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ID
2797669
Banca
CS-UFG
Órgão
Câmara de Goiânia - GO
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Leia o Texto para responder à questão.


E a tristeza dá samba


“É melhor ser alegre que ser triste”, ensina Vinicius de Moraes em Samba da Bênção, parceria com o violonista Baden Powell. Alguns versos adiante, porém, o poeta reconhece que, sem melancolia, o ritmo desanda: “porque o samba é a tristeza que balança / E a tristeza tem sempre uma esperança / De um dia não ser mais triste, não”. Samba da Bênção é uma síntese magistral do espírito com que a música brasileira – e em particular seu gênero original, o samba – aborda essa aspiração humana universal – a felicidade. Não se alcança essa utopia sem passar pelo chão da tristeza. Ainda que o colorido exuberante que se vê nos desfiles de rua diga o contrário, a tristeza é a raiz do samba.

Filho direto do choro, do maxixe e de canções de rodas dos escravos – como o blues americano, ou outro ritmo africano nascido nas Américas – entende de sofrimento. E a alma lusitana também pesa em suas notas mais sorumbáticas: a canção portuguesa, com sua eterna saudade do quinhão natal, contribui muito para o gênero – que da Península Ibérica herdou também o violão, o cavaquinho e eventuais bandolins. Há uma série de clássicos do cancioneiro popular que associam saudade à felicidade. Eis o carioca Noel Rosa, em Felicidade: “Minha amizade foi-se embora com você / Se ela vier e te trouxer / Que bom, felicidade é que vai ser”. O mineiro Ataulfo Alves revisita o banzo português em Meus Tempos de Criança, canção dedicada à sua cidade natal, Muraí: “Ai meu Deus, eu era tão feliz / No meu pequenino Muraí”. O gaúcho Lupicínio Rodrigues, em mais uma composição significativamente intitulada Felicidade, diz: “E a saudade no meu peito ainda mora / E é por isso que eu gosto lá de fora / Porque sei que a falsidade não vigora”.

Nessa idealização da terra de nascença como morada da simplicidade e da autenticidade, o morro carioca já foi o lugar feliz por excelência – pelo menos, na canção brasileira da primeira metade do século XX, bem antes de a favela converter-se em teatro de guerra de facções criminosas. Ave Maria do Morro, lançada em 1942, por Herivelto Martins, canta o bucolismo de uma vizinhança onde se ouve “a sinfonia de pardais anunciando o anoitecer”. Manifestação já um tanto tardia – de 1968 – mas igualmente bela do mesmo sentimento é Alvorada, de Cartola, Carlos Cachaça e Hermínio Bello de Carvalho: “Alvorada lá no morro / Que beleza / Ninguém chora, não há tristeza / Ninguém sente dissabor”.

A bossa nova, mais Zona Sul, encarou a felicidade – e sua necessária contraparte, a tristeza – com ânimo filosófico e engenhosidade musical. A Felicidade, de Tom Jobim e Vinicius, fala da natureza efêmera e frágil da “ilusão do carnaval”. A felicidade, diz a canção, é “como a gota / de orvalho numa pétala de flor”. Tom Jobim esmerou-se na tradução sonora desses sentimentos, com um emprego dinâmico de acordes maiores e menores – os primeiros de sonoridade mais solar, os segundos com evocações melancólicas. Em Amor em Paz, o verso “encontrei em você / a razão de viver e de não sofrer mais, nunca mais” é em tom maior, mas a frase “o amor é a coisa mais triste quando se desfaz” já é em menor. Há efeitos similares no samba tradicional: Tristeza, que Nilton de Souza criou em 1963 – consagrada três anos depois na voz de Jair Rodrigues –, foi feita para exorcizar um namoro que deu errado, mas a melodia animada, triunfal, em tonalidades maiores, faz com que a canção seja o oposto de seu título.

“Uma canção me consola”, dizia Caetano Veloso em Alegria, Alegria, no ano tropicalista de 1968. E as mais tristes canções têm mesmo essa propriedade de cura. Nelson Cavaquinho, o grande pessimista do samba, é muito lembrado pelo desalento dos versos “tire o seu sorriso do caminho / que eu quero passar com a minha dor”, mas também viu alegria no amor (“contigo aprendi a sorrir, diz em Minha Festa). No samba atual, Arlindo Cruz rima felicidade e honestidade, exaltando o trabalho digno: “A felicidade é maior / Para quem se dá mais valor / Honestidade e suor / Eu sou um trabalhador”, ensina Isso É Felicidade, de 2014. A felicidade não precisa acabar na Quarta-Feira de Cinzas.


MARTINS, Sérgio. E a tristeza dá samba. Veja. São Paulo: Abril, n. 2569, 14 fev. 2018, p. 80-81. (Adaptado). 

Em qual trecho do texto a negação constitui uma marca de oralidade?

Alternativas
Comentários
  • GABARITO C.

     

    Marcas da oralidade é a transcrição do falar cotidiano das pessoas na escrita. Nesse caso, o autor quando escreve uma crônica, por exemplo, vai transcrever um diálogo não de forma culta, mas sim da maneira como as pessoas falam. As gírias fazem parte das marcas da oralidade.

  • Chute certeiroooooo

  • Eu compreendi (confundi) essa coisa da oralidade como de orador (culto, fala bem, se expressa bem).

  • E quando você acerta mais questões do Cespe do que do Centro de Seleção da UFG, o que dizer disso?