A herança é considerada bem indivisível antes da partilha. Por isso, o direito à propriedade e à posse dos coerdeiros será indivisível, e regular-se-á pelas regras relativas ao condomínio. "Forma-se, então, um condomínio eventual pro indiviso em relação aos bens que integram a herança, até o momento da partilha entre os herdeiros".
Como consequência desse condomínio, o co-herdeiro fica impedido de ceder a sua quota a pessoa estranha, se o outro quiser, tanto por tanto. Trata-se de um direito de preempção, preferência ou prelação legal. "O coerdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão (é o caso da questão, pois consta expressamente que Mariana vendeu "sem dar conhecimento ao irão"), poderá, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até cento e oitenta dias após a transmissão" (art. 1.795).
De acordo com o Prof. Flávio Tartuce, embora o CC traga previsão no sentido de que o prazo tem início após a transmissão, diante da valorização da boa-fé objetiva, o prazo deve ser contado a partir da CIÊNCIA da alienação (Manual de Direito Civil, 2018).
Na jurisprudência há precedentes que seguem esse entendimento: "A depender da situação em concreto, é possível afirmar, ainda, que o prazo decadencial (de cento e oitenta dias) a que se refere o dispositivo legal citado deve ser contado, em homenagem ao princípio da boa-fé objetiva, a partir da ciência da alienação pelos coerdeiros preteridos e não necessariamente da data da alienação em si. Cumpre anotar também que é justamente a expressão "tanto por tanto ", adotada pelo art. 1.794 do Código Civil, que torna evidente que a prévia notificação dos coerdeiros, para fins do exercício de seu direito de preferência, deve ser capaz de assegurar-lhes plena ciência não apenas do interesse do herdeiro cedente na alienação futura de sua quota hereditária, mas também do preço e das condições de pagamento oferecidas ao pretenso terceiro cessionário". Trecho do voto do relator Min. Ricardo Villas Bôas Cueva no RECURSO ESPECIAL Nº 1.620.705 - RS.
O examinador explora, na presente questão, por meio de um estudo de caso, o conhecimento do candidato sobre o instituto da herança e sua administração, importante tema regulamentado no Código Civil, em seus artigos 1.791 e seguintes. Senão vejamos:
Mariana e Marcio são irmãos e únicos herdeiros de um apartamento situado no bairro do Brooklin, na cidade de São Paulo, deixado pelos seus pais Maria e José, ambos falecidos. O imóvel está vazio desde a desocupação do anterior locatário no mês de Novembro de 2017. Os irmãos, que não mantêm uma boa relação, divergem sobre a destinação do imóvel. Mariana quer vendê-lo, enquanto Marcio não pretende se desfazer do bem, desejando locá-lo novamente. Mariana, então, sem dar conhecimento ao irmão, Marcio, vende a sua quota parte do imóvel para Ricardo, seu amigo e estranho à relação entre os consortes, pela quantia de R$ 500.000,00. Nesse caso, Marcio, ao tomar conhecimento da venda, se quiser a quota parte de Mariana poderá haver para si a parte vendida a Ricardo depositando
A)
70% do preço estabelecido pela venda se o requerer no prazo de 1 ano, sob pena de decadência.
B)
70% do preço estabelecido pela venda, se o requerer no prazo de 180 dias, sob pena de decadência.
C)
o preço estabelecido pela venda, se o requerer no prazo de 1 ano, sob pena de decadência.
D)
o preço estabelecido pela venda, se o requerer no prazo de 180 dias, sob pena de decadência.
Acerca do tema, prevê o Código Civil:
Da Herança e de sua Administração
Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.
Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados.
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1º Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.
§ 2º É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente.
§ 3º Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade.
Art. 1.794. O co-herdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro co-herdeiro a quiser, tanto por tanto.
Art. 1.795. O co-herdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão, poderá, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até cento e oitenta dias após a transmissão.
Parágrafo único. Sendo vários os co-herdeiros a exercer a preferência, entre eles se distribuirá o quinhão cedido, na proporção das respectivas quotas hereditárias.
Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á inventário do patrimônio hereditário, perante o juízo competente no lugar da sucessão, para fins de liquidação e, quando for o caso, de partilha da herança.
Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:
I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão;
II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho;
III - ao testamenteiro;
IV - a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz.
Conforme visto, o artigo 1.795 prevê que se for violado o direito de preferência do coerdeiro, poderá este, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho. Mas terá de exercer esse direito no prazo de cento e oitenta dias após a transmissão. Trata-se de prazo de decadência.
E)
o preço estabelecido pela venda, se o requerer no prazo de 90 dias, sob pena de decadência.
Gabarito do Professor: D
Bibliografia:
Código Civil, disponível no site do Planalto.