- ID
- 3129322
- Banca
- VUNESP
- Órgão
- Prefeitura de Serrana - SP
- Ano
- 2018
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Chovia demais naquela manhã, uma chuva calma que
molhava o piso de vermelhão da varanda da casa onde morávamos, naquela época já de aluguel. Uma casa velha de
madeira, a varanda circundada pela mureta de alvenaria. A
chuva alagando o território onde aquele que fui brincava de
escorregar no piso. Depois, ao longo da infância, eu ia continuar preferindo estas brincadeiras em pisos molhados aos
rios e às piscinas, sendo esta, inclusive, uma das razões de
nunca ter aprendido a nadar.
Havia umas figurinhas de decalque a água, provavelmente presente de meu pai, e comecei a molhá-las no chão e
transferi-las para a parede da casa. A chuva continuava seu
trabalho lá fora, e eu fazia minhas pequenas mágicas, deixando inscrita nas paredes uma mensagem qualquer.
Não sei do que tratavam aquelas figurinhas, não me lembro nem da cor, nem da quantidade, nem da procedência,
mas tudo isso não importa, o que marcou como minha primeira lembrança foi este ato primitivo de desenhar nas paredes
da caverna, de deixar uma mensagem. Meus três anos não
permitiam mais do que o ato vazio de tentar uma comunicação. Sozinho na varanda, a chuva a me isolar dos amigos e
da família, a sensação de abandono me punha a escrever
nas paredes, náufrago de um tempo lutando para estabelecer
contatos.
Quem seria este interlocutor que o menino procurava?
Um amigo? Alguém da família? O pai sempre ausente,
sempre fazendo negócios em outra cidade? As meninas que
moravam na casa ao lado? Talvez todos, mas principalmente
o adulto que a criança se tornaria. Essa criança queria falar
comigo, por isso a imagem me ficou tão nítida na lembrança.
Há algumas cenas da rua que não consigo descrever.
Mas a rua está perdida, lembro-me de um armazém grande
numa esquina, a Casa Verde, de um portão que dava para
um pátio, de algumas cercas de balaústres, e só. É melhor
esquecer a geografia, ela não ficou arquivada em fotos – não
tínhamos o hábito de fotografar.
(Chove sobre minha infância. Record, 2014. Adaptado)
No terceiro parágrafo, em – mas tudo isso não importa –, o pronome destacado refere-se