SóProvas


ID
2947732
Banca
UERR
Órgão
PM-RR
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                         TEXTO I

                           LIVRES OU MARIONETES?
 
Janus era o deus com dupla face no mundo antigo. Contemplava direções opostas. Ele batiza o monte Janículo, em Roma, onde está enterrada Anita Garibaldi (a heroína de dois mundos no monte do deus de duas faces). Janus também orienta o nome do Mês de janeiro. É o deus de começo e fim, de passado e futuro, dos momentos de transição.

Janeiro é bifronte. Estão frescas as memórias de Ano-Novo. Desejamos um ser novo daqui para frente. Perderemos peso, aprenderemos línguas, guardaremos dinheiro, visitaremos mais os amigos. Então, chega a festa dos Reis, 6 de janeiro, limite do ímpeto transformador. O rio da transformação desacelera e chega ao calmo fluxo da planície cotidiana. Como diz meu querido Hamlet no seu monólogo, a consciência nos torna covardes e o ânimo mais resoluto se afoga na sombra do pensar. Decidimos pela ação e o cotidiano a dilui. O soluto da vontade se entrega ao solvente dos dias intermináveis e do cotidiano desgastante.

O ano será bom ou ruim? Entramos no campo cediço do acaso. A Fortuna romana era a deusa do acaso. Os gregos a chamavam Tique. Nossas vidas serão regidas pelo aleatório. Às vezes parece que sim. O Romeu de Shakespeare brada ao espaço ser um joguete do destino. A grande Bárbara Heliodora prefere traduzir “I am fortune’s fool” por “eu sou palhaço dos fados”.

Sou historiador. Gosto de exemplos concretos. Jean-Baptiste Lully era o italiano que Luiz XIV adotou como o grande compositor da corte francesa de Versalhes. Brilhou musicando bailados para o Rei Sol. Ele estava no auge da fama e do dinheiro. Por determinação do monarca, controlava toda a produção musical francesa. Em 8 de janeiro, ele regia um Te Deum, um hino de ação de graças pela saúde do Rei que se recuperava de uma doença. Batendo com um grande bastão no chão para marcar o compasso, Jully se distraiu e alvejou o próprio pé. A pequena ferida infeccionou numa era pré-antibiótico. Ele determinou que o pé não poderia ser amputado. Morreu dois meses depois, em 22 de março de 1687. Foi vítima de si mesmo e do acaso.

Jully não foi a primeira morte estranha, fruto de um acaso cruel. O autor teatral Ésquilo era aclamado como o maior de toda a Grécia clássica. Suas peças, como Prometeu acorrentado e Os persas, são encenadas até hoje. Era um talento reconhecido e premiado. Ésquilo ostentava luzidia careca. Escrevia ao ar livre para se inspirar. Uma águia segurava nas garras uma tartaruga e, seguindo velha tradição, jogava o réptil numa pedra para espatifar o casco. Viu a brilhante cabeça do tragediógrafo e arremeteu o petardo, confundindo-o com uma rocha. Ésquilo morreu de uma “tartarugada” na cabeça. O leitor pode supor como essa história me assusta.

Dos gregos à corte de Luiz XIV e dali a um avião que conduzia o time de Chapecó: por todo o lado, a tragédia parece combinar acaso com a incompetência. Jovens que teriam uma vida toda de glórias pela frente encontram seu fim no cruzamento entre a imperícia e a ganância. Como pensar algo original sobre esse absurdo?

Janus olha para frente e para trás. O acaso nos ronda e desafia a racionalidade. Maquiavel falava do cruzamento entre virtù e fortuna. A primeira seria a soma de suas habilidades pessoais, seus dons e talentos, que podem ser melhorados. Fortuna seria o acaso, aquilo que não se controla. O príncipe de sucesso seria o que combinasse as duas coisas: saberia usar a fortuna e suas habilidades. Por um lado, todos os fatalistas amam a fortuna. Quem usa maktub , a expressão árabe para “ estava escrito” (próximo da latina fatum), pensa imediatamente no quanto somos marionetes de forças super/supranaturais. Por outro lado, todos os adeptos do empreendedorismo falam do poder das escolhas feitas. Sou esculpido por mim ou pela sorte? Sou um cruzamento dessas forças? Qual o grau de autonomia que terei ao longo do ano?

É sempre muito alentador imaginar que exista algo superior a mim que me determine. Esse é o conforto dos fados. O que fez com que Edgar Allan Poe, um dos maiores poetas norte-americanos, fosse brilhante e dependente do álcool? O que fez de Ernest Hemingway um escritor intenso e atormentado que iria até o suicídio? Como a Guerra Civil Espanhola interrompeu a carreira de uma artista total como Frederico García Lorca? Por que um duelo cortou a carreira precoce de um dos grandes inovadores da matemática: Évariste Galois? Era um gênio. Morreu com 21 anos incompletos. São as formas pelas quais as cartas saem do baralho da vida, dirão alguns. Trata-se de escolhas racionais e autônomas, garantem outros.

Jean-Paul Sartre enfatizava muito que nossa experiência antecede nossa essência, que somos e fazemos as coisas a partir de nossa liberdade, que eu sou fruto da liberdade inelutável e angustiante do existir. Há, aqui, uma crença forte da autonomia do humano e da sua vontade.

Meu orgulho impede que eu me entregue ao fatalismo absoluto. Meu senso de equilíbrio sabe que não sou um deus criando mundos. De fato, creio que somos uma linha curva entre o acaso e a força de vontade, entre a fortuna e a virtù . Seu ano será essa curva graciosa e ousada. Você tomará decisões racionais e interessantes. O mundo fará sua oposição usual. O que resultará disso? Difícil saber. A resposta é parte da aventura da nossa biografia.

Jonh Lennon escreveu para seu filho, em “Beautiful Boy”, que a vida é o que acontece enquanto você está ocupado fazendo outros planos.

KARNAL, Leandro. Diálogo das culturas. São Paulo: Contexto, 2017, pp. 94-96.

Observe a construção sintática do parágrafo para analisar as declarações e assinalar a alternativa falsa.

O ano será bom ou ruim? Entramos no campo cediço do acaso. A Fortuna romana era a deusa do acaso. Os gregos a chamavam Tique. Nossas vidas serão regidas pelo aleatório. Às vezes parece que sim. O Romeu de Shakespeare brada ao espaço ser um joguete do destino. A grande Bárbara Heliodora prefere traduzir “I am fortune’s fool” por “eu sou palhaço dos fados”. (Parágrafo 03 – TEXTO I)

Alternativas
Comentários
  • Não tem sentido esta questão ter por alternativa certa a letra B. A oração "Entramos no campo cediço do acaso" não possui um sujeito simples, mas sim um sujeito oculto.Se alguém puder me esclarecer, agradeço!

  • Não sei porque a B é a errada, pois mesmo as orações com sujeito desinencial são classificadas como sujeito simples e determinado.

  • A questão pede pra assinalar a alternativa falsa.

    GABARITO B.

  • Carol, é aí que está o erro, não são todos determinados, o sujeito da segunda oração não é determinado, e sim, oculto.

  • Sempre, coloquei na opcao correta sem se ligar que pedia a incorreta.

  • Eu também não entendi a letra B .De acordo com a gramática do Ernani Terra , sujeito determinado "é aquele que pode ser reconhecido gramaticalmente,mesmo o sujeito implícito na desinência verbal é um sujeito determinado"

  • B) Entramos no campo cediço do acaso. NÓS-SUBENTENDIDO

  • passivel de anulacao

  • Eu vi que na oração "Às vezes parece que sim." o sujeito é inexistente, ou seja, nem todos os sujeitos são simples.

  • "Às vezes parece que sim" verbo Parecer na 3° do Singular

    ás vezes = Loc. Adverbial de Tempo = (de vez em quando)

    Parece = Parecer na 3° do Singular.

    No meu entendimento parece tem como sujeito "nossas vidas"

  • Sujeito simples # Sujeito oculto

    Sujeito simples é explicito na frase

    Sujeito oculto é implícito na frase, também chamado de elíptico ou desinencial.

    EX; Entramos no campo cediço do acaso

    (temos sujeito oculto "nós")

    ALTERNATIVA B) FALSA, POIS AFIRMA QUE TODOS OS SUJEITOS SÃO SIMPLES.

    OBS; A QUESTÃO PEDE A ALTERNATIVA FALSA

    MUITA GENTE AI BOIANDO, MAIS ATENCÃO GALERA !!!

  • Onde está as 11 orações? Tem onze verbos ai?

  • quem ai achou os 11 verbos, por favor, colocar nos comentários.

  • Será - 1

    Entramos - 2

    Era - 3

    Chamavam - 4

    Serão regidas - 5

    Parece - 6

    Brada - 7

    Ser - 8

    Prefere - 9

    Traduzir - 10

    Sou - 11

    Corrigem-me, por favor, se eu errei algo.

  • Alternativa A: Fica incoerente a afirmação de que "temos 8 frases e 11 orações na língua portuguesa". Seria impossível fazer tal mensuração. Parece-nos que houve um erro na elaboração da alternativa, pois o que se queria dizer era "Temos 8 frases e 11 orações no trecho em destaque".

    ALTERNATIVA B: INCORRETA. No trecho em destaque, nem todos os sujeitos são determinados. A determinação do sujeito pode ser observada com a presença de artigos definidos: O ano; A Fortuna; Os gregos; O Romeu; A grande Bárbara Heliodora.

    Há também sujeito simples em: Entramos; Nossas vidas. Entretanto, no trecho "às vezes parece que sim", o sujeito é indeterminado.

    Alternativa C:O pronome "a" foi usado como elemento referencial para retomar o termo "Fortuna" que é núcleo do sujeito da oração anterior.

    Alternativa D: A forma verbal "prefere" rege objeto direto. Esse objeto constitui uma oração reduzida, a qual é introduzida por um verbo no infinitivo. Nesse caso, o objeto direto é oracional.

    Alternativa E: A expressão "ao espaço" tem a função de adjunto adverbial de lugar.

    Prof. Miguel Ângelo do GRAN ONLINE CONCURSOS.