SóProvas


ID
5521498
Banca
CETAP
Órgão
Prefeitura de Maracanã - PA
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

É correto, sem advérbios.

A lição da menina negra, magérrima, que cantou feito rainha. 


    Eiza Soares estreou no programa de Ary Barroso na Rádio Tupi. Tinha 16 anos e era mãe. Sua cria estava doente e Elza inscreveu-se no show de Barroso porque os primeiros lugares ganhavam prêmios em dinheiro. Era uma chance de pagar o tratamento do filho. Elza subiu no palco, mulher negra, jovem, magérrima, vestida conforme o lugar que lhe cabia na perversa espiral de privilégios da nossa sociedade. Notavam-se os remendos no vestido. Os alfinetes. Ary Barroso ficou chocado com alguém que, para muitos, não merecia estar sob os holofotes. “O que é que você velo fazer aqui?” Ary recebeu Elza com boa dose da branquitude, classismo e machismo que inebriam a elite brasileira desde sempre. 

    Elza respondeu: “Eu vim cantar”. Ary seguiu a cantilena do opressor: “E quem disse que você sabe cantar?”. Amenina de 16 anos, cujo filho ardia em febre, respondeu com a coragem das mães: “Eu”. “De onde você veio, menina?" Ary não parecia se cansar de assinalar que Elza era uma estrangeira ali. Nesse momento, a menina respondeu com a audácia disruptiva que mora em cada nota do seu jazz de lata d'água na cabeça: “Eu vim do planeta fome”.  

    Em 1983, a respeitadíssima acadêmica indiana Gayatri Spivak escreveu Pode o Subalterno Falar? O ensaio, referência para quem deseja compreender a contribuição dos estudos pós-coloniais para as ciências humanas, fala do silenciamento sistemático do subalterno. Categoria nomeada por Gramsci, o subalterno é quem não pertence socialmente e politicamente às estruturas hegemônicas de poder. Os excluídos. Os triturados diariamente pela mecânica da discriminação. As Elzas e seus filhos febris. Spivak teorizou sobre o fato de não parecer natural ou adequado o subalterno falar. O silêncio é o que se espera dele,  

    Se o subalterno não deve falar, como poderia ousar cantar? Ary e sua plateia, que ria da humilhação de Elza, achavam que não, E hoje? Seria diferente? Mudamos pouco. Somos a mesma plateia rindo de novas humilhações que nos chegam pelas novas mídias, mas somos iguais. Esperamos do subalterno o silêncio. Zombamos do subalterno que ousa quebrar esse nosso contrato social. E não se enganem: a zombaria é o novo açoite. Mudamos pouco. Os ancestrais de Elza foram para o pelourinho. Elza foi ridicularizada ao vivo. Hoje, fingimos ter superado esse passado, mas as revistas lidas pelas madames saúdam a nova onda: uniformes de domésticas assinados por estilistas renomados. 

    Mudamos quase nada. 

    Naquele dia, Elza cantou Lama na Rádio Tupi. A subalterna cantou rainha, majestosa. Ary Barroso aplaudiu boquiaberto. A plateia que antes riu levantou-se. Reverenciou a nobreza da negra do planeta fome que ousou adentrar um espaço que lhe era negado e fez dele seu reino. Para quem ainda não entendeu: o politicamente correto é simplesmente isso. O correto. Algumas piadas a menos? Sim. Mas, em troca, hoje temos infinitos talentos antes silenciados embalando nossos sonhos. Só os que não sonham não veem que o resultado é positivo e deve ser comemorado. 


(Manoela Miklos. 25 de janelro, 2019, Revista VEJA). 


O verbo quebrar é polissêmico. Assinale a alterativa que identifica o sentido na frase: “Zombamos do subalterno que ousa quebrar esse nosso contrato social”. 

Alternativas
Comentários
  • A questão é de semântica e quer que marquemos a alterativa que identifica o sentido do verbo "quebrar" na frase: “Zombamos do subalterno que ousa quebrar esse nosso contrato social”. Vejamos:

     .

    Quebrar: fazer ficar ou ficar em pedaços; despedaçar(-se), romper(-se).

     .

    A) falência.

    Errado.

    Falência: perda das condições de continuidade dos negócios de empresa ou pessoa por falta de dinheiro para pagar os credores; quebra.

     .

    B) parada. 

    Errado.

    Parada: ação de interromper algo; interrupção; pausa.

     .

    C) fragmentar.

    Errado. Aqui não há que se falar em "quebrar em fragmentos" o contrato social, mas, sim, em "romper" o contrato social.

    Fragmentar: quebrar(-se) em fragmentos, em pedaços ou em partículas.

      .

    D) romper. 

    Certo. "Quebrar", nesse caso, está sendo usado no sentido de "romper" o contrato social.

    Romper: dividir(-se) em partes; separar(-se) em pedaços; partir(-se); quebrar(-se).

     .

    Referência: AULETE, Caldas. Dicionário Aulete Digital, acessado em 10 de novembro de 2021.

     .

    Gabarito: Letra D