- ID
- 5256637
- Banca
- CESPE / CEBRASPE
- Órgão
- PM-TO
- Ano
- 2021
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Texto 1A1-I
Apenas dez anos atrás, ainda havia em Nova York (onde
moro) muitos espaços públicos mantidos coletivamente nos quais
cidadãos demonstravam respeito pela comunidade ao poupá-la
das suas intimidades banais. Há dez anos, o mundo não havia
sido totalmente conquistado por essas pessoas que não param de
tagarelar no celular. Telefones móveis ainda eram usados como
sinal de ostentação ou para macaquear gente afluente. Afinal, a
Nova York do final dos anos 90 do século passado testemunhava
a transição inconsútil da cultura da nicotina para a cultura do
celular. Num dia, o volume no bolso da camisa era o maço de
cigarros; no dia seguinte, era um celular. Num dia, a garota
bonitinha, vulnerável e desacompanhada ocupava as mãos, a
boca e a atenção com um cigarro; no dia seguinte, ela as ocupava
com uma conversa importante com uma pessoa que não era você.
Num dia, viajantes acendiam o isqueiro assim que saíam do
avião; no dia seguinte, eles logo acionavam o celular. O custo de
um maço de cigarros por dia se transformou em contas mensais
de centenas de dólares na operadora. A poluição atmosférica se
transformou em poluição sonora. Embora o motivo da irritação
tivesse mudado de uma hora para outra, o sofrimento da maioria
contida, provocado por uma minoria compulsiva em restaurantes,
aeroportos e outros espaços públicos, continuou estranhamente
constante. Em 1998, não muito tempo depois que deixei de
fumar, observava, sentado no metrô, as pessoas abrindo e
fechando nervosamente seus celulares, mordiscando as
anteninhas. Ou apenas os segurando como se fossem a mão de
uma mãe, e eu quase sentia pena delas. Para mim, era difícil
prever até onde chegaria essa tendência: Nova York queria
verdadeiramente se tornar uma cidade de viciados em celulares
deslizando pelas calçadas sob desagradáveis nuvenzinhas de vida
privada, ou de alguma maneira iria prevalecer a noção de que
deveria haver um pouco de autocontrole em público?
Jonathan Franzen. Como ficar sozinho. São Paulo:
Companhia das Letras, 2012, p. 17-18 (com adaptações).
O autor do texto 1A1-I considera que