SóProvas


ID
4008397
Banca
FUMARC
Órgão
Câmara de Igarapé - MG
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A GENTE É VELHO...
Rubem Alves 



      A gente é velho quando, para descer uma escada, segura firme no corrimão. E os olhos olham para baixo para medir o tamanho dos degraus e a posição dos pés.
     Quando eu era moço, não era assim. Não segurava no corrimão e não media degraus e pés. Descia os dois lances de escada do sobrado do meu avô com a mesma fúria com que um pianista toca o prelúdio 16, de Chopin. Ele, pianista, não pensa. Se pensasse, não conseguiria tocar, porque o pensamento não consegue seguir a velocidade das notas. Toca porque seus dedos sabem sem que a cabeça saiba. O pianista se abandona ao saber do corpo. Assim descia eu as escadas do sobradão do meu avô. Mas no dia em que o pé começou a tropeçar, a cabeça compreendeu que eles, os pés, já não sabiam como sabiam antes. Agora é preciso o corrimão. Depois virão as bengalas, corrimões portáteis que se leva por onde se vai.
      A gente é velho quando, no restaurante, é preciso cuidado ao se levantar. Moço, as pernas sabem medir as distâncias que há debaixo da mesa. Mas, agora, é preciso olhar para medir a distância que há entre o pé da mesa e o bico do sapato. Há sempre o perigo de que o bico do sapato esbarre no pé da mesa e o pé da mesa lhe dê uma rasteira, você se estatelando no chão. Quando se é velho, até uma pequena queda pode se transformar em catástrofe. Há sempre o perigo de uma fratura.
     A gente é velho quando é objeto de humilhações bondosas. Como aquela que aconteceu comigo 25 anos atrás. O metrô estava cheio. Jovem, segurei-me num balaústre. Notei então que uma jovem de uns 25 anos me olhava com um olhar amoroso. Olhei para ela. E houve um momento de suspensão romântica. Minha cabeça e meu coração se alegraram. Até o momento em que ela se levantou com um sorriso e me ofereceu o seu lugar. Foi um gesto de bondade. Com o seu gesto ela me dizia: "O senhor me traz memórias ternas do meu avô..."
     A gente é velho quando entra no box do chuveiro com passos medrosos e cuidadosos. Há sempre o perigo de um escorregão. Por via das dúvidas, mandei instalar no box da minha casa uma daquelas barras metálicas horizontais que funcionam como corrimão.
    A gente é velho quando começa a ter medo dos tapetes. Os tapetes são perigosos de duas maneiras. Há os pequenos tapetes de fundo liso, que escorregam. E há os grandes tapetes que ficam com as pontas levantadas e que fazem ondas. O pé dos velhos movimenta-se no arrasto e tropeça na ponta levantada do tapete ou na armadilha da onda.
     A gente é velho quando começa a ter medo dos fotógrafos. Fugir das fotos de perfil porque nelas as barbelas de nelore aparecem. Nelore é um boi branco. Os pastos estão cheios deles, vivos, e as mesas também, sob o disfarce de bifes. E eles têm uma papada balançante, as barbelas, que vai da ponta do queixo (boi tem queixo?) até o peito. Velhice é quando as barbelas de nelore começam a aparecer. Aí vem a humilhação conclusiva. Prontas as fotos, eles nos mostram e dizem: "Como você está bem!"
    A gente é velho quando, tendo de subir ao palco para dar uma palestra, tem sempre uma jovem simpática que nos oferece a mão, temendo que a gente se desequilibre e caia. A gente aceita o oferecimento com um sorriso. Nunca se sabe...
    A gente é velho quando perde a vergonha e se desnuda fazendo as confissões que acabei de fazer... 


Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3010200704.htm Acesso em: 27 ago. 2016 

A posição do pronome destacado é facultativa em:

Alternativas
Comentários
  • A posição do pronome oblíquo átono (me, te, se, lhe, vos, o[s], a[s], etc.) pode ser distintamente três: próclise (antes do verbo. p.ex. não se realiza trabalho voluntário), mesóclise (entre o radical e a desinência verbal, p.ex. realizar-se-á trabalho voluntário) e ênclise (após o verbo, p.ex. realiza-se trabalho voluntário). 

    Em todas as opções de resposta existe alternativa de colocação pronominal.

    a) A convivência familiar contribui para que os idosos se sintam amados.

    Incorreto. Há oração subordinada dentro da qual existe um sujeito entre a palavra atrativa (que) e o pronome (se). Em casos análogos a esse, deve-se manter a próclise, devido à atração remota promovida pela conjunção "que".

    b) A velhice pode nos levar a refletir sobre quem somos e que fomos.

    Correto, mas com ressalvas. A despeito de haver mais de uma maneira de posicionar o pronome, a construção em tela não é largamente aceita. Há uma locução verbal cujo verbo principal está no infinitivo. Nesses casos, há três distintas colocações;

    I - Ênclise ao verbo auxiliar (pode-nos levar);

    II - Próclise ao verbo auxiliar (nos pode levar);

    III - Ênclise ao verbo principal (pode levar-nos).

    c) Em outras palavras: nós os abandonamos em suas casas, sem carinho.

    Correto. Há mais de uma possibilidade de colocação. O pronome pessoal "nós" não é fator que obriga somente próclise, podendo, também, haver ênclise: "nós abandonamo-los". Possivelmente a banca levou em conta a eufonia. De fato a frase "nós os abandonamos", além de melhor pronunciável, soa melíflua aos ouvidos, enquanto "nós abandonamo-los", estrutura mais rara e cuja pronúncia é atípica, causa certo desconforto. Apesar disso, inexiste erro;

    d) Para que sejamos íntegros, é preciso que os idosos se tornem respeitados.

    Incorreto. Há uma oração subordinada dentro da qual existe um sujeito entre a palavra atrativa (que) e o pronome (se). Em casos análogos a esse, deve-se manter a próclise, devido à atração remota promovida pela conjunção "que".

    Gabarito da banca: Letra B

    Gabarito do monitor: Letras B e C

  • Tanto a letra B quanto a C são casos facultativos de próclise/ênclise.

  • Cabe a enclise em pronome no infitivio que não tenha uma palavra atrativa antes ... GAB B

  • cuidado com os comentários sobre a questão da ênclise, pois o INFINITIVO aceita ênclise mesmo com palavra ATRATIVA 

  • Assertiva b

    A velhice pode nos levar a refletir sobre quem somos e que fomos.

  • Resposta QC:

    A posição do pronome oblíquo átono (me, te, se, lhe, vos, o[s], a[s], etc.) pode ser distintamente três: próclise (antes do verbo. p.ex. não se realiza trabalho voluntário), mesóclise (entre o radical e a desinência verbal, p.ex. realizar-se-á trabalho voluntário) e ênclise (após o verbo, p.ex. realiza-se trabalho voluntário). 

    Em todas as opções de resposta existe alternativa de colocação pronominal.

    a) A convivência familiar contribui para que os idosos se sintam amados.

    Incorreto. Há oração subordinada dentro da qual existe um sujeito entre a palavra atrativa (que) e o pronome (se). Em casos análogos a esse, deve-se manter a próclise, devido à atração remota promovida pela conjunção "que".

    b) A velhice pode nos levar a refletir sobre quem somos e que fomos.

    Correto, mas com ressalvas. A despeito de haver mais de uma maneira de posicionar o pronome, a construção em tela não é largamente aceita. Há uma locução verbal cujo verbo principal está no infinitivo. Nesses casos, há três distintas colocações;

    I - Ênclise ao verbo auxiliar (pode-nos levar);

    II - Próclise ao verbo auxiliar (nos pode levar);

    III - Ênclise ao verbo principal (pode levar-nos).

    c) Em outras palavras: nós os abandonamos em suas casas, sem carinho.

    Correto. Há mais de uma possibilidade de colocação. O pronome pessoal "nós" não é fator que obriga somente próclise, podendo, também, haver ênclise: "nós abandonamo-los". Possivelmente a banca levou em conta a eufonia. De fato a frase "nós os abandonamos", além de melhor pronunciável, soa melíflua aos ouvidos, enquanto "nós abandonamo-los", estrutura mais rara e cuja pronúncia é atípica, causa certo desconforto. Apesar disso, inexiste erro;

    d) Para que sejamos íntegros, é preciso que os idosos se tornem respeitados.

    Incorreto. Há uma oração subordinada dentro da qual existe um sujeito entre a palavra atrativa (que) e o pronome (se). Em casos análogos a esse, deve-se manter a próclise, devido à atração remota promovida pela conjunção "que".

    Gabarito da banca: Letra B

    Gabarito do monitor: Letras B e C

  • é só no meu que não tem nada destacado? Será por que eu uso o celular?
  • Segue algumas observações:

    • Letras A e D--> Deve-se observar a ambiência das conjunções integrantes, e por isso prevalece a próclise;
    • Letra B --> A gramática majoritária condena o uso do pronome oblíquo átono solto entre dois verbos;
    • Letra C--> Pronome pessoal e demonstrativos facultam o uso da próclise.

    Marquei a alternativa C, coadunando com o monitor do Qc.

    Ele mencionou uma questão de eufonia( a fonia ruim) como possível análise da banca.

    Conclusão: Mesmo que você domine certa matéria ou pontos da matéria, irá se deparar com questões como essa.

    Questões que até mesmo uma equipe de professores não sabem justificar o gabarito ou apenas os justificam.

    Deixo claro que o comentário supracitado não tem o intuito de demérito do profissionais da plataforma, pelo contrário.

  • famosa questão que deveria ser anulada