Segundo a autora em A tecnologia do gênero:
A seguir, farei uma série de quatro proposições, em ordem decrescente a partir da mais óbvia, que serão retomadas mais detalhadamente no decorrer da análise.
(1) Gênero é (uma) representação — o que nãosignifica que não tenha implicações concretas ou reais, tanto sociais quanto subjetivas, na vida material das pessoas. Muito pelo contrário.
(2) A representação do gênero é a sua construção — e num sentido mais comum pode-se dizer que toda a arte e a cultura erudita ocidental são um registro da história dessa construção.
(3) A construção do gênero vem se efetuando hoje no mes- mo ritmo de tempos passados, como daera vitoriana, por exem- plo. E ela continua a ocorrer não só onde se espera que aconteça
— na mídia, nas escolas públicas e particulares, nos tribunais, na família nuclear, extensa ou monoparental — em resumo, na- quilo que Louis Althusser denominou ““aparelhos ideológicos do Estado”. A construção do gênero também se faz, embora de for- ma menos óbvia, na academia, na comunidade intelectual, nas práticas artísticas de vanguarda, nas teorias radicais, e até mes- mo, de forma bastante marcada, no feminismo.
(4) Paradoxalmente, portanto, a construção do gênero tam- bém se faz por meio de sua desconstrução, quer dizer, em qual- quer discurso, feminista ou não, que veja o gênero como apenas uma representação ideológica falsa. O gênero, como o real, é não apenas o efeito da representação, mas também o seu excesso, aqui- lo que permanece fora do discurso como um trauma em poten- cial que, se/quando não contido, pode romper ou desestabilizar qualquer representação.
The technology of gender” foi publicado em Technologies of gender, Indiana Uni- versity Press, 1987, pp. 1-30. Teresa de Lauretis é professora do Departamento de Histó- ria da Consciência da Universidade da Califórnia, Santa Cruz,e autora de Alice doesn't:
feminism, semiotics, cinema, The cinematic apparatus, Feminist studies — critical stud- ies e Technology of gender.