Leia um trecho do conto “Moto de mulher”, de Jarid Arraes,
para responder à questão.
Comprei uma Honda que tava na promoção e saí da loja
dirigindo. Feliz demais, me sentindo que nem uma passarinha em cima da moto. O vento vem direto na cara, até arde o
olho, mas é um sentimento gostoso de quase voar.
Primeiro eu vesti o colete de mototáxi que guardei por
três meses enquanto esperava a oportunidade da moto. Saí
pilotando pelo bairro, não andei nem três quarteirões e uma
mulher fez sinal com a mão.
Para aí, mototáxi.
Parei e ela me olhou assustada quando chegou perto.
Oxe, e é mulher, é?
Eu dei um sorrisinho meio troncho. Disse que pois é. Ela
montou na garupa e falou que pelo menos ficava mais à vontade pra segurar na minha cintura. Não segurava na cintura
de mototáxi homem que era pra não dar liberdade. Eu disse
que pois é de novo.
Fui deixar essa mulher tão longe que eu nem sabia onde
era aquilo. Ela foi me ensinando. Parecia que não ia chegar
nunca. O sol rachando.
Quando a gente chegou lá, na frente de uma casa de
taipa toda se desmontando, ela perguntou quanto tinha dado
a corrida. Eu fiquei pensando por um tempo e ela me olhando
impaciente, mas eu tava juntando a cara pra falar que era dez
reais. Achando que ela ia reclamar do preço, falei oito, mas
ela me entregou o dinheiro e sumiu pra dentro da casa.
Fiquei tomando coragem pra voltar. Não sabia voltar, na
verdade. Fiquei olhando pra todo lado, o celular quase sem
sinal. Longe demais, longe de um jeito que nem dez conto
pagava. O resumo era, então, a minha burrice. Otária demais,
só oito reais. Dirigindo na chinelada, com medo de qualquer
cara de macho que aparecia nas calçadas. Eu só achava que
iam me roubar. Imagina se levam minha moto zerada…
Fiquei nessa angústia, duas horas perdida. Até que avistei a estrada de volta pra Matriz. Depois, comecei a reconhecer melhor as casinhas, as cercas, as placas. Entrei de
novo na cidade com a maior alegria. Mais feliz do que quando
peguei a moto pela primeira vez.
(Redemoinho em dia quente. Alfaguara, 2019. Adaptado)
Considerando que a linguagem do texto nem sempre
segue o padrão normativo, pode-se concluir corretamente que uma das intenções do uso desse recurso é