SóProvas


ID
293761
Banca
UNIRIO
Órgão
UNIRIO
Ano
2008
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto II

Tristeza de Cronista

A moça viera da cidade para os lados de Botafogo. No ônibus repleto, dois rapazes de pé conversavam, e sua conversa era ouvida por todos os passageiros. (Inconveniente dos hábitos atuais). Eram dois rapazes modernos, bem vestidos, bem nutridos. (Ah! Este excesso de vitaminas e de esportes!). Um não conhecia quase nada da cidade e outro servia-lhe de cicerone. Mostrava-lhe, pois, a avenida e os seus principais edifícios, a Cinelândia, o Obelisco, o Monumento dos Pracinhas, o Museu de Arte Moderna, o Aterro, o mar...
      O outro interessava-se logo pelas minúcias: qual o melhor cinema? Quantos pracinhas estão ali? que se pode ver no museu? Mas os ônibus andam tão depressa e caprichosamente que as perguntas e respostas se desencontravam. (Que fôlego humano pode competir com o de um ônibus?).
     Quanto ao Pão de Açúcar, o moço não manifestou grande surpresa: já o conhecia de cartões-postais;
apenas exprimiu o seu receio de vir o carrinho a enguiçar. Mas o outro combateu com energia tal receio, como se ele mesmo fosse o engenheiro da empresa ou, pelo menos, agente turístico.
     Assim chegaram a Botafogo, e a atenção de ambos voltou-se para o Corcovado, porque um dizia: “Quando você vir o Cristo mudar de posição, e ficar de lado e não de frente, como agora, deve tocar a campainha, porque é o lugar de saltar”. O companheiro prestou atenção.
     Mas, enquanto não saltava, o cicerone explicou ao companheiro: “Nesta rua há uma casa muito importante. É a casa de Rui Barbosa. Você já ouviu falar nele?” O outro respondeu que sim, porém sem grande convicção.
     Mais adiante, o outro insistiu: “É uma casa formidável. Imagine que tudo lá dentro está conforme ele
deixou!” O segundo aprovou, balançando a cabeça com muita seriedade e respeito. Mas o primeiro estava empolgado pelo assunto e tornou a perguntar: “Você sabe quem foi Rui Barbosa, não sabe?” O segundo atendeu ao interesse do amigo: “Foi um sambista, não foi?” O primeiro ficou um pouco sem jeito, principalmente porque uns dois passageiros levantaram a cabeça para aquela conversa. Diminuiu um pouco a voz: ”Sambista, não”. E tentou explicar. Mas as palavras não lhe ocorriam e ficou por aqui: “Foi... foi uma pessoa muito falada”. O outro não respondeu.
     E foi assim que o Cristo do Corcovado mudou de posição sem eles perceberem, e saltaram fora do ponto.
     Ora, a moça disse-me; “Você com isso pode fazer uma crônica”. Respondi-lhe: “A crônica já está feita por si mesma. É o retrato deste mundo confuso, destas cabeças desajustadas. Poderão elas ser consertadas? Haverá maneira de se pôr ordem nessa confusão? Há crônicas e crônicas mostrando o caos a que fomos lançados. Adianta alguma coisa escrever para os que não querem resolver?”
      A moça ficou triste e suspirou. (Ai, nós todos andamos tristes e suspirando!).

Meireles, Cecília. Escolha o seu sonho. São Paulo: Círculo do livro, s/d.


Das estruturas destacadas, a que apresenta ambigüidade é

Alternativas
Comentários
  • Ambiguidade é a possibilidade de uma mensagem ter dois sentidos. Ela geralmente é provocada pela má organização das palavras na frase. A ambiguidade é um caso especial de polissemia, a possibilidade de uma palavra apresentar vários sentidos em um contexto.

    Ex:

    "Onde está a vaca da sua avó?" (Que vaca? A avó ou a vaca criada pela avó?)
    "Onde está a cachorra da sua mãe?" (Que cachorra? A mãe ou a cadela criada pela mãe?)
    "Este líder dirigiu bem sua nação"("Sua"? Nação da 2ª ou 3ª pessoa (o líder)?).
    Obs 1: O pronome possessivo "seu(ua)(s)" gera muita confusão por ser geralmente associado ao receptor da mensagem.

    Obs 2: A preposição "como" também gera confusão com o verbo "comer" na 1ª pessoa do singular.

    A ambiguidade normalmente é indesejável na comunicação unidirecional, em particular na escrita, pois nem sempre é possível contactar o emissor da mensagem para questioná-lo sobre sua intenção comunicativa original e assim obter a interpretação correta da mensagem
    fonte: wikipedia

  • Ótimo comentário do amigo acima. No entanto, errei a questão por marcar a letra c).


    “Quando você vir o Cristo mudar de posição, e ficar de lado e não de frente, ...” (§ 4º.)     


    Pensei da seguinte forma: Quem ficar de lado e não de frente? Você ou o Cristo? 


    Não entendi muito do porquê da letra e) ser a correta. Se alguém tiver noção, seria ótimo postar aqui.






  • O termo:... muito falada... possui dois sentidos.
    Um sentido positivo: No qual Rui Barbosa seria uma pessoa muito conhecida e falada por muitas pessoas.
    Um sentido negativo: No qual Rui Barbosa seria uma pessoa negativamente falada... ou seja, mal falada.

    Foi o que entendi!
  • Ambiguidade é com relação a duplicidade no sentido da frase e não com relação ao sentido da palavra.

    Concordo que a palavra "falada" tem mais de um sentido, porem não é o que a questão quer. (Por sinal acabei de cometer uma COLISÃO).

    Marcaria a "c" sem medo de ser feliz na mesma linha de raciocínio do José Silva.


  • Impressionante como as bancas de concurso conseguem pegar um assunto importante dos estudos da linguagem e transformá-lo em um saco de gatos. Tudo por conta da preguiça. Você passa anos estudando Bakhtin, Peirce, etc...

    E os caras reduzem a isso. Não estou pedindo uma análise de poema ou de uma passagem importante de um romance, porque aí seria demais, mas, pelo amor de DEUUUSSSS, trabalhem com um texto completo, que de fato explore o fenômeno da ambiguidade. Isso não é ambiguidade, é pegadinha, e vc não mede nada com isso, nenhum tipo de capacidade. Se eu colocar meus alunos do 6 ano para formarem questões de concursos, eles fazem umas trinta dessas em uma tarde, talvez mais, e os caras são pagos para isso. Vão tomar vergonha. Se for para fazer pegadinha, pelo menos tome o cuidado de não jogar para frente uma questão com duas respostas certas, pelo amor de Deus... Precisamos de uma lei urgentemente para regular as provas de concurso... Assim não dá mais... Políticos incompetentes, bancas gananciosas... Temos de mudar isso.

  • QUESTÃO SEM GABARITO

    A ambiguidade a que o gab (E) supostamente se refere é a ambiguidade entre falada como particípio presente e como particípio depoente. No primeiro sentido, falam muito sobre a pessoa; no segundo, a pessoa é que fala muito (pesquise sobre particípio depoente). No entanto, o texto em análise impossibilita a segunda interpretação; logo não há gabarito.