- ID
- 3105118
- Banca
- VUNESP
- Órgão
- Prefeitura de Buritizal - SP
- Ano
- 2018
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Leia o texto, para responder a questão.
Achei que estava bem na foto. Magro, olhar vivo, rindo
com os amigos na praia. Quase não havia cabelos brancos
entre os poucos que sobreviviam. Comparada ao homem de
hoje, era a fotografia de um jovem.
Tinha cinquenta anos naquela época, entretanto, idade
em que me considerava bem distante da juventude. Se me
for dado o privilégio de chegar aos noventa em pleno domínio
da razão, é possível que uma imagem de agora me cause
impressão semelhante.
O envelhecimento é sombra que nos acompanha desde
a concepção. Lidar com a inexorabilidade desse processo
exige uma habilidade na qual somos inigualáveis: a adaptação. Não há animal capaz de criar soluções diante da adversidade como nós, de sobreviver em nichos ecológicos que
vão do calor tropical às geleiras do Ártico.
Da mesma forma que ensaiamos os primeiros passos por
imitação, temos que aprender a ser adolescentes, adultos e a
ficar cada vez mais velhos.
A ideia de envelhecer aflige mulheres e homens modernos, muito mais do que afligia nossos antepassados. Sócrates tomou cicuta aos 70 anos, Cícero foi assassinado aos 63,
Matusalém, sabe-se lá quantos anos teve, mas seus contemporâneos gregos, romanos ou judeus viviam em média 30
anos. No início do século 20, a expectativa de vida ao nascer,
nos países da Europa mais desenvolvida, não passava dos
40 anos.
Os que estão vivos agora têm boa chance de passar dos
oitenta. Se assim for, é preciso sabedoria para aceitar que
nossos atributos se modificam com o passar dos anos. Que
nenhuma cirurgia devolverá, aos 60, o rosto que tínhamos
aos dezoito, mas que envelhecer não é sinônimo de decadência física para aqueles que se movimentam, não fumam,
comem com parcimônia, exercitam a cognição e continuam
atentos às transformações do mundo.
Considerar a vida um vale de lágrimas, no qual submergimos de corpo e alma ao deixar a juventude, é torná-la experiência medíocre. Julgar, aos 80 anos, que os melhores foram
aqueles dos 15 aos 25 é não se dar conta de que a memória
é editora autoritária, capaz de suprimir por conta própria as
experiências traumáticas e relegar ao esquecimento as inseguranças, medos, desilusões afetivas, riscos desnecessários
e as burradas que fizemos nessa época.
Nada mais ofensivo para o velho do que dizer que ele
tem “cabeça de jovem”. É considerá-lo mais inadequado
do que o rapaz de 20 anos que se comporta como criança
de dez.
Ainda que maldigamos o envelhecimento, é ele que nos
traz a aceitação das ambiguidades, das diferenças, do contraditório e abre espaço para uma diversidade de experiências com as quais nem sonhávamos anteriormente.
(Drauzio Varela, A arte de envelhecer. https://drauziovarella.com.br.
Adaptado)
No contexto, a afirmação do autor segundo a qual “a memória é editora autoritária” caracteriza-se pelo emprego de palavras em sentido