SóProvas


ID
3426475
Banca
VUNESP
Órgão
Prefeitura de Cerquilho - SP
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Leia o texto para responder à questão.



         Um dia vou contar numa crônica a lenta agonia do meu gato amazonense quando tive de me separar dele para viver em São Paulo. Agora a história é outra: um cachorro…
         Um cão de raça, com pedigree, como se diz. Forte, belo, musculoso, de pelagem castanha, focinho altivo e dentes perfeitos. Um príncipe de quatro patas.
       Uma corrente de aço amarrava-o a um poste, enquanto o dono, que comprava brioches numa das boas padarias afrancesadas de São Paulo, andava livremente.
       Gania como um louco. Às vezes parecia chorar de dor, saudade, solidão ou desamparo. Dava dó. E o dono demorava. Então os transeuntes se apresentaram. Paravam perto do poste, admiravam a beleza do animal e se condoíam com o sofrimento alheio. Alguém se revoltou com tamanha insensibilidade do dono. Uma mulher se agachou, murmurou palavras ternas ao pobre bicho, acariciou-o com dedos cheios de anéis. Esse gesto comoveu o mundo.
         Enfim, ele apareceu à porta da padaria. É natural que o cão tenha sido o primeiro a farejar a presença de seu dono; os transeuntes abriram-lhe passagem, e o reencontro foi um alvoroço, uma festa diurna. “Ele é mimado”, disse o dono, como se falasse de um filho.
       O pelourinho foi banido, e o poste readquiriu sua função de poste. Solto e livre como um verdadeiro cidadão, o cachorro saltou de alegria, enchendo a manhã de esperança; depois, ele e outros bichos foram o centro da conversa. É uma dádiva que, num domingo ensolarado, o assunto não seja política.
       A calçada ficou quase deserta. Um homem a poucos metros do poste permaneceu na mesma posição. É um negro desempregado. Nesse domingo de Ramos ele é também um mendigo. O animal roubou-lhe a atenção, mas o homem ainda mantinha seus gestos. Sentado e com a mão espalmada, o homem pede uma moeda ou restos de comida.
       Outro dia, bem cedo, passei pela calçada da padaria e lá estava o homem. Uma roda de curiosos o observava. Sentado no mesmo lugar, mãos e braços caídos. Morto. Desde quando? Continuei meu passeio fútil. E perguntei a mim mesmo, com curiosidade, por onde andaria aquele belo cachorro.


(Milton Hatoum. “Domingo sem cachorro”.
http://terramagazine.terra.com.br, 17.04.2006. Adaptado)

Segundo o texto,

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA B

    ? Visão do animal: Um cão de raça, com pedigree, como se diz. Forte, belo, musculoso, de pelagem castanha, focinho altivo e dentes perfeitos. Um príncipe de quatro patas. Uma corrente de aço amarrava-o a um poste, enquanto o dono, que comprava brioches numa das boas padarias afrancesadas de São Paulo, andava livremente. Gania como um louco. Às vezes parecia chorar de dor, saudade, solidão ou desamparo. Dava dó. E o dono demorava. Então os transeuntes se apresentaram. Paravam perto do poste, admiravam a beleza do animal e se condoíam com o sofrimento alheio. Alguém se revoltou com tamanha insensibilidade do dono. Uma mulher se agachou, murmurou palavras ternas ao pobre bicho, acariciou-o com dedos cheios de anéis. Esse gesto comoveu o mundo.

    ? Visão do homem: Um homem a poucos metros do poste permaneceu na mesma posição. É um negro desempregado. Nesse domingo de Ramos ele é também um mendigo. O animal roubou-lhe a atenção, mas o homem ainda mantinha seus gestos. Sentado e com a mão espalmada, o homem pede uma moeda ou restos de comida.

    ? Ou seja, o animal foi caracterizado com atributos humanos (dentes bonitos, musculoso) e o homem representou características contrários; o autor usou esse recurso para evidenciar a "invisibilidade social" que o homem representa (ele representa a classe "varrida" para debaixo do tapete da sociedade).

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    ? FORÇA, GUERREIROS(AS)!!

  • Assertiva b

    atribui-se ao animal algumas características que normalmente são comuns apenas à espécie humana, em contraste com a atenção que o desempregado à porta da padaria recebia.

  • Que texto triste...

  • Texto bem triste..

  • Acertei a questão por ja ter me treinado a "pensar" como as bancas. Há na questão a pegadinha da diferença entre compreensão e interpretação de texto. No caso, trata-se de compreensão de texto. A banca não quer a realidade do entendimento do texto, apenas aquilo que está escrito pelo autor.

  • A questão requer Compreensão Textual e Interpretação Textual.


    Quando se fala em Compreensão Textual, as informações estão no texto. Os comandos são:

    Segundo o texto...

    O texto informa que...

    No texto...


     

    Já a Interpretação Textual, as informações estão além do texto, é uma questão de inferência, de apreender as ideias do texto. Os comandos são:

    Depreende-se / infere-se / conclui-se do texto que...

    É possível subentender a partir do texto que...

    O texto permite deduzir que...

    Qual a intenção do autor quando afirma que...


     

    ALTERNATIVA (A) INCORRETA – Segundo o texto, o alvoroço provocado pelos transeuntes não foi por conta do porte do animal, embora eles tenham admirado a beleza dele, mas, sobretudo, pelas condições de o cão estar preso a um poste, sozinho, às vezes parecendo chorar de dor, e isso foi o que chamou a atenção de quem passava.


    ALTERNATIVA (B) CORRETA – Segundo as ideias presentes no texto, o animal passou a ser mais percebido do que um ser humano que, evidentemente, precisava do toda a atenção. A inferência que se pode atribuir com as ideias do texto é que boa parte da população não está observando o que está ao seu redor.


    ALTERNATIVA (C) INCORRETA – O último parágrafo do texto evidencia muito bem que o autor não se comoveu com a situação do homem, pois só se perguntava por onde estaria o cachorro. 


     

    ALTERNATIVA (D) INCORRETA – Depois do ocorrido, os transeuntes passaram a falar sobre o cão solto e outros bichos, não apenas sobre o cão que fora solto por seu dono. Tal informação pode ser corroborada no 6º parágrafo.



    ALTERNATIVA (E) INCORRETA – Ele se deu conta do sofrimento do animal, mas, devido a sua situação de penúria, manteve seus gestos e atitudes a fim de que os transeuntes dessem uma moeda ou restos de comida a ele.



    GABARITO DA PROFESSORA: ALTERNATIVA (B)