Conforme comprovam as ementas abaixo colacionadas:
HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE CAPITAIS (ARTIGO 1º, § 4º, DA LEI 9.613/1998). PACIENTE ACUSADO TAMBÉM PELOS CRIMES ANTECEDENTES, PRATICADOS CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. POSTERIOR EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO NO QUE SE REFERE AOS REFERIDOS DELITOS. ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE SE PROVAR QUE O RÉU TERIA AUFERIDO RECURSOS PROVENIENTES DE ATIVIDADES ILÍCITAS. AUTONOMIA DO DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO. CRIMES ANTERIORES IMPUTADOS A VÁRIOS CORRÉUS. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE QUE O PACIENTE TINHA CONHECIMENTO DA ILICITUDE DOS VALORES E BENS CUJA ORIGEM E PROPRIEDADE FORAM OCULTADAS E DISSIMULADAS. ATIPICIDADE DA LAVAGEM DE DINHEIRO NÃO CARACTERIZADA. LEGALIDADE DA MANUTENÇÃO DA AÇÃO PENAL. ORDEM DENEGADA.
1. Da leitura do artigo 1º da Lei 9.613/1998, depreende-se que para que o delito de lavagem de capitais reste configurado, é necessário que o dinheiro, bens ou valores ocultados ou dissimulados sejam provenientes de algum dos ilícitos nele arrolados, ou seja, no tipo penal há expressa vinculação entre a lavagem de dinheiro a determinados crimes a ela anteriores.
2. Contudo, o artigo 2º, inciso II e § 1º, do mesmo diploma legal, dispõe que a apuração do delito em comento independe do "processo e julgamento dos crimes antecedentes", devendo a denúncia ser "instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime".
3. Desse modo, a simples existência de indícios da prática de algum dos crimes previstos no artigo 1º da Lei 9.613/1998 já autoriza a instauração de ação penal para apurar a ocorrência do delito de lavagem de dinheiro, não sendo necessária a prévia punição dos autores do ilícito antecedente. Doutrina. Precedentes.
4. No caso dos autos, na mesma denúncia imputou-se ao paciente e demais corréus tanto a prática dos delitos antecedentes à lavagem de capitais, quanto ela própria.
5. Contudo, o paciente teve extinta a sua punibilidade no que se refere aos crimes anteriores à lavagem, ante a prescrição da pretensão punitiva estatal, circunstância que, segundo os impetrantes, impediria o Ministério Público de provar que ele teria auferido recursos provenientes de atividades ilícitas.
6. Ocorre que os crimes contra o sistema financeiro nacional a partir dos quais teriam sido obtidos os bens, valores e direitos cuja origem e propriedade teria sido ocultada e dissimulada, não foram atribuídos apenas ao paciente, mas também aos demais sócios da offshore supostamente utilizada para a abertura e movimentação de diversas contas correntes no exterior.
7. Dessa forma, ainda que o órgão ministerial jamais possa provar que o paciente cometeu os delitos dispostos nos artigos 4º, 16, 21 e 22 da Lei 7.492/1986, o certo é que há indícios de que tais ilícitos teriam sido praticados pelos demais corréus, circunstância que evidencia a legalidade da manutenção da ação penal contra ele deflagrada para apurar o cometimento do crime de lavagem de capitais.
8. Aliás, se própria Lei 9.613/1998 permite a punição dos fatos nela previstos ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime antecedente, é evidente que a extinção da punibilidade pela prescrição de um dos coautores dos delitos acessórios ao de lavagem não tem o condão de inviabilizar a persecução penal no tocante a este último ilícito penal.
9. É dispensável a participação do acusado da lavagem de dinheiro nos crimes a ela antecedentes, sendo suficiente que ele tenha conhecimento da ilicitude dos valores, bens ou direitos cuja origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade tenha sido ocultada ou dissimulada. Precedentes.
10. Havendo indícios da prática de crimes contra o sistema financeiro nacional pelos corréus na ação penal em apreço, a partir dos quais teriam sido obtidos valores e bens cuja origem e propriedade teria sido ocultada e dissimulada pelo ora paciente, impossível reconhecer-se a atipicidade do delito de lavagem de dinheiro que lhe foi imputado e, por conseguinte, inviável o trancamento da ação penal contra ele deflagrada.
11. Ordem denegada.
(HC 207.936/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe 12/04/2012)
RECURSO ESPECIAL. CRIMES DE QUADRILHA, EVASÃO DE DIVISAS, LAVAGEM DE DINHEIRO E CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. VIOLAÇÃO A REGIMENTO INTERNO E RESOLUÇÕES. SÚMULA 399/STF. AFRONTA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO STF. TESES NÃO DEBATIDAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 211/STJ. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRETENSÃO DE GARANTIR A AUTORIDADE DE DECISÃO PROFERIDA PELO STF. IMPOSSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ART. 109, IV, DO CP. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 619 DO CPP. APLICAÇÃO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. ILEGALIDADE. COMPETÊNCIA. EXISTÊNCIA DE CONEXÃO. PREVALÊNCIA DO FORO FEDERAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. COLHEITA ANTECIPADA DE PROVAS. POSSIBILIDADE. ART. 156 DO CPP. JUNTADA DE DOCUMENTOS COMPLEMENTARES EM 2º GRAU. POSSIBILIDADE. ART. 231 DO CPC. DOSIMETRIA DA PENA. EXACERBADA MAJORAÇÃO DA PENA-BASE.
ILEGALIDADE. REDUÇÃO. APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA/7. PERDA DE BENS EM FAVOR DA UNIÃO.
ART. 7º, I, DA LEI 9.613/98.
1. Incabível, em recurso especial, analisar suposta afronta a atos normativos que não se enquadram no conceito de "tratado ou lei federal", disposto no art. 105, III, "a", da Constituição Federal, tais como resoluções e regimentos internos de tribunais (Súmula 399/STF).
2. Inviável o exame de afronta a dispositivos constitucionais em recurso especial, sob pena de usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal (art. 102, III, "a", da CF).
3. As teses não debatidas pelo Tribunal de origem, a despeito da oposição de embargos de declaração, atraem a incidência da Súmula 211/STJ.
4. Incide a Súmula 284 do STF nos pontos em que a deficiência da fundamentação recursal inviabiliza a exata compreensão da controvérsia.
5. O recurso especial não constitui o instrumento processual adequado a garantir a autoridade de decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
6. Transcorrido lapso superior a 8 (oito) anos desde a publicação da sentença condenatória, último marco interruptivo da prescrição, constata-se a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado para os delitos com pena estabelecida em até 4 (quatro) anos.
7. Apreciadas, fundamentadamente, de modo coerente e completo, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, inexiste violação ao art. 619 do CPP.
8. A aplicação da multa por litigância de má-fé, prevista no art. 538, parágrafo único do CPC, configura analogia in malam partem, vedada no direito penal.
9. Presente a conexão, aplica-se a prevalência do foro federal (Súmula nº 122/STJ).
10. Descrevendo a peça acusatória condutas aptas ao enquadramento nos crimes de quadrilha, sonegação fiscal, evasão de divisas e lavagem de dinheiro, com a especificação pormenorizada da ação de cada denunciado para os crimes imputados e a presença das elementares típicas, permitindo a plena defesa dos acusados, não se verifica inépcia da denúncia.
11. Não se configura parcialidade pela atuação judicial na colheita antecipada de provas, autorizada pelo art. 156 do CPP, na redação anterior à Lei n. 11.690/2008.
12. Nos termos do art. 231 do CPP, qualquer fase processual admite a juntada de documentos, garantido o pertinente contraditório, exceto quando a lei dispuser em sentido contrário.
13. Não há ilicitude na tradução oficial de documentos por representação diplomática oficial do Estado estrangeiro reconhecido pelo Brasil.
14. O legislador brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado, previsto no art. 155 do CPP, segundo o qual o magistrado formará a sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial.
15. "Se a sentença, dando provimento à pretensão condenatória, fundamenta-se por todos os elementos da imputação penal apresentada no início da lide, embora acrescida dos dados da instrução criminal, cumpre com os ditames do art. 381, III, do CPP, não sendo correto tê-la como incongruente ou mesmo desfundamentada" (REsp 751.215/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de 18/12/2009).
16. Presentes as elementares do tipo penal de formação de quadrilha, notadamente a existência de vínculo associativo estável e permanente entre os agentes, com o fito de delinquir, não há falar em violação ao art. 288 do CP.
17. O crime previsto no art. 1º da Lei n. 9.613/98, antes das alterações promovidas pela Lei n. 12.683/2012, previa que os recursos ilícitos submetidos ao branqueamento poderiam ter como fonte quaisquer dos crimes constantes de seus incisos I a VIII.
18. Por sua natureza de tipo penal misto alternativo, o crime de lavagem de dinheiro admite que os recursos ilícitos provenham direta ou indiretamente dos crimes prévios elencados nos incisos I a VIII do art. 1º da Lei n. 9.613/98, não havendo alteração de tipicidade penal na admissão de um, dois ou mais crimes prévios - desde que reconhecidos.
19. A ausência à época de descrição normativa do conceito de organização criminosa impede o reconhecimento dessa figura como antecedente da lavagem de dinheiro, em observância ao princípio da anterioridade legal, insculpido nos arts. 5º, XXXIX, da CF, e art.
1º do CP.
20. A exclusão da organização criminosa como antecedente da lavagem de capitais não acarreta a atipicidade da conduta, remanescendo o admitido delito antecedente do art. 3º, II, da Lei n. 8.137/90, admitido pelo inciso V do art. 1º da Lei n. 9.613/98.
21. O reconhecimento da extinção da punibilidade pela superveniência da prescrição da pretensão punitiva do Estado, relativamente ao crime funcional antecedente, não implica atipia ao delito de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/98), que, como delito autônomo, independe de persecução criminal ou condenação pelo crime antecedente.
22. Prosseguindo a ação criminosa já na vigência da Lei n. 9.613/98, tem-se a aplicação da nova lei incriminadora, incidindo os réus nas penas nela cominadas.
23. A primariedade e os bons antecedentes não são suficientes para que a pena-base seja fixada no mínimo legal, se militam desfavoravelmente circunstâncias judiciais negativas.
24. Admitindo situação fática semelhante aos condenados, a identidade de fundamentos na dosimetria não representa ofensa ao princípio da individualização da pena, mas sua econômica, porém compreensível, explicitação.
25. A existência de flagrante desproporcionalidade entre o agravamento da pena pelo crime de quadrilha, e a motivação apresentada, autoriza seu redimensionamento, isto por maioria sendo acolhido apenas em relação à recorrente Marlene Rozen.
26. A aplicação da atenuante prevista no art. 66 do CP implicaria revisão do conjunto fático-probatório, providência inadmissível na via eleita (Súmula 7/STJ).
27. Os fundamentos relativos aos motivos do crime, a cobiça, elementar do tipo penal de lavagem de dinheiro, e "a personalidade distorcida pela fraqueza de caráter", desprovida de considerações mais específicas e particularizadas de cada um dos corréus, não constituem fundamentos idôneos para a elevação da pena-base acima do mínimo legal.
28. Proporcionalmente reduzidas as penas dos condenados pelo crime de lavagem de dinheiro, sendo que, por maioria, reduziu-se a pena de Heraldo da Silva Braga em menor extensão do que a proposta pelo Relator.
29. As instâncias ordinárias, com base em vasto acervo probatório, determinaram a perda, em favor da União dos bens, direitos e valores relacionados ao delito de branqueamento de capitais, como consequência automática da sentença penal condenatória, a teor do art. 7º, I, da Lei 9.613/98, não cabendo a revisão das conclusões probatórias, na forma da Súmula 7/STJ.
30. Não possuindo a manifestação judicial caracterizada como despacho qualquer conteúdo decisório, incabível é a interposição de agravo regimental.
31. Prescrição de parcela dos crimes imputados, nos termos do voto.
32. Recursos especiais da defesa parcialmente conhecidos e, nesta parte, parcialmente providos, com extensão dos efeitos, nos termos do voto.
33. Recurso especial do Ministério Público julgado prejudicado.
34. Agravo regimental não conhecido.
(REsp 1170545/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 02/12/2014, DJe 16/03/2015)
RESPOSTA: CERTO