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ID
606892
Banca
VUNESP
Órgão
MPE-SP
Ano
2008
Provas
Disciplina
Direito Civil
Assuntos

Leia atentamente as seguintes assertivas sobre os direitos da personalidade.
I. O direito à intimidade é inalienável, irrenunciável e relativamente disponível.
II. O suicídio constitui um ato ilícito, embora sem natureza criminal.
III. A criança e o adolescente têm direito à tutela de imagem e intimidade, sendo, por isso, vedada a divulgação de atos infracionais que permitam a sua identificação.
IV. A circunstância de se encontrar o funcionário público no exercício de suas funções, e não em conversa ou atividade particular, afasta a incidência das normas de proteção à vida privada, com relação à divulgação da sua imagem.
Assinale a alternativa correta.

Alternativas
Comentários
  • Questão complicada. Seguem comentários do site do LFG sobre a questão:

    http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20100204140017268&mode=print

    Diferentemente do Código Civil de 1916, de cunho extramente patrimonialista, o Código Civil de 2002 valorizou de maneira considerável a pessoa, dando enfoque aos direitos da personalidade, pelo quê valorizou, consequentemente, os direitos fundamentais. Neste sentido, veja-se o consagrado na IV Jornada de Direito Civil:

     

    274 – Art. 11. Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.

    Nas lições de Cristiano Chaves, toda pessoa tem personalidade jurídica, portanto dispõe de direitos da personalidade. Os direitos da personalidade ligam-se a relações existenciais, como a honra, por exemplo.

    Há duas correntes que tentam justificar a existência dos direitos da personalidade: a jusnaturalista, de acordo com a qual, os direitos da personalidade são inatos à condição humana; e a positivista que prega serem os direitos da personalidade ditados pelo direito e não por uma ordem pré-concebida; para estes, seriam fenômenos culturais. A primeira tese, no Brasil, é defendida por Maria Helena Diniz e Pablo Stolze, sendo a de maior aceitação.

    Feita esta breve introdução, passemos à análise das assertivas propostas pela questão.

    ASSERTIVA I

    Como dissemos, não há um rol exaustivo a elucidar todos os direitos da personalidade, contudo, é cediço que a intimidade está incluída neste conceito. Dessa forma, resta saber se a inalienabilidade e a irrenunciabilidade são características dos direitos da personalidade. Para tanto, vejamos a redação do artigo 11, do CC:

     

    Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

    Vale dizer, a intransmissibilidade e irrenunciabilidade são espécies do gênero indisponível. Portanto, os direitos da personalidade são indisponíveis, mas de acordo com a própria redação do artigo 11, denota-se que essa regra admite algumas exceções, nos casos previstos em lei. Logo, é possível se afirmar que os direitos da personalidade são relativamente indisponíveis, ou como a assertiva propõe: relativamente disponíveis. Veja-se, como exemplo da disponibilidade dos direitos da personalidade a doação de órgãos.

    A assertiva I está correta.




     

  • Continuando:

    ASSERTIVA II

    Como se sabe, o ato ilícito é constituído de dois elementos básicos a ação humana e o consequente prejuízo que ele acarreta, podendo sê-lo de ordem moral ou material. Acrescente-se que essa ação humana deve ser contrária ao direito, ou seja, o ato ilícito é ato contrário ao ordenamento que pode dar ensejo, dentre outros, à responsabilidade civil.

    Pois bem. Por todo o explanado, é perfeitamente possível concluir-se que a vida é direito da personalidade, sendo certo também que a própria Constituição assegura a sua inviolabilidade (Art. 5º, caput). Portanto, ao fazer uma interpretação conjunta de todo o ordenamento pátrio, é certo que aquele que tira sua própria vida comete um ato ilícito, pois o sistema como um todo veda essa prática.

    Embora o suicídio não tenha natureza de ilícito penal, é possível falar-se em consequências civis. Veja-se a título de exemplo, o disposto no artigo 798, do CC:

     

    Art. 798. O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.

    Trata-se de assertiva correta.

    ASSERTIVA III

     

    Art. 3º, ECA: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

    De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a criança e o adolescente são sujeitos de direito, logo a eles se estendem toda a tutela dos direitos da personalidade, sendo correto afirmar que, em razão da tutela à imagem e intimidade, veda-se a divulgação de atos infracionais que permitam sua identificação.

     

    Art. 206. A criança ou o adolescente, seus pais ou responsável, e qualquer pessoa que tenha legítimo interesse na solução da lide poderão intervir nos procedimentos de que trata esta Lei, através de advogado, o qual será intimado para todos os atos, pessoalmente ou por publicação oficial, respeitado o segredo de justiça.

    A assertiva está correta.

  • Por fim:

    ASSERTIVA IV

    É certo que determinadas pessoas, em razão da função de desempenham têm uma exposição maior de sua imagem. Nessas hipóteses, não há que se falar em perda dos direitos da personalidade, mas em relativização da sua proteção. Assim sendo, é correto dizer que o funcionário público (em razão do próprio princípio da impessoalidade que rege a Administração Pública, exigindo transparência na prestação do serviço público), no exercício de suas funções, tem afastada as normas de proteção da vida privada.

    Veja-se, assim, que todas as assertivas da questão estão corretas, portanto, a alternativa correta é a letra D.


  • O colega se enganou na assertiva, já que se todas estão certas é a letra E, e não a D.
    Valeu pelos comentários.
  • Assertiva interessante essa IV. Fui atrás da posição da jurisprudência, e o STJ já assim decidiu:

     RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CONCUSSÃO. GRAVAÇÃO DE CONVERSA PELO INTERLOCUTOR. PROVA. VALIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUA ATIVIDADE. DESRESPEITO À INTIMIDADE INEXISTENTE.
    1. A uníssona jurisprudência desta Corte, em perfeita consonância com a do Pretório Excelso, firmou o entendimento de que a gravação efetuada pela vítima dos fatos, em tese, criminosos, é prova lícita, que pode servir de elemento probatório para a notitia criminis e para a persecução criminal.
    2. Ademais, trata-se de gravação de funcionários públicos no exercício de sua função pública, e não de conversa particular ou sigilosa, o que afasta a incidência do art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, que garante a intimidade da vida privada.
    3. Recurso desprovido.
    (STJ - RHC 14672 / RJ - Ministra LAURITA VAZ - QUINTA TURMA - DJ 29/08/2005)

    Apesar de que sempre achei as decisões da Laurita Vaz sem qualquer garantismo. Mera opinião deste humilde concurseiro.
  • Andr~e, obrigada pelas explicacoes tao completas!!!
  • Só fazendo um pequeno comentário complementando os excelentes aqui colocados...
    quanto a assertiva II, o suicídio não tem natureza criminal em virtude do princípio da Lesividade, que proibi a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor, não obstante constituir ato ilícito.
  • Uma questão a ser levantada sobre a afirmativa III: TODOS, não só a criança e o adolescente, têm direito à tutela de imagem e intimidade. Logo, não é só por isso que resta vedada a divulgação de atos infracionais que permitam sua identificação.

    O que os colegas acham disso?
  • Entendo que a assetiva nº III está correta em razão do disposto no artigo 247 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê como infrações administrativas as seguintes condutas:

    Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional:

    Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

    § 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou parcialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente.

  • "Afastar"  achei muito exagerado. Imagino que o fato de ser Funcionário Público, apenas "diminui"...

  • Lu, acho que a imagem da criança e do adolescente é protegida de forma mais intensa do que a dos adultos. Veja, o processo judicial, em regra, é público (art. 93, IX, CF), então é lícito identificar os autores de crimes. Nesse caso, o resguardo de sua intimidade prejudicaria o "interesse público à informação" (art. 93, IX, CF). Então, a intimidade fica circunstancialmente em segundo plano na ponderação dos valores. Já no caso da criança e do adolescente, o processo judicial corre em segredo de justiça justamente para resguardar de modo integral a personalidade dos menores. 

  • O suicidio não tem natureza criminal porque é ato subjetivo do agente deste que não venha a causar danos a terceiros! 

  • Há inúmeros problemas e exceções nessa IV, começando com situações de infiltração e afins

    Abraços

  • Gab. E

     

    Sobre a IV: Na verdade, há uma relativização das normas de proteção à vida privada... mas a banca considerou como certa!

  • Esse item IV tem um esforço muito grande para ser considerado correto

  • É forçar demais o inciso IV como correto, pois não há como afastar a proteção de sua vida privada, mas somente relativizar. Complicado a banca tê-lo como correto.

  • Eu sempre me digo: pare de fazer questões de 10,15 anos atrás. Ta aí. Essa alternativa IV JAMAIS seria considerada correta hoje.

  • Todas as afirmativas estão corretas.

    Item IV: O agente público, enquanto no exercício de suas funções, não pode invocar o direito à vida privada para impedir que sejam divulgadas imagens ou falas suas. A partir do momento em que ele aceita o cargo ou emprego público ele renuncia a essa proteção, RELATIVAMENTE àquelas situações em que está atuando em razão do cargo ou emprego público. Por isso se diz que alguns direitos da personalidade são relativos, pois RELATIVAMENTE a determinadas situações eles podem sim ser afastados. RELATIVIZAR é justamente AFASTAR a proteção em situações específicas, como a do item IV, na qual o interesse público se sobrepõe ao direito individual de proteção à vida privada.

  • fico me perguntando: como foi que o Ministro Gilmar Mendes conseguiu uma indenização de 30 mil reais da atriz Mônica Iozzi, em razão do post que a atriz fez, que segundo ele, teria atingido sua imagem e honra.

    Enfim, com essa alternativa IV da VUNESP eu nem sei como marcar as demais alternativas em provas futuras que tratem do mesmo tema.

  • Nesse item IV, caso a pessoa responda com a mente "constitucional" certamente errará a questão. No campo do direito Civil está corretíssima. Neste sentido, o PARECER n. 00383/2020/PROCGERAL/PFUFRJ/PGF/AGU

    Quanto à imagem, a lei a protege de violação. Mas, repise-se, gravar a aula de um professor servidor público para apresentá-la aos destinatários do seu serviço público (discentes) não viola a sua imagem, que, diga-se, já é vinculada a essa atividade.

    28. O que a lei protege é o mau uso, que lhe cause dano material ou moral. Disponibilizar as aulas gravadas aos alunos para assistirem de maneira assíncrona não causa dano material ou moral ao professor. Eventual mal uso deverá gerar a responsabilização de quem o fizer.

    29. Porém, esse risco não tem o condão de impedir a implementação da política pública. Risco esse, diga-se, também presente em sala de aula, uma vez que não faltam equipamentos capazes de captar a imagem e o som dos professores no exercício de sua atividade, com ou sem o seu conhecimento.

    30. Assim, divulgar as aulas gravadas para uso no processo pedagógico de ensino, ou no interesse da pesquisa ou da extensão não consiste em irregularidade ou violação da imagem do professor, e independe de autorização expressa deste, posto que passou a fazer parte de suas funções com a mudança da regulamentação interna introduzida pela resolução aprovada nesse sentido.

    31. Por outro lado, qualquer divulgação fora desse contexto, que não esteja diretamente vinculada a função de professor de ensino superior, depende de autorização deste, eis que desamparada pela Resolução aprovada pelo colegiado competente ou desvinculada da função pública do professor. Sujeitando o responsável à punição nas esferas cível, penal e administrativa, a depender do caso, e nos termos da resposta ao próximo quesito. 

  • Apenas um comentário...

    Tudo bem que essa questão foi objeto de prova em 2008. Mas eu pensei o seguinte:

    Será mesmo que o direito à intimidade é inalienável?

    O fato é que apenas nos dias atuais, direitos que antes não eram sequer objeto de discussão, estão sendo colocados em pauta e sendo alvo de proteção, até mesmo pelo ativismo judicial, em face da inércia do Poder Legislativo.

    Há pessoas que alienam a sua intimidade como uma forma de trabalho, digna da mesma forma como qualquer outro ofício. E isso não é nada novo!

    O novo é que as redes sociais, a mundialização, a globalização e a tecnologia, proporcionam com mais efetividade esse tipo de labor.

    Essas pessoas ganham o seu sustento com a imagem dos seus corpos e com uso deles.

    Será mesmo que a intimidade é inalienável? Fica a reflexão!

  • pensei que a I estivesse errada...