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ID
1259839
Banca
FCC
Órgão
TCE-RS
Ano
2014
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                  Nosso jeitinho

      Um amigo meu, estrangeiro, já há uns seis anos morando no Brasil, lembrava-me outro dia qual fora sua principal dificuldade - entre várias - de se adaptar aos nossos costumes. “Certamente foi lidar com o tal do jeitinho”, explicou. “Custei a entender que aqui no Brasil nada está perdido, nenhum impasse é definitivo: sempre haverá como se dar um jeitinho em tudo, desde fazer o motor do carro velho funcionar com um pedaço de arame até conseguir que o primo do amigo do chefe da seção regional da Secretaria de Alimentos convença este último a influenciar o Diretor no despacho de um processo”.
      Meu amigo estrangeiro estava, como se vê, reconhecendo a nossa “informalidade” - que é o nome chique do tal do jeitinho. O sistema - também batizado pelos sociólogos como o do “favor” - não deixa de ser simpático, embora esteja longe de ser justo. Os beneficiados nunca reclamam, e os que jamais foram morrem de inveja e mantêm esperanças. Até o poeta Drummond tratou da questão no poema “Explicação”, em que diz a certa altura: “E no fim dá certo”. Essa conclusão aponta para uma espécie de providencialismo místico, contrapartida divina do jeitinho: tudo se há de arranjar, porque Deus é brasileiro. Entre a piada e a seriedade, muita gente segue contando com nosso modo tão jeitoso de viver.
      É possível que os tempos modernos tenham começado a desfavorecer a solução do jeitinho: a informatização de tudo, a rapidez da mídia, a divulgação instantânea nas redes sociais, tudo se encaminha para alguma transparência, que é a inimiga mortal da informalidade. Tudo se documenta, se registra, se formaliza de algum modo - e o jeitinho passa a ser facilmente desmascarado, comprometido o seu anonimato e perdendo força aquela simpática clandestinidade que sempre o protegeu. Mas há ainda muita gente que acha que nós, os brasileiros, com nossa indiscutível criatividade, daremos um jeito de contornar esse problema. Meu amigo estrangeiro, por exemplo, não perdeu a esperança
.

                           (Abelardo Trabulsi, inédito)

Atente para as seguintes afirmações:

I. O amigo estrangeiro justifica ao autor do texto por que não lhe fora possível adaptar-se aos nossos costumes, dado que não chegou a entender perfeitamente como é que funciona o chamado jeitinho brasileiro.
II. A prática do jeitinho brasileiro é vista como informal porque não se tornou, propriamente, um fenômeno social marcante, a ser analisado no âmbito dos costumes coletivos de fato representativos de um modo de agir.
III. O fato de os tempos modernos favorecerem a transparência, a divulgação instantânea e o registro dos nossos atos vem acarretando algum entrave à prática do favor, que depende bastante do anonimato que a cerca.

Em relação ao texto, está correto o que se afirma APENAS em

Alternativas
Comentários
  • I. O amigo estrangeiro justifica ao autor do texto por que não lhe fora possível adaptar-se aos nossos costumes, dado que não chegou a entender perfeitamente como é que funciona o chamado jeitinho brasileiro. 

    . Custei a entender que aqui no Brasil nada está perdido(....) 

    II. A prática do jeitinho brasileiro é vista como informal porque não se tornou, propriamente, um fenômeno social marcante, a ser analisado no âmbito dos costumes coletivos de fato representativos de um modo de agir. 

          Mas há ainda muita gente que acha que nós, os brasileiros, com nossa indiscutível criatividade, daremos um jeito de contornar esse problema. 

    Gabarito: C

  • Acredito que a resposta da II esteja em:

    ''O sistema - também batizado pelos sociólogos como o do “favor” - não deixa de ser simpático, embora esteja longe de ser justo''

    Se os sociólogos batizaram como o do ''favor'' ao menos eles estudaram esse jeitinho, ou seja, analisaram o jeitinho brasileiro pra entender como este se comporta. 

  • Gostei da questão. Isso sim é interpretação de texto.

    I- O amigo não disse que não se adaptou ao jeitinho brasileiro. Ele apontou que teve dificuldades em entender;

    II- O fato de ser um mecanismo "informal" se dá justamente por ocorrer de maneira que diverge das formas "corretas", "Legais", "morais", traduzido em comportamentos que de tão corriqueiros são encarados com alguma "naturalidade", daí esse "costume" ser um fenômeno social, como estudados pelos sociólogos.