SóProvas


ID
2656084
Banca
MS CONCURSOS
Órgão
SAP-SP
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Poema em linha reta (Álvaro de Campos)


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,

Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo,

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;

Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,

Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos, 

Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

De acordo com o poema, marque a alternativa correta referente aos itens seguintes.


(I) O poema é construído a partir da conciliação do eu lírico e os outros.

(II) Desde o primeiro verso do poema, o eu lírico estabelece uma resistência entre sua postura pessimista e a responsabilidade pelos outros.

(III) O eu lírico apresenta fatos que mostram sua realidade.

(IV) Analisando os versos “Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.” / “Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?”, entende-se que o eu lírico é um solitário, porque só ele tem coragem de assumir que é infame.

Alternativas
Comentários
  • Alguém poderia explicar pq a letra A esta errada, por favor.

  • Pelo que percebi não há "conciliação do eu lírico e os outros."

  • Na minha opinião porque ele (o Eu lírico) procura o tempo todo deixar claro a diferença entre Ele um ser comum,com defeitos, imperfeito e os que hipocritamente se acham perfeitos, sem vícios ou que nunca erraram ou ecandalizaram na vida.

     

    Antonio do Sul

  • O eu lírico na verdade é mais realista do que pessimista, pois se reconhece de certa forma limitado, imperfeito...humano.Passível de erros que os reconhece.Sente-se deslocado,pois essa atitude de auto-crítica e consciência dos próprios limites pessoais e erros não é "lugar-comum" na vida.

    Segui esse raciocícinio para abarcar as alternativas: 2,3 e 4.

    Não vi conciliação, pois,  pelo contrário há uma crítica sútil ,mas evidente sobre as ilusões de "perfeição" dos demais, pelos quais o autor não parece nutrir simpatia alguma.

    Letra:B.

     

  • (II) Desde o primeiro verso do poema, o eu lírico estabelece uma resistência entre sua postura pessimista e a responsabilidade pelos outros.

    alguém poderia especificar no texto alguma coisa que tenha a ver com "responsabilidade pelos outros"?

     

  • A letra A está errada, pois com "conciliação" a banca quer dizer que o eu lírico tem comportamento oposto aos outros, ou seja, incongruente, sem ocorrer conciliação de pensamentos e ações, quando ele se compara aos outros.