SóProvas


ID
1269496
Banca
MPE-MS
Órgão
MPE-MS
Ano
2013
Provas
Disciplina
Direito Processual Penal
Assuntos

Analise as seguintes proposições:

I. O princípio  nemo tenetur se detegere tem aplicação apenas em relação ao mérito do interrogatório, pois o réu tem o dever de informar seu nome e endereço, não sendo aplicável o direito ao silêncio, até porque o direito penal é dos fatos e não do autor.

II. Segundo o Supremo Tribunal Federal, não é vedada a gravação clandestina, inexistindo ferimento ao princípio da proibição de utilização de prova ilícita, pois a despeito de ser reprovável no campo ético, não o é no jurídico, pois as garantias estabelecidas na Constituição em forma de direitos fundamentais, em rigor, estão previstas como forma de proteção à intervenção de terceiros, de modo que, quando um dos interlocutores cuida de registrar a sua conversa com outrem, ainda que sem o consentimento deste, não há que se falar em ofensa ao direito à intimidade.

III. O princípio da proibição de proteção insuficiente pode ser entendido como uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade.

IV. O princípio do in dubio pro societate somente é aplicável na fase pronúncia, uma vez que ele não se mostra compatível com o Estado Democrático de Direito.

São corretas:

Alternativas
Comentários
  • I - CORRETA - "Em relação à qualificação, não cabe direito ao silêncio, nem o fornecimento de dados falsos, sem que haja consequência jurídica, impondo sanção. O direito ao silêncio não é ilimitado, nem pode se exercido abusivamente. As implicações, nessa situação, podem ser graves, mormente quando o réu fornece, maldosamente, dados de terceiros, podendo responder pelo seu ato.” (NUCCI, Guilherme de Souza.Código de Processo Penal comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 407). 

     

    II - CORRETA - STF HC 91.613/MG -  "2. Gravação clandestina (Gravação de conversa telefônica por uminterlocutor sem o conhecimento do outro). Licitude da prova.Por mais relevantes e graves que sejam os fatos apurados, provas obtidas sem a observância das garantias previstas na ordem constitucional ou em contrariedade ao disposto em normas de procedimento não podem ser admitidas no processo; uma vez juntadas, devem ser excluídas. O presente caso versa sobre a gravação de conversa telefônica por um interlocutor sem o conhecimento de outro, isto é, a denominada “gravação telefônica” ou “gravação clandestina”. Entendimento do STF no sentido da licitude da prova, desde que não haja causa legal específica de sigilo nem reserva de conversação. Repercussão geral da matéria (RE 583.397/RJ)". 

     

    III - CORRETA - RE 418.376, do voto do Ministro Gilmar Mendes impõe-se extrair o seguinte: "Quanto à proibição de proteção deficiente, a doutrina vem apontando para uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade. A proibição de proteção deficiente adquire importância na aplicação dos direitos fundamentais de proteção, ou seja, na perspectiva do dever de proteção, que se consubstancia naqueles casos em que o Estado não pode abrir mão da proteção do direito penal para garantir a proteção de um direito fundamental".

     

    IV. ERRADA - informativo 493 STJ "DENÚNCIA. IN DUBIO PRO SOCIETATE. A Turma entendeu que tal princípio não possui amparo legal, nem decorre da lógica do sistema processual penal brasileiro, pois a sujeição ao juízo penal, por si só, já representa um gravame. Assim, é imperioso que haja razoável grau de convicção para a submissão do indivíduo aos rigores persecutórios, não devendo se iniciar uma ação penal carente de justa causa. Nesses termos, a Turma restabeleceu a decisão de primeiro grau. Precedentes citados do STF: HC 95.068, DJe 15/5/2009; HC 107.263, DJe 5/9/2011".

  • Alguém sabe exatamente o que está errado na alternativa IV?

  • Caro Alberto Filipe... O item IV restou maculado quando se incluiu a palavra "somente", haja vista existirem outras hipóteses que se aplica a máxima do in dubio pro societate, como exemplo podemos citar o caso em que o réu ingresse com Revisão Criminal para desconstituir sentença penal condenatória. Perceba que, nesse caso, não é mais a acusação que deve provar a culpa do réu, pelo contrário, é ao réu a quem compete provar a sua inocência, se aplicando, dessa forma, o princípio supramencionado.

    Abraço.

  • IV - ERRADO

    Não é somente aplicável na fase da pronúncia. Na dúvida entre denunciar ou não, o MP deve denunciar, pois na denúncia tb prevalece o in dubio pro societate, conforme julgado do TRF:

    PENAL. PROCESSO PENAL. DENÚNCIA. RECEBIMENTO. INDUBIO PRO SOCIETATE. APLICABILIDADE. RECEBIMENTO. TRIBUNAL. ADMISSIBILIDADE. 1. Ao apreciar a denúncia, o juiz deve analisar o seu aspecto formal e a presença das condições genéricas da ação (condições da ação) e as condições específicas (condições de procedibilidade) porventura cabíveis. Em casos duvidosos, a regra geral é de que se instaure a ação penal para, de um lado, não cercear a acusação no exercício de sua função e, de outro, ensejar ao acusado a oportunidade de se defender, mediante a aplicação do princípio in dubio pro societate.

  • A despeito de respeitar o posicionamento da banca, parte da doutrina é contrária a afirmação do inciso I, como Aury Lopes Júnior. Ademais, alguns autores assentam que o in dubio pro societate é incompatível com o Estado Democrático de Direito, o que torna temerárias as alternativas exploradas pela banca; se inexiste posição uníssona na doutrina e na jurisprudência, seria melhor cobrar essas questões em uma prova discursiva...

  • Amigos,

    A seguinte assertiva, praticamente idêntica, foi considerada INCORRETA no seguinte concurso:

    Ano: 2017 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: Titular de Serviços de Notas e de Registros - Remoção

    " III. O princípio nemo tenetur se detegere tem aplicação apenas em relação ao mérito do interrogatório, pois o réu tem o dever de informar seu nome e endereço, não sendo aplicável o direito ao silêncio quanto aos dados de qualificação."

    Creio que a CONSULPLAN esteja errada.

    Fica a dúvida...

     

  • "Também deve-se lembrar que o Nemo Tenetur Se Detegere foi criado devido aos abusos cometidos no interrogatório, originariamente não sendo criado para afetar somente esse meio de defesa, tanto o é que a referida Garantia não é aplicada ao interrogatório de identificação, somente interrogatório de mérito (TOURINHO FILHO, v. 3. 2002. p. 281). "

     

    No entanto, fica a dúvida quanto a afirmativa I, pois foi considerada INCORRETA na seguinte prova: Ano: 2017 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: Titular de Serviços de Notas e de Registros - Remoção

  • O erro da IV é simples demais, por decorre de mera lógica: se o in dubio pro societate é incompatível com o Direito brasileiro (que é, alegadamente, "democrático de direito"), como está escrito na segunda parte da proposição), não deveria ser aceito nem mesmo na fase de pronúnci (do rito do tribunal do júri), como está escrito na primeira parte da proposição.

  • I - correta para a doutrina majoritária, apesar de haver parcela da doutrina que entende que o nemo tenetur se aplica também à identificação do acusado.

     

    II. correta - O STF admite a gravação clandestina como meio de obtenção de provas. Não é considerado pelos Tribunais esse mecanismo como prova ilícita.

    III. correta? a meu ver, incorretaA gente marca que está certo porque normalmente as provas de MP seguem um artigo jurídico elaborado por um famigerado desembargador do TRF-4. Apesar de, segundo ele, estar "correta" a afirmação do que seria garantismo positivo e negativo, isso não é garantismo penal preconizado e nos moldes de Luigi Ferrajoli. Não há adoção desses termos na obra "Direito e Razão". Basicamente o que fez o autor foi misturar os conceitos da Suprema Corte Alemã das vertentes da proporcionalidade e anexá-los à doutrina do garantismo.

    *Artigo jurídico que fundamenta as questões do MP sobre garantismo positivo (sic): http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao028/douglas_fischer.html

    **Artigo jurídico que critica o "garantismo positivo" (a meu ver, artigo corretíssimo): https://jus.com.br/artigos/21541/garantismo-positivo-e-garantismo


    IV. Errado Realmente, o princípio do in dubio pro societate NÃO TEM fundamentação constitucional, infraconstitucional, convencional etc. Trata-se de uma aberração jurídica criada sob o manto punitivista. O curioso é uma prova de adotar um conceito de garantismo positivo e não adotar o in dubio pro societate na decisão de pronúncia. Nessa questão o candidato tinha que ter extraordinários poderes de adivinhação.

     

    GABARITO: LETRA C

  • Não esqueçamos também que, no caso de revisão criminal, na dúvida, mantém-se a condenação, ou seja, opera-se in dubio pro societate.

  • Mais um exemplo de cabimento do in dubio pro societate, além da fase da pronúncia:

    Entretanto, é possível falar em inversão do ônus da prova em medidas cautelares assecuratórias regradas pela Lei de Lavagem de Capitais (Lei n° 9.613/1998). Em processo penal, inversão do ônus da prova é atribuir à defesa da pessoa imputada o encargo de desconstituir a evidência de relação entre o fumus comissi delicti (o lastro que denota a materialidade da infração penal) e um determinado bem valioso (dinheiro, valores, bens). Para tal providência assecuratória e para a sua manutenção consoante princípio rebus sic stantibus, não se aplica a regra do in dubio pro reu, porém, inversamente, a do in dubio pro societate (Nestor Távora, Curso de Direito Processual Penal, 2017, pág. 650).

  • Colegas, com relação à questão IV, transcrevo aqui considerações feitas pelo prof. Márcio:

     

    Em que consiste o princípio do in dubio pro societate?

    O princípio do in dubio pro societates significa que, na dúvida, havendo indícios mínimos da autoria, deve-se dar prosseguimento à ação penal, ainda que não se tenha certeza de que o réu foi o autor do suposto delito.

    Em uma tradução literal, seria algo como “na dúvida, em favor da sociedade”.

    O princípio do in dubio pro societate contrapõe-se ao princípio do in dubio pro reo (“na dúvida, em favor do réu”).

     

    O princípio do in dubio pro societate continua vigorando no ordenamento jurídico brasileiro?

    A doutrina mais moderna critica a existência desse princípio afirmando que ele é contrário às garantias conferidas ao réu. Apesar disso, a jurisprudência continua aplicando esse princípio em duas fases:

     

    1) No momento do recebimento da denúncia:

    A propositura da ação penal exige tão somente a presença de indícios mínimos de autoria. A certeza, a toda evidência, somente será comprovada ou afastada após a instrução probatória, prevalecendo, na fase de oferecimento da denúncia o princípio do in dubio pro societate.

    STJ. 5ª Turma. RHC 93.363/SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 24/05/2018.

     

    No momento da denúncia, prevalece o princípio do in dubio pro societate.

    STF. 1ª Turma. Inq 4506/DF, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/04/2018 (Info 898).

     

    2) Na decisão de pronúncia no procedimento do Tribunal do Júri:

    A pronúncia do réu para o julgamento pelo Tribunal do Júri não exige a existência de prova cabal da autoria do delito, sendo suficiente, nessa fase processual, a mera existência de indícios da autoria, devendo estar comprovada, apenas, a materialidade do crime, uma vez que vigora o princípio in dubio pro societate.

    STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1193119/BA, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 05/06/2018.

     

    Na sentença de pronúncia deve prevalecer o princípio in dubio pro societate, não existindo nesse ato qualquer ofensa ao princípio da presunção de inocência, porquanto tem por objetivo a garantia da competência constitucional do Tribunal do Júri.

    STF. 2ª Turma. ARE 986566 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 21/08/2017.

     

    E na análise da autoria e materialidade durante prolação da sentença (sem ser Tribunal do Júri), adota-se aqui também o princípio do in dubio pro societate?

    NÃO. Nesta fase, adota-se o princípio do in dubio pro reo. A insuficiência de provas conduz à absolvição, nos termos do art. 386, VII, do CPP.

     

    CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Princípio do in dubio pro societatee. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 11/10/2018

     

    Bons estudos!

  • Meus queridos, cá entre nós, vamos combinar, esse negócio de "in dubio pro societate" é uma tremenda de uma ~falácia falaciosa~...

  • ATENÇÃO:

    Decisão: A Turma, por votação unânime, negou seguimento ao recurso. Prosseguindo no julgamento, por maioria, concedeu, de ofício, a ordem de habeas corpus, para restabelecer a sentença de impronúncia em relação aos imputados José Reginaldo da Silva Cordeiro e Cleiton Cavalcante, nada impedindo, nos termos do art. 414, parágrafo único, do CPP, que, enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia com relação a esses recorrentes, tudo nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia. Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski. 2ª Turma, 26.3.2019.

    De acordo com essa decisão, no ARE1067392, a pronúncia não deve ser pro societate.

  • Ao meu ver o item I está incorreto, pois a banca não disse de forma tácita e precisa que estava analisando o referido princípio apenas com relação ao interrogatório. Ao afirmar que o princípio “nemo tenetur se detegere” tem aplicação apenas ao mérito do interrogatório a banca está dizendo que o acusado é obrigado a praticar ações quero o prejudiquem quando da produção de outras provas. Em suma, a afirmativa da forma em que se encontra, na minha opinião, está errada. Havendo especificação de que o item refere-se apenas ao interrogatório, a questão fica perfeita.

  • Como sempre, provas do MP estadual com técnica pífia... Então o princípio é incompatível com o Estado democrático de Direito e ainda assim é aplicável? Empurraram 50 anos de dogmática no lixo?

  • partilho do entendimento que o item I está errado. tendo em vista que já caiu na prova abaixo e foi considerada errada.

    Ano: 2017 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: Titular de Serviços de Notas e de Registros - Remoção

    " III. O princípio nemo tenetur se detegere tem aplicação apenas em relação ao mérito do interrogatório, pois o réu tem o dever de informar seu nome e endereço, não sendo aplicável o direito ao silêncio quanto aos dados de qualificação."

    e nao somente isso.

    Conforme LOPES Jr., o ‘direito de silêncio é apenas uma manifestação de uma garantia muito maior, esculpida no princípio nemo tenetur se detegere, segundo a qual o sujeito passivo não pode sofrer nenhum prejuízo jurídico por omitir-se de colaborar em uma atividade probatória da acusação ou por exercer seu direito de silêncio quando interrogado’ e acrescenta que do exercício do direito ao silêncio não pode nascer nenhuma presunção de culpabilidade ou qualquer tipo de prejuízo jurídico ao imputado, 

    esse principio muito maior se desdobra nos seguintes conforme o livro do RENATO BRASILEIRO

    b) direito de não ser constrangido a confessar a prática de ilícito penal:

    c) inexigibilidade de dizer a verdade:

    d) direito de não praticar qualquer comportamento ativo que possa incriminá-lo:

    1) o acusado não está obrigado a fornecer padrões vocais necessários a subsidiar prova pericial

    de verificação de interlocutor;98

    2) o acusado não está obrigado a fornecer material para exame grafotécnico:

    e) direito de não produzir nenhuma prova incriminadora invasiva:

    ou seja. nao esta limitado APENAS em relacao ao interrogatorio mais também a PRODUÇÃO DE PROVAS.

  • Acerca dos principios no Processo Penal, é correto afirmar que: 

    -O princípio nemo tenetur se detegere tem aplicação apenas em relação ao mérito do interrogatório, pois o réu tem o dever de informar seu nome e endereço, não sendo aplicável o direito ao silêncio, até porque o direito penal é dos fatos e não do autor.

    -Segundo o Supremo Tribunal Federal, não é vedada a gravação clandestina, inexistindo ferimento ao princípio da proibição de utilização de prova ilícita, pois a despeito de ser reprovável no campo ético, não o é no jurídico, pois as garantias estabelecidas na Constituição em forma de direitos fundamentais, em rigor, estão previstas como forma de proteção à intervenção de terceiros, de modo que, quando um dos interlocutores cuida de registrar a sua conversa com outrem, ainda que sem o consentimento deste, não há que se falar em ofensa ao direito à intimidade.

    -O princípio da proibição de proteção insuficiente pode ser entendido como uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade.

  • Entendi a IV como errada porque, além da pronúncia, no recebimento da denúncia também vigora o princípio in dubio pro societate. No momento em que o juiz deve decidir se dá início a ação penal, NÃO vigora o in dubio pro reo. Ou seja, no início da ação penal, o juiz, na dúvida, deve recebê-la, deve ser a favor da sociedade. 

  • Há recente decisão do TSE quanto à validade da prova obtida por meio de gravação clandestina, para subsidiar AIME. Esse Tribunal considerou ilícita. No STF a questão é objeto de repercussão geral, pendente de julgamento.