“Sentia-se cansada. A barriga, as pernas, a cabeça, o corpo todo era um enorme peso que lhe caía
irremediavelmente em cima. Esperava que a qualquer momento o coração lhe perfurasse o peito, lhe rasgasse a
blusa.
Como seria o coração?
Teria mesmo aquela forma bonita dos postais coloridos?
Seriam todos os corações do mesmo formato?
Será que as dores deformam os corações?
[...]
Aos vinte e três anos disseram-lhe que tinha o útero descaído. Bom seria que caísse de vez! Estava farta daquele
bocado de si que ano após ano, enchia, inchava, desenchia e lhe atirava para os braços e para os cuidados mais
um pedacinho de gente.
Não. Não voltaria para casa.”
(SALÚSTIO, Dina. “Liberdade adiada”. Mornas eram as noites. Praia: ICDL, 1994. p. 5).
O trecho acima foi escrito pela escritora cabo-verdiana Dina Salústio. Em relação ao universo feminino
representado na narrativa, destaca-se: