A
questão narra a história de Joana, que faleceu deixando dois filhos, Gabriel e
Vítor. O patrimônio por ela deixado compreende apenas um imóvel, no qual
residia apenas com o filho Vítor.
Gabriel
busca, então, compreender quais seus direitos em relação ao imóvel.
Pois
bem, convém lembrar, em primeiro lugar que ambos, Gabriel e Vítor, são
herdeiros necessários de Joana (art. 1.845).
Assim
sendo, por força do art. 1.829 do Código Civil, são os primeiros na ordem de
vocação hereditária.
Como
o enunciado não evidencia a existência de outros herdeiros, a herança será totalmente
destinada a eles.
Nesse
sentido, é importante destacar que, conforme dicção do art. 1.784, que consagra
na nossa legislação o princípio da saisine, com a abertura da sucessão
(evento morte), a posse de todo o patrimônio é, desde já, transmitida aos herdeiros.
“Art.
1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros
legítimos e testamentários”.
O
papel do procedimento de inventário é a “arrecadação, descrição e avaliação dos
bens e outros direitos, discriminação e pagamento de dívidas, pagamento do
imposto de transmissão ‘mortis causa’ e demais atos e providências indispensáveis
à liquidação do acervo hereditário” (ROSA, Conrado Paulino da, RODRIGUES, Marco
Antonio. Inventário e Partilha. 2ª ed. Salvador: JusPodivm, 2020).
Ou
seja, o inventário serve para formalizar a transmissão da propriedade do
patrimônio, após cumpridas as exigências legais relacionadas ao imposto, às dívidas,
à avaliação dos bens, dentre outros; sendo certo que a posse, pela força da saisine
é transmitida aos herdeiros na abertura da sucessão (morte).
Sabendo
disso, deve-se assinalar a alternativa correta:
A)
Correta. Conforme visto, desde a morte, ambos os herdeiros passam a ser possuidores
do patrimônio, no caso, do único imóvel, logo, há composse entre eles, já que,
conforme art. 1.791:
“Art.
1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os
herdeiros.
Parágrafo
único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse
da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao
condomínio”.
Certo
é que, na composse, ambos podem exercer todos os atos possessórios:
“Art.
1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma
exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros
compossuidores”.
B)
Incorreta, pois, na ausência de oposição de Gabriel, Vítor é possuidor de
boa-fé, já que residia no imóvel junto com a mãe (art. 1.206), logo, tem
direito a ressarcimento pelas benfeitorias, nos seguintes termos:
“Art.
1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias
necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas,
a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o
direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis”.
C)
Incorreta, pois, conforme entendimento do STJ, é possível usucapião entre
herdeiros desde que presentes os demais requisitos da usucapião, dentre eles, a
posse mansa, sem oposição. Logo, somente se Gabriel não se opor ao exercício
exclusivo da posse por Vítor, pode ocorrer a usucapião.
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E
CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. PREQUESTIONAMENTO.
AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. HERDEIRA. IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA. POSSIBILIDADE DE
USUCAPIÃO POR CONDÔMINO SE HOUVER POSSE EXCLUSIVA. 1. Ação ajuizada 16/12/2011.
Recurso especial concluso ao gabinete em 26/08/2016. Julgamento: CPC/73. 2. O
propósito recursal é definir acerca da possibilidade de usucapião de imóvel
objeto de herança, ocupado exclusivamente por um dos herdeiros. 3. A ausência
de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o
conhecimento do recurso especial. 4. Aberta a sucessão, a herança transmite-se,
desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.784 do CC/02). 5.
A partir dessa transmissão, cria-se um condomínio pro indiviso sobre o acervo
hereditário, regendo-se o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e
posse da herança, pelas normas relativas ao condomínio, como mesmo disposto no
art. 1.791, parágrafo único, do CC/02. 6. O condômino tem legitimidade para
usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde
que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido
exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em
lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários. 7. Sob essa ótica,
tem-se, assim, que é possível à recorrente pleitear a declaração da prescrição
aquisitiva em desfavor de seu irmão – o outro herdeiro/condômino –, desde que,
obviamente, observados os requisitos para a configuração da usucapião
extraordinária, previstos no art. 1.238 do CC/02, quais sejam, lapso temporal
de 15 (quinze) anos cumulado com a posse exclusiva, ininterrupta e sem oposição
do bem. 8. A presente ação de usucapião ajuizada pela recorrente não deveria
ter sido extinta, sem resolução do mérito, devendo os autos retornar à origem a
fim de que a esta seja conferida a necessária dilação probatória para a
comprovação da exclusividade de sua posse, bem como dos demais requisitos da
usucapião extraordinária. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta
parte, provido” (RECURSO ESPECIAL Nº 1.631.859 – SP, Terceira Turma, Relatora
Ministra Nancy Andrighi, Julgado em 22/05/2018).
D)
Incorreta, pois como visto acima (na explicação da alternativa “A”), ambos os possuidores
podem exercer os atos possessórios.
E)
Incorreta, já que o entendimento do STJ é no sentido de que é possível o
arbitramento de aluguel neste caso (RECURSO ESPECIAL Nº 1.698.964 – RJ, Relator
Ministro Antonio Carlos Ferreira, Julgado em 23/02/2021).
Gabarito
do professor: alternativa “A”.