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ID
295102
Banca
UNIRIO
Órgão
UNIRIO
Ano
2008
Provas
Disciplina
Psicologia
Assuntos

“A missa de Isabella Oliveira Nardoni reuniu mais de mil pessoas - entre familiares, amigos, coleguinhas de escola, curiosos e jornalistas. Eu passei a maior parte do tempo ao lado do altar, de onde avistava praticamente a igreja toda. E não vi lágrimas ou percebi qualquer revolta nas pessoas que me rodeavam. Crianças corriam e brincavam sob o nariz do padre, fiéis sorriam, cantavam e batiam palmas como se não houvesse amanhã e o pessoal do grupo de oração recebia os repórteres das várias emissoras de TV presentes como se estivéssemos todos em um certo clima festivo. Resolvi fitar Ana Carolina, 24, mãe da criança morta, como se uma observação mais atenta pudesse me ajudar a entender o que estava acontecendo. Se alguém não tivesse me dito quem ela era, eu nunca teria adivinhado. Ao longo de toda a cerimônia, Ana Carolina manteve aquele tipo de serenidade que só pessoas profundamente espiritualizadas conseguem demonstrar. Sem precisar do ombro de ninguém, ela rezou, cantou e sorriu para as amiguinhas da filha que a cercavam, como se dali a pouco Isabella fosse entrar pela porta e correr para abraçá-la.”

GANCIA, Bárbara. Duas missas, duas impressões. Folha de São Paulo, 05 de abril de 2008. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0504200805.htm “

Era importante que os parentes, amigos e vizinhos estivessem presentes. Levavam-se as crianças – não há representação de um quarto de moribundo até o século XVIII sem algumas crianças. E quando se pensa nos cuidados tomados hoje em dia para afastar as crianças das coisas da morte! Enfim, a última conclusão, e a mais importante: a simplicidade com que os ritos da morte eram aceitos e cumpridos, de modo cerimonial, evidentemente, mas sem caráter dramático ou gestos de emoção excessivos”. ÁRIES, Philippe. História da morte no Ocidente. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003, p. 35

A atitude dos fiéis e da mãe da menina, por não expressar o caráter dramático ou vir acompanhada de gestos de emoção excessivos, causou estranheza à jornalista da Folha de São Paulo. Todavia, segundo Áries, esta atitude era habitual até o século XVIII e corresponde àquela associada à morte que o autor denomina

Alternativas
Comentários
  • A História da Morte no Ocidente - Mirna Galesco

    "I - A morte domada

    Na Idade Média, século XII, a relação com a morte se dava de maneira natural, familiar e sem questionamentos. As pessoas estavam em tal sincronia com os ciclos naturais da vida que, pressentiam e sentiam o momento derradeiro que se aproximava, através de sinais físicos específicos, e se preparavam para ele conforme os orientavam as liturgias. Havia toda uma formalidade ritualística para tal momento. Durante muitos séculos, essa percepção da morte perdurou entre as civilizações cristãs do Ocidente.

    O ritual consistia em gestos herdados dos costumes ancestrais, o que dava àquele tempo uma maior consistência e uma percepção quase estática da realidade. O moribundo no leito, rodeado por seus parentes e amigos, cumpria assim as formalidades: o lamento da vida, o pedido de perdão aos companheiros, a prece declarando a própria culpa a Deus e recomendando sua alma aos céus, recebia a absolvição ministrada pelos sacerdotes, rezava a última prece e a aguardava pela morte em silêncio. E assim, numa cerimônia pública com todos os presentes, inclusive as crianças, aguardava-se a morte, de forma simples e sem caráter dramático.

    Os enterros se davam fora das cidades, e a crença geral era de que os mortos dormiam aguardando o Juízo Final, porém separados em outro espaço. Não havia uma preocupação com o corpo, pagãos e cristãos eram enterrados juntos. O culto aos mártires de origem africana inspirou o culto aos santos e suas igrejas. Cemitério e templo passam então a significar a mesma coisa, mas isto não se restringia só à construção e sim a todo espaço em volta, atenuando assim as repulsas, pois o túmulo do santo seria o centro de um templo."