SóProvas


ID
1899331
Banca
NUCEPE
Órgão
Prefeitura de Teresina - PI
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                        A OVELHA NEGRA

      Havia um país onde todos eram ladrões.

      À noite, cada habitante saía, com a gazua e a lanterna, e ia arrombar a casa de um vizinho. Voltava de madrugada, carregado e encontrava a sua casa arrombada.

      E assim todos viviam em paz e sem prejuízo, pois um roubava o outro, e este, um terceiro, e assim por diante, até que se chegava ao último que roubava o primeiro. O comércio naquele país só era praticado como trapaça, tanto por quem vendia como por quem comprava. O governo era uma associação de delinquentes vivendo à custa dos súditos, e os súditos por sua vez só se preocupavam em fraudar o governo. Assim a vida prosseguia sem tropeços, e não havia nem ricos nem pobres.

      Ora, não se sabe como, ocorre que no país apareceu um homem honesto. À noite, em vez de sair com o saco e a lanterna, ficava em casa fumando e lendo romances. Vinham os ladrões, viam a luz acesa e não subiam.

      Essa situação durou algum tempo: depois foi preciso fazê-lo compreender que, se quisesse viver sem fazer nada, não era essa uma boa razão para não deixar os outros fazerem. Cada noite que ele passava em casa era uma família que não comia no dia seguinte.

      Diante desses argumentos, o homem honesto não tinha o que objetar. Também começou a sair de noite para voltar de madrugada, mas não ia roubar. Era honesto, não havia nada a fazer. Andava até a ponte e ficava vendo a água passar embaixo. Voltava para casa, e a encontrava roubada. 

      Em menos de uma semana o homem honesto ficou sem um tostão, sem o que comer, com a casa vazia. Mas até aí tudo bem, porque era culpa sua; o problema era que seu comportamento criava uma grande confusão. Ele deixava que lhe roubassem tudo e, ao mesmo tempo, não roubava ninguém; assim sempre havia alguém que, voltando para casa de madrugada, achava a casa intacta: a casa que o homem honesto devia ter roubado. O fato é que, pouco depois, os que não eram roubados acabaram ficando mais ricos que os outros e passaram a não querer mais roubar. E, além disso, os que vinham para roubar a casa do homem honesto sempre a encontravam vazia; assim iam ficando pobres.

      Enquanto isso, os que tinham se tornado ricos pegaram o costume, eles também, de ir de noite até a ponte, para ver a água que passava embaixo. Isso aumentou a confusão, pois muitos outros ficaram ricos e muitos outros ficaram pobres.

      Ora, os ricos perceberam que, indo de noite até a ponte, mais tarde ficariam pobres. E pensaram: “Paguemos aos pobres para ir roubar para nós”. Fizeram-se os contratos, estabeleceram-se os salários, as percentagens: naturalmente, continuavam a ser ladrões e procuravam enganar-se uns aos outros. Mas, como acontece, os ricos tornavam-se cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.

      Havia ricos tão ricos que não precisavam mais roubar e que mandavam roubar para continuarem a ser ricos. Mas, se paravam de roubar, ficavam pobres porque os pobres os roubavam. Então pagaram aos mais pobres dos pobres para defenderem as suas coisas contra os outros pobres, e assim instituíram a polícia e constituíram as prisões.

      Dessa forma, já poucos anos depois do episódio do homem honesto, não se falava mais de roubar ou de ser roubado, mas só de ricos ou de pobres; e, no entanto, todos continuavam a ser pobres.

      Honesto só tinha havido aquele sujeito, e morrera logo, de fome.

(ÍTALO CALVINO. In: Um general na biblioteca. Companhia das Letras, São Paulo, 2001)

Em: “Dessa forma, já poucos anos depois do episódio do homem honesto, não se falava mais em roubar ou ser roubado”. A função sintática do termo destacado é

Alternativas
Comentários
  • poucos anos depois do episódio do homem honesto => adjunto adverbial de tempo.

    [Gab. B]

    bons estudos! 

  • Gab B

    Muitas pessoas marcaram E, mas se liguem no pronome "dessa". “Dessa forma, já poucos anos depois do episódio do homem honesto, não se falava mais em roubar ou ser roubado”, ele remete a um trecho anterior do texto, não relacionando a frase em negrito como aposto explicativo.

    Escrevi aqui porque também fiquei na dúvida!

    Avante...

     

  • b)adjunto adverbial de tempo.  Tem funcao de adverbio de tempo por designar a ideia de tempo passado. Para ser aposto, necessita estar explicando um substantivo expresso na oração. 

  • A BANCA RESTRIGIU A FRASE DEPOIS DA VÍRGULA: (...), JÁ  "MUITOS...". OU SEJA, ELA FEZ ISSO DE PROPÓSITO PARA SER OBSERVADO PELO CANDIDATO. INTERESSANTE. LOGO, LETRA B. CASO MARCASSE TODO A FRASE, SERIA A LETRA "E".

  • Gab. B! O termo "já" (que não está em destaque) é um advérbio de tempo, seguido pelo seu adjunto adverbial de tempo que arremata ao respectivo advérbio.

    Se o termo em destaque fosse todo o conteúdo entre vírgulas, teríamos um aposto explicativo.

  • Resposta: B

     

    Em: “Dessa forma, já poucos anos depois do episódio do homem honesto, não se falava mais em roubar ou ser roubado”. A função sintática do termo destacado é :

     

    a) adjunto adverbial de lugar. Incorreta, pois poucos anos depois indica tempo decorrido e não lugar.   

     

    b) adjunto adverbial de tempo. Correta

     

    c) adjunto adnominal. Incorreta, pois adjunto adnominal é o termo que determina ou modifica um substantivo. Perceba que o termo em destaque não está se relacionando com um substantivo.

     

    d) complemento nominal. Incorreta, pois complemento nominal é o termo preposicionado que completa o sentido do substantivo, adjetivo ou advérbio. A oração em destaque não está exercendo esta função.  

     

    e) aposto explicativo. Incorreta, pois aposto é o termo que se une ao substantivo ou pronome substantivo esclarecendo-lhe o sentido. Geralmente vem separado por virgulas ou dois pontos. O termo em negrito não tem relação com substantivo ou pronome substantivo, por isso que, esta opção está errada.

  • "já(advérbio) poucos anos depois do episódio do homem honesto"

  • Não se falava mais em roubar ou ser roubado poucos anos depois do episódio do homem honesto.