Inicialmente, vamos dar um breve
contexto sobre Controles da Administração Pública. Para tal, vamos utilizar a
classificação ensinada por DI PIETRO (2017) [1]
DI PIETRO (2017, p. 916-917) classifica
as modalidades de controle sob alguns critérios.
Quanto ao órgão que o exerce, o
controle pode ser administrativo, legislativo (parlamentar) ou judicial.
Quanto ao momento em que
se efetua, o controle pode ser prévio, concomitante ou posterior
De acordo com a jurista, o controle
pode ainda ser interno ou externo:
O controle interno seria
aquele cada um dos Poderes exerce sobre seus próprios atos
e agentes;
Já o Controle Externo seria o controle exercido por
um dos Poderes sobre o outro (a professora ainda considera o controle da
Administração direta sobre a Indireta como espécie de Controle Externo).
Consoante os arts. 70 a 74 da CF/88, a carta magna
previu o controle externo, a cargo do Congresso Nacional, com o auxílio
do Tribunal de Contas da União e o controle interno que cada Poder
exercerá sobre seus atos (DI PIETRO, 2017, p. 917).
Frisa-se
ainda que, dada a classificação por DI PIETRO, o Controle Judicial
exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos dos outros Poderes poderia
ser classificado também como uma espécie de Controle Externo.
Todavia, comumente, associamos Controle Externo ao Controle Parlamentar estabelecido na Constituição Federal nos arts. 70 a 75 CF/88.
Vamos então para análise das alternativas.
A) INCORRETA. Para analisar essa assertiva, vamos dividi-la em dois trechos.
"abrange a fiscalização exercida sobre atos e atividades de seus
órgãos":
Nesse caso, como o controle é exercido dentro de órgãos subordinados a um mesmo Poder, consoante art. 70 da CF/88 e classificação de DI PIETRO, estaríamos diante de Controle Interno.
"abrange a fiscalização exercida sobre atos das entidades descentralizadas que lhes sejam
vinculadas".
Nesse caso, professora DI PIETRO considera o controle da Administração direta sobre a
Indireta como espécie de Controle Externo.
Logo, a alternativa está incorreta pelo primeiro trecho analisado.
B) INCORRETA pelo gabarito da Banca (DISCORDO). Pessoal, aqui a banca pegou uma das finalidades do Sistema de Controle Interno de cada Poder, estabelecido no inciso II do art. 74 da CF/88:
Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:
(...)
II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;
(...)
Posto isso, embora a "avaliação da aplicação de recursos públicos por entidades de direito
privado" insira-se em uma das finalidades do Sistema de Controle Interno, entende-se que também compete aos Tribunais de Contas (Controle Externo) exercê-la. Vejamos:
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
(...)
II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;
(...)
IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II;
VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município
Ou seja, se, por exemplo, uma entidade privada recebeu recursos públicos federais, isto atrairia a competência do TCU, independentemente de ser finalidade do Controle Interno.
Frisa-se que o Controle Interno
e Controle Externo exercem suas atribuições constitucionais de maneira independente, podendo,
inclusive, divergirem.
Contudo,
entende-se ser benéfico um certo alinhamento institucional do CI e CE, a fim de
otimizar a fiscalização da aplicação dos recursos públicos, evitando
sobreposição de esforços.
De toda forma, considera-se que essa alternativa está correta, ao contrário do que sinalizou a banca, a qual, possivelmente, utilizou como fundamento para o gabarito a literalidade de uma disposição constitucional sem, contudo, realizar uma interpretação extensiva das atribuições do Controle Externo.
C) INCORRETA. Referindo-se ao Controle Externo exercido pelos Tribunais de Contas (TCs), classificado por Di PIETRO (2017, p. 928) [1] como Controle Legislativo Financeiro, cabe destacar que os Tribunais de Contas podem analisar aspectos dos atos discricionários,
desde que RESPEITADA a discricionariedade administrativa (juízo de conveniência e oportunidade - mérito administrativo), cujos limites
são estabelecidos pela lei [1].
Nesse sentido, não pode o gestor alegar
“discricionariedade" se o ato praticado extrapola a margem
discricionária estabelecida pela lei.
Por outro lado, o Controle Interno pode adentrar nas discussões de mérito administrativo, auxiliando os gestores no processo de tomada de decisão. Além disso, a revogação dos próprios atos administrativos por critérios de conveniência e oportunidade (mérito) decorre do poder de autotutela da Administração Pública.
A alternativa está, portanto, incorreta, pois, em regra, os Tribunais de Contas (CONTROLE EXTERNO) não exercem controle do mérito administrativo.
Nesse sentido, essa avaliação de da conduta da administração sob os prismas de
conveniência e oportunidade estaria mais bem associada ao Controle Interno (especificamente o Controle Administrativo e o poder de autotutela). Segundo COSO I [2], o "controle interno auxilia as entidades a alcançar objetivos importantes e a sustentar e melhorar o seu desempenho" (grifou-se)
Ressalta-se, contudo, que oportunidades de melhorias identificadas em auditorias conduzidas pelos TCs podem ser objeto de recomendação pela Corte de Contas.
Por fim, transcrevem-se abaixo alguns entendimentos jurisprudenciais do Tribunal de Contas da União acerca do controle de atos discricionários:
Acórdão 906/2015-Plenário | Relator: BRUNO DANTAS: O TCU pode proferir determinações não somente nos casos de ocorrência de ilegalidade, como também nos casos de falhas ou impropriedades, inclusive as de ordem operacional (art. 70 da Constituição Federal c/c art. 1º, inciso II, art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992 e art. 250, inciso II, do Regimento Interno do TCU) . Fica no âmbito de discricionariedade do administrador público a escolha da melhor solução a ser adotada para corrigir as falhas verificadas.
Acórdão 1077/2015-Plenário | Relator: AROLDO CEDRAZ: O TCU, no uso de suas competências constitucionais, exerce o controle do poder discricionário da Administração Pública, por meio da proteção e da concretização dos princípios constitucionais e diretrizes legais aplicáveis, bem assim pelo critério da razoabilidade, controlando eventuais omissões, excessos ou insuficiências na atuação dos órgãos e entidades envolvidos.
Acórdão 600/2019-Plenário | Relator: AUGUSTO NARDES: Medidas afetas à discricionariedade do gestor ou que impõem ao órgão público obrigações não previstas na legislação não podem ser objeto de determinação do TCU, e sim de recomendação.
Acórdão 1614/2019-Plenário | Relator: ANA ARRAES: O TCU, ao prolatar decisões que imponham ao administrador público o dever de corrigir ou alterar atos eivados de irregularidades, não deve se imiscuir nos procedimentos que serão adotados pela autoridade competente, sob pena de ferir o princípio da discricionariedade dos atos administrativos, uma vez que o responsável, dentro do seu juízo de conveniência e oportunidade, deve decidir como operar para corrigir tais atos, adotando medidas para resguardar o interesse público
D) CORRETA. Conforme visto acima, o titular do Controle Externo da administração pública é o Poder Legislativo. Ademais, ressaltou-se também que, dada a classificação de controle de DI PIETRO [1], o Controle Judicial
exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos dos outros Poderes poderia
ser classificado também como uma espécie de Controle Externo.
Logo, esta alternativa está correta.
Adicionalmente, dar-se-á uma breve contextualização sobre o controle parlamentar (legislativo),
Em síntese, o controle parlamentar (legislativo) é aquele exercido pelo Poder Legislativo sobre os outros poderes, nas hipóteses previstas pela Constituição Federal. DI PIETRO (2017, p. 928) divide esse controle legislativo em: político e financeiro:
O Controle Legislativo Político abrangeria “aspectos ora de legalidade, ora de mérito, apresentando-se, por isso mesmo, como de natureza política, já que vai apreciar as decisões administrativas sob o aspecto inclusive da discricionariedade, ou seja, da oportunidade e conveniência do interesse público (DI PIETRO, 2017, p. 928).
Já o Controle Legislativo Financeiro, disciplinado pelos artigos 70 a 75 da CF/88, refere-se à fiscalização contábil, financeira e orçamentária exercida, no caso da União, pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União.
Além disso, a doutrina costumar chamar de Controle Legislativo Direto aquele exercido diretamente pelo Poder legislativo e Controle Legislativo Indireto, aquele exercido com auxílio dos Tribunais de Contas
E) INCORRETA. Conforme caput do art. 70 da CF/88 e classificação dada por DI PIETRO, essa alternativa refere-se ao exercício do Controle Interno.
GABARITO DA BANCA: D
GABARITO DO PROFESSOR: QUESTÃO DEVERIA SER ANULADA, POIS AS LETRAS B E D ESTÃO CORRETAS.
DICA:
Como não dá para prever o julgamento da Banca acerca de possíveis recursos de anulação, o candidato deverá procurar a alternativa que melhor representa o "espírito da questão" cobrada pela banca.
Nesse caso específico, a banca espera que o candidato saiba classificar os tipos de controle da administração como Interno e Externo e suas principais atribuições.
Logo, comparando as alternativas B e D, a letra D é a que melhor responde "tal espírito", haja vista trazer o Controle Parlamentar Direto, Controle Parlamentar Indireto e Controle Judicial como exemplos de Controle Externo, sem a necessidade de uma interpretação extensiva.
REFERÊNCIAS: [1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito
administrativo. 30.ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2017; [2]
Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (COSO). Controle
Interno - Estrutura Integrada - Sumário Executivo. 2013 . Tradução de 2018
feita pela PwC Brasil.