SóProvas


ID
5521489
Banca
CETAP
Órgão
Prefeitura de Maracanã - PA
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

É correto, sem advérbios.

A lição da menina negra, magérrima, que cantou feito rainha. 


    Eiza Soares estreou no programa de Ary Barroso na Rádio Tupi. Tinha 16 anos e era mãe. Sua cria estava doente e Elza inscreveu-se no show de Barroso porque os primeiros lugares ganhavam prêmios em dinheiro. Era uma chance de pagar o tratamento do filho. Elza subiu no palco, mulher negra, jovem, magérrima, vestida conforme o lugar que lhe cabia na perversa espiral de privilégios da nossa sociedade. Notavam-se os remendos no vestido. Os alfinetes. Ary Barroso ficou chocado com alguém que, para muitos, não merecia estar sob os holofotes. “O que é que você velo fazer aqui?” Ary recebeu Elza com boa dose da branquitude, classismo e machismo que inebriam a elite brasileira desde sempre. 

    Elza respondeu: “Eu vim cantar”. Ary seguiu a cantilena do opressor: “E quem disse que você sabe cantar?”. Amenina de 16 anos, cujo filho ardia em febre, respondeu com a coragem das mães: “Eu”. “De onde você veio, menina?" Ary não parecia se cansar de assinalar que Elza era uma estrangeira ali. Nesse momento, a menina respondeu com a audácia disruptiva que mora em cada nota do seu jazz de lata d'água na cabeça: “Eu vim do planeta fome”.  

    Em 1983, a respeitadíssima acadêmica indiana Gayatri Spivak escreveu Pode o Subalterno Falar? O ensaio, referência para quem deseja compreender a contribuição dos estudos pós-coloniais para as ciências humanas, fala do silenciamento sistemático do subalterno. Categoria nomeada por Gramsci, o subalterno é quem não pertence socialmente e politicamente às estruturas hegemônicas de poder. Os excluídos. Os triturados diariamente pela mecânica da discriminação. As Elzas e seus filhos febris. Spivak teorizou sobre o fato de não parecer natural ou adequado o subalterno falar. O silêncio é o que se espera dele,  

    Se o subalterno não deve falar, como poderia ousar cantar? Ary e sua plateia, que ria da humilhação de Elza, achavam que não, E hoje? Seria diferente? Mudamos pouco. Somos a mesma plateia rindo de novas humilhações que nos chegam pelas novas mídias, mas somos iguais. Esperamos do subalterno o silêncio. Zombamos do subalterno que ousa quebrar esse nosso contrato social. E não se enganem: a zombaria é o novo açoite. Mudamos pouco. Os ancestrais de Elza foram para o pelourinho. Elza foi ridicularizada ao vivo. Hoje, fingimos ter superado esse passado, mas as revistas lidas pelas madames saúdam a nova onda: uniformes de domésticas assinados por estilistas renomados. 

    Mudamos quase nada. 

    Naquele dia, Elza cantou Lama na Rádio Tupi. A subalterna cantou rainha, majestosa. Ary Barroso aplaudiu boquiaberto. A plateia que antes riu levantou-se. Reverenciou a nobreza da negra do planeta fome que ousou adentrar um espaço que lhe era negado e fez dele seu reino. Para quem ainda não entendeu: o politicamente correto é simplesmente isso. O correto. Algumas piadas a menos? Sim. Mas, em troca, hoje temos infinitos talentos antes silenciados embalando nossos sonhos. Só os que não sonham não veem que o resultado é positivo e deve ser comemorado. 


(Manoela Miklos. 25 de janelro, 2019, Revista VEJA). 


A figura de linguagem presente em "(...) a zombaria é o novo açoite.”. É a: 

Alternativas
Comentários
  • LETRA B

    A) Silepse é uma figura de construção ou sintática que trata da concordância que acontece não com o que está explícito na frase, mas com o que está mentalmente subentendido, com o que está oculto. Como em "a violenta São Paulo", em que a palavra violenta está no feminino por concordar com o termo oculto "a cidade de".

    B) Metafora é uma figura de linguagem que produz sentidos figurados por meio de comparações. Também é um recurso expressivo. Amor é fogo que arde sem se ver. — Vi sorrir o amor que tu me deste

    C) Sinestesia é o recurso estilístico no qual se utilizam palavras e expressões associadas às diferentes sensações percebidas pelo corpo humano (visão, audição, olfato, paladar e tato) para gerar um efeito discursivo. Vejamos alguns exemplos bem comuns: ... risada gostosa (audição + paladar) cheiro azedo (olfato + paladar)

    D) Zeugma  é uma figura de sintaxe caracterizada pela omissão de um termo no enunciado. No entanto, esse fenômeno está limitado à ocultação de um termo expresso anteriormente na frase: O bebê aprendeu a andar. E depois, a falar.

  • A questão é sobre figuras de linguagem e quer saber qual a figura de linguagem presente em "(...) a zombaria é o novo açoite.”. Vejamos:

     .

    A) silepse. 

    Errado.

    Silepse: ocorre esta figura quando efetuamos a concordância não com os termos expressos, mas com a ideia a eles associada em nossa mente.

    A silepse, ou concordância ideológica, pode ser:

    a) de gênero: Vossa Majestade será informado acerca de tudo. [Vossa Majestade = o rei]

    b) de número: "Corria gente de todos os lados, e gritavam."

    c) de pessoa: Ele e eu temos a mesma opinião. [ele e eu= nós]

     .

    B) metáfora. 

    Certo. Aqui há uma comparação entre a zombaria e o novo açoite.

    Metáfora: é o desvio da significação própria de uma palavra, nascido de uma comparação mental ou característica comum entre dois seres ou fatos.

    Ex.: "O pavão é um arco-íris de plumas."

    • Não confundir a metáfora com a comparação. Na comparação, os dois termos vêm expressos e unidos por nexos comparativos (como, tal, qual, assim como, etc.):

    Nero foi cruel como um monstro. (comparação)

    Nero foi um monstro. (metáfora)

     .

    C) sinestesia. 

    Errado.

    Sinestesia: é a transferência de percepções da esfera de um sentido para a de outro (tato, audição, olfato, paladar e visão), do que resulta uma fusão de impressões sensoriais de grande poder sugestivo.

    Ex.: Sua voz doce e aveludada era uma carícia em meus ouvidos.

    [voz: sensação auditiva; doce: sensação gustativa; aveludada: sensação tátil]

     .

    D) zeugma. 

    Errado.

    Elipse: é a omissão de um termo ou oração que facilmente podemos subentender no contexto. É uma espécie de economia de palavras. Quando omitem-se termos anteriormente expressos na frase, essa modalidade de elipse tem o nome de zeugma.

    Ex.: Ficamos ansiosos com o resultado. (elipse do pronome "nós")

    "Eles tremiam por si; eu pela sorte da Espanha." [zeugma do verbo "tremer": eu tremia... ]

     .

    Referência: CEGALLA, Domingos Pascoal. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, 48.ª edição, São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2008.

     .

    Gabarito: Letra B

  • açoite

    substantivo masculino

    1. 1.
    2. instrumento de tiras de couro que serve para castigar; azorrague, chicote, látego.
    1. 2.
    2. POR METONÍMIA
    3. golpe aplicado com chicote, vara etc.

    GAB: B