Texto I
O trecho abaixo é o início do romance Capitu,
Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho.
Considere-o para responder à questão.
Só agora, decorrido tanto tempo humano, posso,
finalmente, contestar as acusações contra mim feitas
pelo meu ex-marido, Dr. Bento Santiago. E fazê-lo,
porque, nestas paragens que ora habito, aprendi, com
meu irmão Brás Cubas, as artes da narrativa alémtumular. Ficamos amigos, ele, eu e o senhor Quincas
Borba, o filósofo, um homem extraordinário, não tão
louco como alguns pensam e escreveram. Afinal, somos
criaturas da mesma pessoa, diante de quem, confesso,
fico dividida, talvez por força da ambiguidade do seu
texto: ao mesmo tempo que o admiro, há um lado meu
que o rejeita. Ele é o grande responsável por tudo o que
me aconteceu. Devo-lhe minhas tristezas, minhas
alegrias; devo-lhe a fama que, modéstia à parte, acabei
granjeando. Mas a ele coube também a construção da
imagem negativa que me foi atribuída. A ele e, a bem da
verdade, a uns tantos críticos de nomeada que se
debruçaram sobre minha história; alguns dentre eles me
tiveram por frívola, outros felizmente, nunca aceitaram a
palavra do filho de D. Glória. Sou-lhes grata, ao fim e ao
cabo, do fundo do meu coração.
Neste lugar de além-túmulo todos temos de assumir
uma missão. A mim me foi dado trabalhar na direção da
afirmação do discurso da mulher. Confesso-lhes que
fiquei surpresa, quando fui notificada da incumbência.
Por que eu? Disseram-me que era por força dos altos
desígnios e da minha personalidade forte. Aceitei.
Curiosamente, tive como companheira e leitora de fé, a
Aurélia, Aurélia Camargo, que eu não conhecia e por
quem logo me afeiçoei, uma mulher de rara distinção e
encanto! Ela também teve problemas, antes e depois do
casamento. Com um certo Seixas. Sua história, como a
minha, também foi contada, ainda que apenas em parte,
segundo seu próprio testemunho. Por um senhor chamado José de Alencar. Só que carregada de
concessões, ela até que tentou afirmar-se, mas os
tempos eram outros. “-Tive que ceder, minha amiga;
Deus sabe o quanto me custou”. Estimulada por ela, eu,
Capitu, decidi escrever sobre o outro lado da minha
história. Sob o manto diáfano da fantasia, afinal a melhor
forma de chegar à verdade profunda da humana
condição. [...]
Considere a passagem “Mas a ele coube
também a construção da imagem negativa que
me foi atribuída” (1º§). Um dos desafios para o
professor de Língua Portuguesa é lidar com a
possível confusão dos alunos, oriunda das
classificações gramaticais. Uma possibilidade
de problematizar a distinção morfológica dos
termos em destaque reside na: