De mãos dadas com os pais
Enquanto Fabrício vê as mãos livres de sua mãe gesticulando, lembra que nem sempre foi fácil encaixar seus dedos nos dela. Na infância eram muitos filhos. E na hora de passear tinham que brigar para andar de mãos dadas com os pais. Eram quatro mãos concorridas a tapas pelos irmãos. Um filho circulava solto, esperando sua vez de ser chamado para o contato.
E a mãe oferecia, então, a mão invisível do grito:
− Anda mais rápido!
Ela espichava o olhar para não extraviar uma das crias da ninhada. Fabrício imagina o quanto sofriam os pais quando os levavam para a rua, tendo que controlar as brincadeiras e as frequentes distrações. Os filhos não facilitavam: mexiam em pedrinhas, em flores nos canteiros, paravam para colher frutas.
Os filhos que se mantinham pendurados no cabide dos braços não eram o problema. O medo se voltava para o avulso, o que andava próximo e perigosamente com independência, por absoluta falta de mãos.
Fabrício se sentia o filho menos querido quando terminava sendo o escolhido para perambular sozinho. Nem queria a mãozinha do irmão, o que, para ele, equiparava-se a uma esmola. Não admitia compaixão: desejava tudo ou nada. Os filhos disputavam a atenção dos pais como quem trava um duelo de garfos pelo último bolinho de chuva na bandeja.
Hoje os pais de Fabrício, velhos, já separados e morando cada um em seu apartamento, estão com as mãos disponíveis. Os irmãos esqueceram a concorrência do passado. Talvez tenham que reparar, como Fabrício faz agora, que a dinâmica familiar se inverteu. Eles é que precisam de nós, não mais nós, deles.
Fabrício sabe que é ele quem deve levar os pais para passear. E ele sabe que ninguém ficará de fora, porque possui exatamente um par de mãos para não deixar nenhum deles sozinho neste mundo de fragilidades.
(Fabrício Carpinejar. Cuide de seus pais antes que seja tarde. 5ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand, 2018. Adaptado)