- ID
- 247045
- Banca
- FCC
- Órgão
- TRT - 12ª Região (SC)
- Ano
- 2010
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Homens
Deus, que não tinha problemas de verba, nem uma
oposição para ficar dizendo "Projetos faraônicos! Projetos faraônicos!",
resolveu, numa semana em que não tinha mais nada
para fazer, criar o mundo. E criou o céu e a terra e as estrelas, e
viu que eram razoáveis. Mas achou que faltava vida na sua
criação e - sem uma ideia muito firme do que queria - começou
a experimentar com formas vivas. Fez amebas, insetos, répteis.
As baratas, as formigas etc. Mas, apesar de algumas coisas
bem resolvidas - a borboleta, por exemplo -, nada realmente o
agradou. Decidiu que estava se reprimindo e partiu para grandes
projetos: o mamute, o dinossauro e, numa fase especialmente
megalomaníaca, a baleia. Mas ainda não era bem aquilo.
Não chegou a renegar nada do que fez - a não ser o rinoceronte,
que até hoje Ele diz que não foi Ele - e tem explicação até
para a girafa, citando Le Corbusier* ("A forma segue a função").
Mas queria outra coisa. E então bolou um bípede. Uma variação
do macaco, sem tanto cabelo. Era quase o que Ele queria. Mas
ainda não era bem aquilo. E, entusiasmado, Deus trancou-se na
sua oficina e pôs-se a trabalhar. E moldou sua criatura, e
abrandou suas feições, e arredondou suas formas, e tirou um
pouquinho daqui e acrescentou um pouquinho ali. E criou a
Mulher, e viu que era boa. E determinou que ela reinaria sobre a
sua criação, pois era a sua obra mais bem acabada.
Infelizmente, o Diabo andou mexendo na lata de lixo de
Deus e, com o que sobrou da Mulher, criou o Homem.
*Le Corbusier = Importante arquiteto francês
(Luis Fernando Verissimo. As mentiras que os homens contam.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001)
O humor e a ironia do texto derivam de vários recursos utilizados, tais como:
I. Aproximação jocosa da linguagem bíblica.
II. Informalidade e irreverência na caracterização de Deus.
III. Alusões sarcásticas à política entre os homens.
Satisfaz o enunciado o que consta em