1. As palavras recebem uma dada descrição/classificação em função da área de estudo em que são consideradas.
Quando diz advérbio de inclusão, está a recorrer a uma classificação morfológica (advérbio) e a uma classificação semântica (de inclusão). Podemos a isto acrescentar uma função pragmática.
2. Acresce que os advérbios não obedecem a critérios distribucionais, semânticos ou morfológicos regulares.
A gramática tradicional inclui até nos exemplos de advérbios de inclusão. Cunha e Cintra classificam-no como uma palavra denotativa.1
Do ponto de vista sintá(c)tico, verifica-se que até pode afe(c)tar o sujeito:
a) «Até o Zé gostou do espe(c)táculo.»
ou pode afe(c)tar o grupo verbal:
b) «O Zé até gostou do espe(c)táculo.» 2
Do ponto de vista da pragmática (ou seja, basicamente, atendendo às relações entre o discurso e o contexto situacional em que ele se produz), até marca uma implicatura: «o Zé é difícil de contentar»/«O Zé é muito exigente».
A implicatura é desencadeada pela assunção que o falante faz sobre aquilo que o ouvinte sabe ou pode aceitar sem se opor.
3. Atendamos às frases que a consulente apresenta:
c) «O Filipe e até o João vão chegar tarde.»
Até afe(c)ta um constituinte do sujeito.
d) «O Filipe e o João até vão chegar tarde.»
Até afe(c)ta o grupo verbal.
A interpretação que a consulente faz de d), para confrontação com c), é um pouco forçada.
Recorramos à noção de implicatura e, portanto, ao conhecimento compartilhado que locutor e alocutário têm do Filipe e do João: até marca que a a(c)ção de chegar tarde não era esperada mas que um qualquer fa(c)tor extraordinário faz com que essa a(c)ção venha a ocorrer; em c) é só a João que a inflexão da expe(c)tativa se aplica; em d) a inflexão da expe(c)tativa aplica-se ao Filipe e ao João.
1 CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley 1984 – Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Edições Sá da Costa:
Palavras e Locuções Denotativas
São palavras que, embora, em alguns aspectos (ser invariável, por exemplo), assemelhem-se a advérbios, não possuem, segundo a Nomenclatura Gramatical Brasileira, classificação especial. Do ponto de vista sintático, são expletivas, isto é, não assumem nenhuma função; do ponto de vista morfológico, são invariáveis (muitas delas vindas de outras classes gramaticais); do ponto de vista semântico, são inegavelmente importantes no contexto em que se encontram (daí seu nome). Classificam-se em função da ideia que expressam:
Adição: ainda, além disso, etc.
Por exemplo:
Comeu tudo e ainda repetiu.
Afastamento: embora
Por exemplo:
Foi embora daqui.
Afetividade: ainda bem, felizmente, infelizmente
Por exemplo:
Ainda bem que passei de ano
Aproximação: quase, lá por, bem, uns, cerca de, por volta de, etc.
Por exemplo:
Ela quase revelou o segredo.
Designação: eis
Por exemplo:
Eis nosso carro novo.
Exclusão: apesar, somente, só, salvo, unicamente, exclusive, exceto, senão, sequer, apenas, etc.
Por exemplo:
Não me descontou sequer um real.
Explicação: isto é, por exemplo, a saber, etc.
Por exemplo:
Li vários livros, a saber, os clássicos.
Inclusão: até, ainda, além disso, também, inclusive, etc.
Por exemplo:
Eu também vou viajar.
Limitação: só, somente, unicamente, apenas, etc.
Por exemplo:
Só ele veio à festa.
Realce: é que, cá, lá, não, mas, é porque, etc.
Por exemplo:
E você lá sabe essa questão?
O que não diria essa senhora se soubesse que já fui famoso.
Retificação: aliás, isto é, ou melhor, ou antes, etc.
Por exemplo:
Somos três, ou melhor, quatro.
Situação: então, mas, se, agora, afinal, etc.
Mas quem foi que fez isso?
FONTE - www.soportugues.com.br