SóProvas


ID
3108640
Banca
FCC
Órgão
SANASA Campinas
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

    De cedo, aprendi a subir ladeira e a pegar bonde andando. Posso dizer, com humildade orgulhosa, que tive morros e bondes no meu tempo de menino.

      Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada. Que tinha esse nome a propósito: lá pelos altos do Jaguaré, quando fazia muito frio, no morro costumava gear. Tínhamos um par de sapatos para o domingo. Só. A semana tocada de tamancos ou de pés no chão.

      Não há lembrança que me chegue sem os gostos. Será difícil esquecer, lá no morro, o gosto de fel de chá para os rins, chá de carqueja empurrado goela abaixo pelas mãos de minha bisavó Júlia. Havia pobreza, marcada. Mas se o chá de carqueja me descia brabo pela goela, como me é difícil esquecer o gosto bom do leite quente na caneca esmaltada estirada, amorosamente, também no morro da Geada, pelas mãos de minha avó Nair.

      A miséria não substituíra a pobreza. E lá no morro da Geada, além do futebol e do jogo de malha, a gente criava de um tudo. Havia galinha, cabrito, porco, marreco, passarinho, e a natureza criava rolinha, corruíra, papa-capim, andorinha, quanto. Tudo ali nos Jaguarés, no morro da Geada, sem água encanada, com luz só recente, sem televisão, sem aparelho de som e sem inflação.

      Nenhum de nós sabia dizer a palavra solidariedade. Mas, na casa do tio Otacílio, criavam-se até filhos dos outros, e estou certo que o nosso coração era simples, espichado e melhor. Não desandávamos a reclamar da vida, não nos hostilizávamos feito possessos, tocávamos a pé pra baixo e pra cima e, quando um se encontrava com o outro, a gente não dizia: “Oi!”. A gente se saudava, largo e profundo: − Ô, batuta*!

*batuta: amigo, camarada.

(Texto adaptado. João Antônio. Meus tempos de menino. In: WERNEK, Humberto (org.). Boa companhia: crônicas. São Paulo, Companhia das Letras, 2005, p. 141-143) 

Da leitura do trecho Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada (2° parágrafo), subentende-se que o morro da Geada

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA C

    ? Se recorrermos ao texto, podemos achar uma outa opção, mas a questão pede que analisemos somente o trecho proposto:

    ? Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada [...]

    ? Temos a conjunção comparativa "como" marcando a ideia de que o morro da Geada passou da condição de morro pobre para um morro com miséria, logo a melhor resposta para a questão é a letra "c".

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  • Achei o gabarito meio forçado...

    "passou de pobre a miserável em algum momento depois da infância do autor".

    .

    Li e reli o texto, mas não consegui enxergar/inferir alguma progressão temporal, algum momento depois da infância.

    O comentário do colega Arthur também não me esclarece. A conjunção como = ok, está comparando. Mas cadê a questão da progressão do tempo?

    .

    Enfim, segue o jogo...

  • Questão miserável

  • Como interpretação de texto é bem pessoal!!!!

    Marquei a letra E, pois na frase"Nossa pobreza não era envergonhada." a meu ver o autor quis dizer que até certo momento os moradores não tinham compreensão da vida miserável em que viviam para então, a partir disso, terem vergonha do modo de vida em que se encontravam.

  • peçam para o professor comentar

  • A passagem de tempo é garantida pelo uso do pretérito mais-que-perfeito: Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada (2° parágrafo). Esse tempo verbal indica um fato passado anterior a outro fato também passado. A situação do morro do Jaguaré passou de pobre ( fato anterior ao fato passado ) para miserável ( fato passado) . Foi assim que entendi.

    Simon diz, C.

  • Pra mim,se ele achava que era pobre quem morava no morro era bem pior kkkkkk.

    Se tivesse uma alternativa nessa linha de raciocínio, marcaria sem dúvida!

    De qualquer forma acho a E mais correta

  • O mais importante é saber que o autor tem uma visão global da sua infância, ao dizer que a pobreza "ainda não" fora substituída pela miséria este ainda não denucia que mais a frente as coisas vão piorar.

  • Aqui está a importância de se ler o indicador da fonte do texto e compreender o momento propriamente da sua escrita:

    (Texto adaptado. João Antônio. Meus tempos de menino. In: WERNEK, Humberto (org.). Boa companhia: crônicas. São Paulo, Companhia das Letras, 2005, p. 141-143) 

    Desse modo, se a escrita ocorreu em 2005, obviamente, o autor do texto já não mais está vivenciando seus "tempos de menino" e, além disso, a questão está sendo aplicada em 2019. São dois elementos suficientes corroborando a tal "progressão temporal" questionada pelo colega.

    Portanto, na minha opinião, fica muito clara a comparação dada pela conjunção "como", assistida pelo lapso temporal estabelecido, conforme o exposto na explicação anterior, que o morro da Geada passou de pobre a miserável em algum momento depois da infância do autor.

    Boa sorte a todos.

  • Discordo do gabarito.

    A história é contada pelo autor, remontando ao tempo em que era criança e vivia no morro da Geada, dando a entender que ele, naquele tempo de criança, não tinha consciência da condição miserável em que viviam seus habitantes, vide alternativa E.

  • Depois de reler esse texto, penso que a chave da questão está no tempo verbal pretérito mais que perfeito, que indica um acontecimento no passado mais passado que outro passado + o uso do "ainda"

    "Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada (2° parágrafo)"

    Troque o fora por tinha sido (uma troca possível, pois tinha sido é o período composto de fora) e você terá:

    "ainda não tinha sido substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada"

    Se ainda não tinha sido, então é porque em algum momento ele FOI! Do contrário, caso aquele morro nunca tivesse ficado tão miserável quanto o da Geada, não precisaria usar o 'ainda"