos (o uso destas palavras no início da oração interrogativa atrai o pronome para antes do verbo): O que ? Quem ? Por que ? Quando ? Onde ? Como ? Quanto ? 

    e) pronomes relativos: que, o qual, quem, cujo, onde, quanto, quando, como. 

    f) conjunções subordinativas: que, uma vez que, já que, embora, ainda que, desde que, posto que, caso, contanto que, conforme, quando, depois que, sempre que, para que, a fim de que, à proporção que, à medida que, etc. 

    g) em + gerúndio: deve-se usar o pronome entre “em” e o gerúndio. 

  • Gabarito C

     

    I. “Para que se possa sustentar que a segunda pessoa do plural não desapareceu [...]”.

    Próclise obrigatória quando conjunções subordinativas antes do verbo.

     

    II. “Se há um fato consensual em português (do Brasil) é que não se diz naturalmente [...]”.

    Próclise obrigatória quando palavra negativa antes do verbo.

  • Em locuções verbais onde o verbo principal está no infitivo não pode, apesar da palavra atrativa, ocorrer ênclise também? Não é o caso (de locução verbal) na expressão "Para que se POSSA SUSTENTAR"? Me ajudem a entender isso...
  • Gab. C

    "QUE" e "NÃO" são termos atrativos de próclise...

  • Estou com a mesma dúvida do George...

  • Conforme leciona Fernando Pestana, página 370 : Quando o verbo principal for constituido por infinitivo e havendo palavra atrativa, o pronome poderá ser colocado antes do verbo auxiliar ou depois do verbo principal, ou seja,  tanto a próclise quanto a ênclise são formas corretas, e não existe obrigatoriedade de uma em frente a outra... Todas as questões que fiz dessa banca falando sobre a obrigatoriedade de proclise frente a ênclise na situação de termos palavra atrativa foram dadas como corretas. Agora é ver se ninguém entrou com recurso ou a banca não aceitou..

  • banca horrível

  • Na II a próclise é claramente obrigatória, visto que há a presença da palavra atrativa "não". Na primeira existe uma locução verbal e, se não houver palavra atrativa o pronome pode estar antes, depois ou no meio da locução. Alternativa meio estranha.

  • I. “Para que (atrativa) se possa sustentar que a segunda pessoa do plural não desapareceu [...]”.

    II. “Se há um fato consensual em português (do Brasil) é que não (atrativa) se diz naturalmente [...]”.