SóProvas


ID
2517589
Banca
Marinha
Órgão
ESCOLA NAVAL
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                       O dono do livro


      Li outro dia um fato real narrado pelo escritor moçambicano Mia Couto. Ele disse que certa vez chegou em casa no fim do dia, já havia anoitecido, quando um garoto humilde de 16 anos o esperava sentado no muro. O garoto estava com um dos braços para trás, o que perturbou o escritor, que imaginou que pudesse ser assaltado.

      Mas logo o menino mostrou o que tinha em mãos: um livro do próprio Mia Couto. Esse livro é seu? perguntou o menino. Sim, respondeu o escritor. Vim devolver. O garoto explicou que horas antes estava na rua quando viu uma moça com aquele livro nas mãos, cuja capa trazia a foto do autor.

      O garoto reconheceu Mia Couto pelas fotos que já havia visto em jornais. Então perguntou para a moça: Esse livro é do Mia Couto? Ela respondeu: É. E o garoto mais que ligeiro tirou o livro das mãos dela e correu para a casa do escritor para fazer a boa ação de devolver a obra ao verdadeiro dono.

      Uma história assim pode acontecer em qualquer país habitado por pessoas que ainda não estejam familiarizadas com os livros - aqui no Brasil, inclusive. De quem é o livro? A resposta não é a mesma de quando se pergunta: "Quem escreveu o livro?".

      O autor é quem escreve, mas o livro é de quem lê, e isso de uma forma muito mais abrangente do que o conceito de propriedade privada - comprei, é meu. O livro é de quem lê mesmo quando foi retirado de uma biblioteca, mesmo que seja emprestado, mesmo que tenha sido encontrado num banco de praça.

      O livro é de quem tem acesso às suas páginas e através delas consegue imaginar os personagens, os cenários, a voz e o jeito com que se movimentam. São do leitor as sensações provocadas, a tristeza, a euforia, o medo, o espanto, tudo o que é transmitido pelo autor, mas que reflete em quem lê de uma forma muito pessoal. É do leitor o prazer. É do leitor a identificação. É do leitor o aprendizado. É do leitor o livro.

      Dias atrás gravei um comercial de rádio em prol do Instituto Estadual do Livro em que falo aos leitores exatamente isso: os meus livros são os seus livros. E são, de fato. Não existe livro sem leitor. Não existe. É um objeto fantasma que não serve pra nada.

      Aquele garoto de Moçambique não vê assim. Para ele, o livro é de quem traz o nome estampado na capa, como se isso sinalizasse o direito de posse. Não tem ideia de como se dá o processo todo, possivelmente nunca entrou numa livraria, nem sabe o que é tiragem.

      Mas, em seu desengano, teve a gentileza de tentar colocar as coisas em seu devido lugar, mesmo que para isso tenha roubado o livro de uma garota sem perceber.

      Ela era a dona do livro. E deve ter ficado estupefata. Um fã do Mia Couto afanou seu exemplar. Não levou o celular, a carteira, só quis o livro. Um danado de um amante da literatura, deve ter pensado ela. Assim são as histórias escritas também pela vida, interpretadas a seu modo por cada dono. 

(Martha Medeiros. JORNAL ZERO HORA - 06/11/11./ Revista O Globo, 25 de novembro de 2012.)

Leia os fragmentos abaixo:


"O autor é quem escreve, mas o livro é de quem lê, e isso de uma forma muito mais abrangente [...]" (5°§)


"Dias atrás gravei um comercial de rádio em prol do Instituto Estadual do Livro em que falo aos leitores exatamente isso [...]” (7°§)


“[...] as coisas em seu devido lugar, mesmo que para isso tenha roubado o livro de uma garota sem perceber.” (9°§)


Quanto aos processos coesivos, as palavras destacadas possuem, de acordo com o contexto em que são empregados, respectivamente, valor:

Alternativas
Comentários
  • Muita atenção na realização desse tipo de questão! Na maioria da vezes, O IDEAL é SEMPRE ler a frase completa. Retorne ao texto e leia com atenção. 

     

    I - "O autor é quem escreve, mas o livro é de quem lê, e isso de uma forma muito mais abrangente do que o conceito de propriedade privada - comprei, é meu".  - O pronome "isso" tem valor anafórico. Ele está fazendo referência à um termo anterior a sua colocação. No caso, acredito que está se referindo ao termo "mas o livro é de quem lê".

     

    II -  "Dias atrás gravei um comercial de rádio em prol do Instituto Estadual do Livro em que falo aos leitores exatamente isso: os meus livros são os seus livros". - O pronome "isso" tem valor catafórico. No caso ele está se referindo ao trecho: "os meus livros são os seus livros".

     

    III -  "Mas, em seu desengano, teve a gentileza de tentar colocar as coisas em seu devido lugar, mesmo que para isso tenha roubado o livro de uma garota sem perceber". - O pronome "isso" tem valor anafórico. Ele está fazendo referência à um termo anterior a sua colocação. No caso, acredito que está se referindo ao trecho: "(...) tentar colocar as coisas em seu devido lugar". 

  • Anáfora

    É um mecanismo linguístico por meio do qual um termo recupera um outro termo que o antecedeu no texto.

    Exemplos:

    Mariana comprou um novo carro. O veículo é o laçamento do ano.

    Perceba a retomada do substantivo “carro” por outro substantivo, “veículo”.

    doutor está de férias. Ele só retornará aos atendimentos no próximo mês.

    Nesse exemplo, houve a retomada do substantivo “doutor” pelo pronome “ele”.

    Catáfora

    É um mecanismo linguístico no qual o referente aparece depois do item coesivo.

    Exemplos:

    Só desejamos istoférias!

    Perceba que o pronome demonstrativo “isto antecede o referente “férias”, que aparece logo depois.

    Pedro comprou vários ingredientesaçúcar, farinha, ovos, chocolate em pó e leite.

    Note que a expressão “vários ingredientes” antecede o referente que apresenta quais itens Pedro comprou: “açúcar, farinha, ovos, chocolate em pó e leite

    Fonte: http://portugues.uol.com.br/redacao/diferenca-entre-anafora-catafora.html

  • D

     

    anáforico faz refêrencia ao que ja foi dito

    catáforico o que ainda será dito

     

    como o colega bem disse, nesse tipo de questão sempre volte ao texto, pois na assertiva II, por exemplo, se não voltar ao texto não tem como saber.