SóProvas


ID
1986829
Banca
IBFC
Órgão
MGS
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Uma Vela para Dario
(Dalton Trevisan)
Dario vinha apressado, guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminuiu o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Por ela escorregando, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva, e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no e indagaram se não se sentia bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta. O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer de ataque.
Ele reclina-se mais um pouco, estendido agora na calçada, e o cachimbo tinha apagado. O rapaz de bigode pediu aos outros que se afastassem e o deixassem respirar. Abre-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario rouqueja feio, bolhas de espuma surgiram no canto da boca.
Cada pessoa que chega ergue-se na ponta dos pés, não o pode ver. Os moradores da rua conversam de uma porta à outra, as crianças de pijama acodem à janela. O senhor gordo repete que Dario sentou-se na calçada, soprando a fumaça do cachimbo, encostava o guarda-chuva na parede. Mas não se vê guarda-chuva ou cachimbo ao seu lado.
A velhinha de cabeça grisalha grita que ele está morrendo. Um grupo o arrasta para o táxi da esquina. Já no carro a metade do corpo, protesta o motorista: quem pagaria a corrida? Concordam chamar a ambulância. Dario conduzido de volta e recostado à parede - não tem os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém informa da farmácia na outra rua. Não carregam Dario além da esquina; a farmácia é no fim do quarteirão e, além do mais, muito peso. É largado na porta de uma peixaria. Enxame de moscas lhe cobre o rosto, sem que faça um gesto para espantá-las.
Ocupado o café próximo pelas pessoas que apreciam o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozam as delícias da noite. Dario em sossego e torto no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugere lhe examinem os papéis, retirados - com vários objetos - de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficam sabendo do nome, idade; sinal de nascença. O endereço na carteira é de outra cidade.
Registra-se correria de uns duzentos curiosos que, a essa hora, ocupam toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investe a multidão. Várias pessoas tropeçam no corpo de Dario, pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproxima-se do cadáver, não pode identificá- lo — os bolsos vazios. Resta na mão esquerda a aliança de ouro, que ele próprio quando vivo - só destacava molhando no sabonete. A polícia decide chamar o rabecão.
A última boca repete — Ele morreu, ele morreu. A gente começa a se dispersar. Dario levou duas horas para morrer, ninguém acreditava estivesse no fim. Agora, aos que alcançam vê-lo, todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso dobra o paletó de Dario para lhe apoiar a cabeça. Cruza as mãos no peito. Não consegue fechar olho nem boca, onde a espuma sumiu. Apenas um homem morto e a multidão se espalha, as mesas do café ficam vazias. Na janela alguns moradores com almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acende ao lado do cadáver. Parece morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecham-se uma a uma as janelas. Três horas depois, lá está Dario à espera do rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó. E o dedo sem a aliança. O toco de vela apaga-se às primeiras gotas da chuva, que volta a cair. 

Em “O toco de vela apaga-se às primeiras gotas da chuva, que volta a cair.” (14°§), considerando as vozes do verbo, pode-se reescrever, corretamente, o trecho em destaque da seguinte forma:

Alternativas
Comentários
  • O toco de vela apaga-se às primeiras gotas da chuva, que volta a cair.

    O toco de vela é apagado pelas primeiras gotas de chuva...

  • Letra a

    " Ele apaga-se" (sintética)

    " Ele é apagado" (analítica)

     

    Enquanto a voz passiva sintética se apresenta com o pronome apassivador "se" somado ao verbo principal, que deverá concordar com o sujeito, a voz passiva analítica é formada pelo verbo ser somado ao particípio [-ado (1ª conjugação) e -ido(2ª e 3ª conjugações)] do verbo principal.

     

     

     

  • Mas o verbo APAGAR-SE nesse caso não é intransitivo e reflexivo? Se assim o é não é possível flexão para voz passiva...

  • MARIANA OLIVEIRA VIAJOU...OLHA A EXPLICAÇAO DA HELEN C.

  •  “O toco de vela apaga-se às primeiras gotas da chuva, que volta a cair.”

     

    "apaga-se" - Voz Passiva Sintética (verbo principal + pronome apassivador)

     

    Exatamente Frederico. O verbo apagar é geralmente transitivo direto e o pronome apassivador "se" exige a preposiçao "a"; e "as primeiras" é substantivo feminino antecedido do artigo definido "as", daí a crase para que nao haja ambiguidade, pois sao "as primeiras gotas da chuva" quem apaga "o toco de vela" e nao vice-versa.

     

    Podemos transcrever:

     “O toco de vela se apaga às primeiras gotas da chuva, que volta a cair.” >

      “O toco de vela é apagado {voz passiva analítica ( verbo ser + particípio) } pelas primeiras gotas da chuva, que volta a cair.”

     

    OBS: Geralmente com o verbo SER e ESTAR emprega-se o particípio irregular para formaçao da voz passiva, porém neste caso, o verbo "apagar" nao é um verbo abundante, ele só tem a forma regular.

     

  • Não compreendi muito bem a questão mas discordo dos comentários de alguns colegas.

    O verbo 'apagar' em análise é VTD preposicionado ( por isso há crase em ' às primeiras gotas da chuva ' que é o objeto direto ), sendo assim a partícula ' SE ' é PIS ( Pronome indeterminador do sujeito ) e por isso o verbo se flexiona na terceira pessoa do singular.

    Temos uma oração sem sujeito e na voz ativa.

    A alternativa (A) ' O toco de vela é apagado '  é a mudança da voz ativa ( sem sujeito ) para a voz passiva analítica ( quem tem sujeito passivo )

    Não entendi essa parte. Como é possível uma voz ativa sem sujeito ao ser passada para passiva analítica ter sujeito ?

  • A questão pede, com outras palavras, para passar a oração da voz passiva sintética (verbo na 3ª pessoa + pronome apassivador "se") para a voz passiva analítica (verbo auxiliar "ser" + verbo principal no particípio).

  • Sobre a professora do vídeo.

    Gostei muitooo de sua explicação, você fala com muita clareza e dominio do assunto. Parabéns!

  • voz passiva analitica e sintetica são equivalentes,no caso a frase esta na voz passiva sintetica e a questão pede pra trocar pela voz passiva analitica.

  • Ótima aula da professora, humildade e objetividade na explicação, show de bola!

  • Vozes verbais assunto gostoso, (NÃO CONFUNDA PARTICULA APASSIVADORA VTD,VTDI COM SUJEITO INDETERMINADO VTI,VL,VI, VTD+PREP+SE) . #PMSE

  • Gabarito A

     

     

     

    Apaga-se (Voz passiva sintética: VTD+SE) equivale a “é apagado” (Voz passiva analítica “ser+particípio”). 
    Na letra b, não há voz reflexiva, pois não é a vela que apaga a si mesma. Ela é apagada pela chuva. Pelo mesmo motivo, não poderia ser a letra C, que traz sujeito indeterminado “apagam”. 

     

     

     

    Tudo posso Naquele que me fortalece!

  • se fosse APAGAM-SE = SÃO APAGADOS

  • O “se” em destaque funciona como partícula apassivadora, pois está ladeado de um verbo que solicita objeto direto (quem apaga apaga algo). Isso configura uma voz passiva do tipo sintética ou pronominal. Convertendo-se essa forma para o formato analítico, tem-se a inserção do auxiliar “ser” flexionado no mesmo tempo do verbo “ser” e concordando com o sujeito paciente “O toco de vela”, acompanhado do verbo principal no particípio.

    Portanto, a conversão para a forma analítica resulta na seguinte construção “O toco de vela é apagado”.

    Resposta: A