SóProvas


ID
3114097
Banca
FCC
Órgão
SANASA Campinas
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

      De cedo, aprendi a subir ladeira e a pegar bonde andando. Posso dizer, com humildade orgulhosa, que tive morros e bondes no meu tempo de menino.

      Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada. Que tinha esse nome a propósito: lá pelos altos do Jaguaré, quando fazia muito frio, no morro costumava gear. Tínhamos um par de sapatos para o domingo. Só. A semana tocada de tamancos ou de pés no chão.

      Não há lembrança que me chegue sem os gostos. Será difícil esquecer, lá no morro, o gosto de fel de chá para os rins, chá de carqueja empurrado goela abaixo pelas mãos de minha bisavó Júlia. Havia pobreza, marcada. Mas se o chá de carqueja me descia brabo pela goela, como me é difícil esquecer o gosto bom do leite quente na caneca esmaltada estirada, amorosamente, também no morro da Geada, pelas mãos de minha avó Nair.

      A miséria não substituíra a pobreza. E lá no morro da Geada, além do futebol e do jogo de malha, a gente criava de um tudo. Havia galinha, cabrito, porco, marreco, passarinho, e a natureza criava rolinha, corruíra, papa-capim, andorinha, quanto. Tudo ali nos Jaguarés, no morro da Geada, sem água encanada, com luz só recente, sem televisão, sem aparelho de som e sem inflação.

      Nenhum de nós sabia dizer a palavra solidariedade. Mas, na casa do tio Otacílio, criavam-se até filhos dos outros, e estou certo que o nosso coração era simples, espichado e melhor. Não desandávamos a reclamar da vida, não nos hostilizávamos feito possessos, tocávamos a pé pra baixo e pra cima e, quando um se encontrava com o outro, a gente não dizia: “Oi!”. A gente se saudava, largo e profundo: − Ô, batuta*!

*batuta: amigo, camarada.

(Texto adaptado. João Antônio. Meus tempos de menino. In: WERNEK, Humberto (org.). Boa companhia: crônicas. São Paulo, Companhia das Letras, 2005, p. 141-143) 

No segmento ... morros pobres, como o da Geada. Que tinha esse nome a propósito: lá pelos altos do Jaguaré, quando fazia muito frio, no morro costumava gear (2° parágrafo), o sinal de dois-pontos introduz

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA C

    ? Nossa pobreza não era envergonhada. Ainda não fora substituída pela miséria nos morros pobres, como o da Geada. Que tinha esse nome a propósito: lá pelos altos do Jaguaré, quando fazia muito frio, no morro costumava gear.

    ? Os dois pontos dão início a uma explicação, a um esclarecimento acerca do porquê do morro ter o nome de Geada.

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  • Essa é uma questão sobre pontuação e também sobre interpretação de texto. Isso porque pede-se que se esclareça o que o trecho que vem depois dos dois-pontos indica. Dessa forma, é preciso esclarecer que os dois-pontos normalmente introduzem uma enumeração de fatores relacionados, uma citação, uma fala em discurso direto, uma explicação ou esclarecimento a respeito de algo etc.

     Partindo para o texto, percebemos que o período em que os dois-pontos aparecem vem logo depois de um em que é citado o morro da Geada. Então, o autor, como que prevendo uma possível dúvida que possa surgir no leitor acerca da razão de o morro ter aquele nome, resolve esclarecer o motivo, explicando que, na região mais alta do Jaguaré, em tempos mais frios, a região costumava gear (ou seja, ser tomado de geada, que é uma espécie de orvalho congelado pela baixa temperatura). Ora, levando em consideração essa interpretação, pode-se concluir que o sinal de dois-pontos introduz um esclarecimento acerca do nome do morro da Geada, o que significa que a opção C é a correta.

    Gabarito do Professor: Letra C.