SóProvas


ID
952750
Banca
FCC
Órgão
DPE-RS
Ano
2013
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Atenção: As questões de números 1 a 8 referem-se ao texto seguinte.  


Vista cansada


      Acho que foi Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Essa ideia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que Hemingway tenha acabado como acabou. Fugiu enquanto pôde do desespero que o roía − e daquele tiro brutal que acabou dando em si mesmo.
      Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
      Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou trinta e dois anos a fio pelo mesmo hall do prédio de seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer. Como era ele? Sua cara? Sua voz? Não fazia a mínima ideia. Em trinta e dois anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer.
      O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos. Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz dever pela primeira vez o que, de tão visto, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia a dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.


(Otto Lara Resende, Bom dia para nascer)



Estão plenamente respeitadas as normas de concordância verbal na frase:

Alternativas
Comentários
  • Na ordem direta ficaria assim  :  As palavras  de que se valeu o autor  para mostrar que somente a notícia da morte do porteiro fez alguns notarem que ele havia existido.

    ou seja  ,  as palavras guardam ironia.

    Jah bless ours way.

    Bob     marley.
  • a) Devem-se emprestar a todas as coisas, nas palavras de Hemingway, o olhar daquele que as vê pela derradeira vez, como se delas se despedissem.
    O olhar(sujeito) deve ser emprestado. Cuidado o colega se equivocou, não há sujeito indeterminado.


    O desespero das tantas dores que podem afligir certos homens levam alguns desses infelizes ao suicídio, é o que parece explicar a triste e brutal decisão de Hemingway.
    O desespero leva.

    d) Sempre haverá o marido e o pai que não tem olhos para ver, de fato, quem são sua esposa e seu filho, quem de fato são esses a quem não rende(m) momentos de atenção.
    Momentos de atenção rendem. Não há outros erros nessa alternativa, não se enganem.

    A criança, tal como ocorre com os poetas, são é capazes de olhar as coisas com tão dedicada atenção que acabam por estabelecer uma visão efetivamente criativa de tudo.
    A criança é capaz ... que acaba.



  • Dúvida: Na alternativa D, "o marido e o pai" seriam dois núcleos do sujeito, o que levaria a flexionar o verbo "ter" para têm?
  • Laélio.

    d) Sempre haverá o marido e o pai que não tem olhos para ver, de fato, quem são sua esposa e seu filho, quem de fato são esses a quem não rende(m) momentos de atenção.
    Momentos de atenção rendem.    Não há outros erros nessa alternativa, não se enganem.

    Visto que, no contexto, marido e pai podem ser expressões sinônimas; não há a obrigação de flexionar o verbo.
    Cuidado!!!!



    Quando o sujeito composto for formado por núcleos sinônimos ou quase sinônimos, o verbo poderá ficar no plural ou no singular:

    Alegria e felicidade marca / marcam seu comportamento.

  • Compartilho com a opinião do professor Pestana (do site http://www.euvoupassar.com.br e do http://www.estrategiaconcursos.com.br), e com diversos colegas concurseiros do site http://www.forumconcurseiros.com que esta questão deveria ser anulada por ter 2 opções corretas: a c) e a d). 
    No item d) "Sempre haverá o marido e o pai que não tem olhos para ver, de fato, quem são sua esposa e seu filho, quem de fato são esses a quem não rende momentos de atenção", o sujeito composto "pai e marido" representam uma mesma pessoa e assim sendo leva os verbos ter e render para o singular. Observemos que, neste item d), o verbo "render" tem o significado de "dar" e é transitivo direto: ...o marido e o pai ... não rende momentos de atenção (a) sua esposa e seu filho. "O marido e o pai" é o sujeito e momentos de atenção é o objeto direto.

    professor Domingos P. Cegalla nos ensina que para núcleos de sujeito que designam a mesma pessoa ou coisa, o verbo concorda no singular. Exemplos: 1) "Aleluia! O brasileiro comum, o homem do povo, o joão-ninguém, agora é cédula de Cr$500,00!" (Carlos Drummond de Andrade); 2) Advogado e membro da instituição afirma que ela é corruptaCom o mestre Cegalla, concordam o profº Celso Cunha: "Quando os sujeitos, por palavras diferentes, representam uma pessoa ou uma só coisa, o verbo fica naturalmente no singular", e também o profº Napeleão Mendes de Almeida: "Quando o sujeito composto é constituído de palavras sinônimas ou tomadas como um todo, o verbo fica no singular, pois o sujeito é aparentemente composto".
  • Dúvida:

    Na alternativa b), o verbo levam não poderia concordar com tantas dores?
  • a. O verbo dever no sentido de existir, é impessoal; sendo assim empregado na terceira pessoa do singular.

    b. O vebro levar concorda com desespero.

    c. certo

    d. o verbo ter concorda com sujeito no plural > têm

    e. A criança.. é capaz..
  • As explicações dos colegas são claras assim como os exemplos, porém discordo quanto à questão.

    [...] o marido e o pai que não têm ...

    O artigo definido antecede cada um dos núcleos, assim cumprindo seu papel conforme diz seu nome: definindo.

    Neste caso temos duas pessoas diferentes. O contrário seria se fosse "sempre haverá o marido e pai  que não tem olhos ..."

    A questão não é de interpretação, mas se levarmos à leitura do texto ... veremos que o marido e o pai são pessoas diferentes.


    Forte abraço.

  • Tiago, nesse caso não se trata de expressões partitivas ou sujeito coletivo + adjetivo no plural,casos que admitem dupla concordância. 

     "A maioria das crianças foi/foram ao parque." / "Uma multidão de pessoas fugiu/fugiram."

    Nesse caso o "das tantas dores" exerce função de complemento nominal de "O desespero", que é o sujeito.

  • na letra D

    o marido e o pai que não tem olhos para ver

    quem é que não têm olhos para ver?o marido e o pai
  • no gabarito que imprimi a resposta certa é d), houve algum recurso?

  • Acabei de assistir uma aula, em que o professor fala que nessa questão há duas alternativas corretas: C e D.

    Ele diz que a questão foi anulada, mas na vdd não foi.

  • Em A, o sujeito da locução passiva "Devem - se emprestar" é "o olhar", logo o verbo "dever" deveria ser conjugado no singular. Os verbos
    "ver" e "despedir" conjugam-se em conformidade com o referente "aquele", logo a forma correta da frase é:

     

    Deve-se emprestar a todas as coisas, nas palavras de Hemingway, o olhar daquele que as vê pela derradeira vez, como se delas se despedisse.

     

    Em B, o verbo "levar" concorda com o sujeito simples "o desespero", ficando no singular. A locução verbal "podem afligir" concorda com "dores", ficando no plural. A locução verbal "parece explicar" concorda com "decisão", ficando no singular. Logo, a forma correta da frase é:

     

    O desespero das tantas dores que podem afligir certos homens leva alguns desses infelizes ao suicídio, é o que parece explicar a triste e brutal decisão de Hemingway.

     

    Resposta correta - Letra C: Em C, estão plenamente respeitadas as normas de concordância verbal na frase. É, portanto, o gabarito
    da questão:

     

    "o autor se valeu das palavras"; "as palavras guardam", "a notícia da morte fez notar [...]" e "o porteiro havia existido".

     

    Em D, o verbo "haver" possui valor existencial, portanto é um verbo impessoal e deve se manter na 3ª pessoa do singular: "sempre haverá marido e pai". O verbo "ter" deve se manter no plural para concordar com "o marido e o pai": "[...] que não têm olhos [...]". Portanto, a forma correta da frase é:

     

    "Sempre haverá o marido e o pai que não têm olhos para ver, de fato, quem são sua esposa e seu filho, quem de fato são esses a quem não rendem momentos de atenção".


    Em E, "a criança" é sujeito simples, logo o verbo "ser" deve se manter no singular: "é capaz de olhar". O verbo "acabar" deve ser mantido no singular, para concordar com "criança". Então, a forma correta da frase é:

     

    A criança, tal como ocorre com os poetas, é capaz de olhar as coisas com tão dedicada atenção que acaba por estabelecer uma visão efetivamente criativa de tudo.

     

    Corrigido e comentado pela Prof. Flavia Rita.