SóProvas


ID
3221734
Banca
CIEE
Órgão
SPTrans
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A minha salamandra

    Certa vez, escrevendo uma novela, precisei saber se uma salamandra tinha quatro ou seis pernas. Já não me lembro em que episódio novelesco pretendia envolver as pernas da minha salamandra, mas a verdade é que precisava saber — e não fiquei sabendo.
    Que sei eu a respeito de minhas próprias pernas? Pensava então, deixando que elas me levassem para outros caminhos, fora da ficção.
    Um ficcionista às vezes precisa saber coisas muito esquisitas. A experiência própria nem sempre ajuda. Passei, por exemplo, a minha infância nos galhos de uma mangueira, chupando manga o dia todo, e não soube responder a um meu amigo, excelente romancista, quanto tempo levava para germinar um caroço de manga.
    Contou‐me ele, na época, que andou precisando saber este pormenor, em razão de uma história que estava escrevendo. Depois de perguntar a um e outro, e não obtendo senão respostas vagas, telefonou para a repartição do Ministério da Agricultura que lhe pareceu mais apta a fornecer‐lhe a informação. O funcionário que o atendeu ficou simplesmente perplexo:
    — Caroço de manga? Que brincadeira é essa?
    Como insistisse, informaram‐lhe que, realmente, havia quem talvez soubesse — um especialista no assunto, lotado num departamento ao qual estava afeto o setor de fruticultura. Discou para lá — mas só conseguiu colher vagos palpites:
    — Um caroço de manga? Bem, deve levar um ou dois meses, o senhor não acha?
    — Não acho nada: preciso saber com exatidão.
    — Por quê?
    — Bem, porque...
    Outros telefonemas, que somente despertavam reminiscências infantis:
    — Na minha casa tinha uma mangueira. A manga‐espada, por exemplo, se bem me lembro...
    — Boa é a manga carlota, aquela pequenina, sem fibra nenhuma... Lá no Norte chamam de itamaracá.
    — O caroço? Bem, o caroço, para lhe dizer com franqueza...
    Resolveu telefonar para o Gabinete do Ministro:
    — Queria uma informaçãozinha de Vossa Excelência. 
    O ministro não sabia. Que futuro tem um país de economia essencialmente agrícola se ninguém, nem o próprio Ministro da Agricultura, sabe informar quanto tempo leva para germinar um caroço de manga?
    Volto à minha salamandra. Vejo‐a esquiva e silenciosa a deslizar por entre as pedras, quantas pernas? Que futuro tenho eu como escritor, se não sei dizer com quantas pernas se faz uma salamandra? O mundo anda cheio de pernas, e o coração do poeta já perguntou para que tanta perna, meu Deus. As da salamandra — quatro, ou seis — nada acrescentam ao meu mundo interior, senão a ligeira desconfiança de que acabo tendo quatro. No entanto, as de uma jovem galgando comigo as pedras do Arpoador, por exemplo, apenas duas, podem sustentar o universo — vertiginoso universo onde as sensações germinam bem mais depressa que um caroço de manga. Onde se acendem estrelas inexistentes e os astros desandam nas suas órbitas. Onde se abrem abismos de uma profundeza que nem a imaginação do romancista ousa devassar. Onde vicejam plantas bem mais exóticas que uma mangueira de quintal, em cujas sombras se arrastam seres vorazes e bem mais misteriosos que a salamandra, salamandras...
(SABINO, Fernando. As melhores crônicas. 14ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2010.)

Levando em consideração as seguintes afirmativas, o acento indicativo de crase é facultativo em:

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA A

    ? ?Volto à minha salamandra.? (18º§)

    ? Volto a alguma coisa (preposição "a") + uso facultativo do artigo definido "a" antes do pronome possessivo adjetivo "minha" (=à minha OU a minha).

    Baixe a Planilha de Gestão Completa nos Estudos Grátis: http://3f1c129.contato.site/plangestaoestudost3

    FORÇA, GUERREIROS(AS)!! 

  • antes de pronome possessivo feminino> minha> crase facultativa

  • Crase Facultativa

    a) Diante de nomes de pessoas do sexo feminino:

    Ex: Ela fez referência a (à) Sandra

    b) Diante de pronomes possessivos femininos

    Ex: Obedeço a (à) minha mãe

    c) Depois da preposição até

    Ex: Fomos até a(à) feira.

  • Diante de pronome possessivo feminino, a crase é facultativa.

  • Diante de pronome possessivo feminino, a crase é facultativa.

  • A questão alude o assunto crase e que que o candidato encontre a única opção que a crase é facultativa. Vejamos:

    a) Em “Volto à minha salamandra.”, o verbo VOLTAR rege a preposição "a", e o pronome possessivo feminino no singular torna a crase facultativa quando o verbo tiver a regência. CORRETA.

    b) Em "À noite", em locução adverbial temos a presença da crase obrigatória. INCORRETA.

    c) Em "Refiro-me às mangas", o verbo REFERIR, exige a preposição e a palavra MANGAS aceita o artigo "a", com isso faz a junção criando o evento obrigatório da crase. INCORRETA.

    d) Em "“Um ficcionista às vezes", ocorre a crase obrigatoriamente em locução adverbial. INCORRETA.

    Todas levam a crase, mas somente a letra a é facultativa.

    GABARITO A