SóProvas


ID
4959397
Banca
IBADE
Órgão
Prefeitura de Vitória - ES
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A uma senhora

    Com que então, minha senhora, está fazendo mais um ano de casada. Não lhe mando flores, que a distância não permite. Telefonar custa uma pequena fortuna, e ruídos errantes entram na conversa, abafando as vozes; nada mais enervante do que sentir a voz sem poder captá-la, ou recolher somente pedaços de frase, palavras soltas. Não lhe mando telegrama, pois a senhora mesmo o dispensou: costuma não chegar, seja porque há crise política por aqui, seja que há crise militar por aí, e vice-versa; ou as duas crises juntas nos dois lugares. E telegrama está sempre omitindo, calando; de tanto calar, não exprime nada. Por isso, escrevo-lhe. Carta leva quatro dias para chegar. Tanto melhor: quando a receber, estará pensando em outra coisa. Se fosse pelo correio, reconheceria logo a letra no envelope. Indo pelo jornal (astúcia minha), lerá desprevenida as primeiras linhas, até descobrir: “É comigo”.

    É com a senhora mesmo e com seu marido que estou falando, mas tenho motivo especial para dirigir-me aos dois por seu intermédio. Conheço-a há bem mais tempo do que a ele. Posso dizer, sem exagero, que a vi nascer; quando ele me apareceu, era homem feito e vinha trazido pela senhora. Aprovei a escolha, porque função de amigo é aprovar; e acho que não andei mal. A prova é esta carta.

     Estou me lembrando de como as coisas se passaram. Tudo é tão liso na vida de uma pessoa; os dias repetem os dias; de súbito não repetem mais. A pessoa é a mesma; os fatos mudam. A senhora levava uma vidinha tranquila de estudante, ganhara bolsa em Paris, não era de coquetéis; por desfastio, foi a um, conheceu lá um fulano que lhe falou qualquer coisa; não era conversa de pegar, pegou. Tratava-se de ilustre desconhecido, ou antes, de dois ilustres desconhecidos um para o outro. Ele estava de passagem e voltou logo para o seu país. Assim desconhecidos, um mês depois se casavam, à base de intuição e maluquice. Paris foi trocada por outra cidade, de outra nação. Ficamos sem a senhora e nem nos queixamos; obrigação de amigo é não se queixar. Eu aprendera sozinho: vida é aceitação. 

    Os dois malucos conheceram o delicioso e o difícil, a rotina e a quimera, os problemas, as melancolias, os sustos, as angústias, as distrações infantis que vêm depois das angústias; no total, viveram. A população do globo foi aumentada pelos dois em escala razoável: nem muito nem com avareza. Daqui estou ouvindo, ou esperando ouvir, na visita do ano, os gritos de três molequinhos que me julgam uma peça arqueológica simpática. Também me divirto com eles, nesse período; e com isso, e com as demais presenças, embalo a falta da senhora no resto do ano. Pois amigo deve ter imaginação suficiente para fazer, de falta, companhia.

     A senhora, seu marido e os moleques recebam este abraço absolutamente real.


(ANDRADE, C. Drummond de Cadeira de balanço. 11 ed. Rio de Janeiro: J. Olympio Editora, 1979, p. 142-143.)

“Se fosse pelo correio, reconheceria logo a letra no envelope.” (1º §) No período transcrito acima, a correlação entre os tempos expressos nas formas verbais está de acordo com a gramática da língua portuguesa. Das alterações feitas no período, aquela em que entre os tempos verbais NÃO há correlação, estando, portanto, o período em desacordo com a gramática da língua é:

Alternativas
Comentários
  • Alguém explica, por favor!

  • Gab: Letra B

  • entendi foi nada. Marquei E

  • A questão trata do tema da "correlação verbal", que é a "(...) harmonia, pela coerência que se dá entre as formas verbais expressas no discurso propriamente dito, com vistas a fazer com que prevaleça o aspecto lógico, objetivo das ideias manifestadas"

    (fonte: https://mundoeducacao.uol.com.br/gramatica/correlacoes-verbais.htm#:~:text=Correla%C3%A7%C3%B5es%20verbais%20se%20definem%20pela,l%C3%B3gico%2C%20objetivo%20das%20ideias%20manifestadas. Acesso em 18 de maio de 2021).

    A correlação verbal caracteriza-se pela harmonia, pela coerência que se dá entre as formas verbais expressas numa frase, numa sequência de frases e, consequentemente, num período propriamente dito. Dessa forma, constatemos alguns exemplos:

    Uma dica que peguei com o professor Felipe Luccas (estratégia concursos), que elimina boa parte de questões desse tipo:

    "Se eu pudesse, eu faria;

    Caso eu possa, eu farei;

    Se eu puder, eu farei"

  • As conjunções condicionais caso e se têm certas exigências distintas.

    A primeira repele o futuro do subjuntivo - (futuro do subjuntivo indica uma ação que ainda não aconteceu no futuro, mas que poderá acontecer, expressando eventualidade e possibilidade.)

    a segunda, o presente do subjuntivo (presente do subjuntivo é um tempo verbal usado para indicar uma ação do presente ou do futuro.)

    uma resposta menos formal, o FOSSE dá uma ideia de possibilidade, já o RECONHECERIA seria um possível resultado, caso se concretizasse o fosse.

    kkkk buka mesmo

  • SSE + IA

    Caso fosse pelo correio, reconheceria