A
presente questão trata de
tema afeto aos contratos administrativos, em
especial, a possibilidade ou não de sua convalidação diante de vício no
elemento competência
.
Em linhas gerais, a Administração
Pública, por meio de seus agentes, deve exteriorizar a sua vontade para
desempenhar as atividades administrativas e atender o interesse público. A
manifestação de vontade administrativa pode ser unilateral (atos
administrativos), bilateral (contratos da Administração) ou plurilateral (consórcios
e convênios). A expressão “contratos da Administração" é o gênero que comporta
todo e qualquer ajuste bilateral celebrado pela Administração Pública.
São
duas as espécies de contratos da Administração
:
a) Contratos administrativos:
são os ajustes celebrados entre a Administração Pública e o particular, regidos
predominantemente pelo direito público, para execução de atividades de interesse
público. É natural, aqui, a presença das cláusulas exorbitantes (art. 58 da Lei
8.666/1993) que conferem superioridade à Administração em detrimento do
particular, independentemente de previsão contratual.
As características
básicas dos contratos administrativos são
:
(i) verticalidade: desequilíbrio
contratual em favor da Administração, tendo em vista a presença das cláusulas
exorbitantes; e
(ii) regime predominantemente de direito
público, aplicando-se, supletivamente, as normas de direito privado.
b) Contratos privados da
Administração ou contratos semipúblicos
: são os ajustes em que a
Administração Pública e o particular estão em situação de relativa igualdade,
regidos predominantemente pelo direito privado. Frise-se que o art. 62, § 3.º,
I, da Lei 8.666/1993 admite a aplicação das cláusulas exorbitantes, “no que couber",
aos contratos privados da Administração. É evidente, todavia, que as cláusulas
exorbitantes desnaturariam esses contratos, aproximando-os dos contratos administrativos
típicos, razão pela qual a presença dessas cláusulas nos contratos privados
depende da vontade das partes e a sua aplicação está condicionada à expressa
previsão contratual.
As características
básicas dos contratos privados da Administração são
:
(i) horizontalidade: equilíbrio
contratual relativo, em razão da ausência, em regra, das cláusulas
exorbitantes; e
(ii) regime predominantemente de direito
privado, devendo ser observadas, no entanto, algumas normas de direito público
(ex.: licitação, cláusulas necessárias etc.).
Após essa breve introdução sobre o tema,
passemos a analisar cada uma das alternativas apresentadas pela banca:
A
–
ERRADA – como exposto na letra C, é possível que a
administração pública anule o contrato viciado ou convalide-o, não havendo obrigatoriedade,
como supõe a afirmação, de que seja instaurado procedimento administrativo para
regularização do vínculo.
Assim,
incorreta a assertiva.
B
–
ERRADA – um dos elementos essenciais dos atos administrativos é
a competência, nos termos da lei 4.717/65. Vejamos:
“Art.
2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo
anterior, nos casos de:
a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do
objeto;
d) inexistência dos
motivos;
e) desvio de
finalidade.
Parágrafo único. Para a
conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:
a)
a
incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições
legais do agente que o praticou".
Ademais,
importante mencionar que a lei 9.784/99 admite a delegação de um ato administrativo.
Vejamos:
“Art. 12. Um órgão
administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar
parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe
sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de
circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial.
Parágrafo
único. O disposto no caput deste artigo aplica-se à delegação de
competência dos órgãos colegiados aos respectivos presidentes.
Art. 13. Não podem ser objeto de delegação:
I - a
edição de atos de caráter normativo;
II - a
decisão de recursos administrativos;
III -
as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade".
Deste
modo,
mostra-se incorreta a letra B, já que a competência, seja
ela originária ou delegada, é elemento essencial dos atos administrativos.
C
–
CERTA – a doutrina administrativista majoritária admite, ao lado
dos atos administrativos nulos, eivados de vícios insanáveis, a existência dos
atos administrativos anuláveis, portadores de vícios sanáveis.
Os
atos anuláveis são exatamente os que podem ser objeto de convalidação (ou
saneamento), dependendo das circunstâncias e do juízo de oportunidade e conveniência
privativo da administração pública.
Portanto,
convalidar um ato é corrigi-lo, regularizá-lo, desde a origem (ex tunc), de tal
sorte que: a) os efeitos já produzidos passem a ser considerados efeitos
válidos, não passíveis de desconstituição; e b) esse ato permaneça no mundo
jurídico como um ato válido, apto a produzir efeitos regulares.
Na
esfera federal, a lei 9.784/99, dispõe no art. 55 que:
“Art.
55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público
nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão
ser convalidados pela própria Administração".
Assim,
admite-se a convalidação de um ato que: a) apresente defeito sanável; b) não acarrete
lesão ao interesse público; c) não acarrete prejuízo a terceiros; d) decisão discricionária
da administração acerca da conveniência e oportunidade de convalidar o ato (em
vez de anulá-lo).
A
doutrina administrativista permite a convalidação dos defeitos sanáveis
concernentes
:
a)
Vício relativo à competência quanto à pessoa (não
quanto à matéria), desde que não se trate de competência exclusiva
;
b)
Vício
de forma, desde que a lei não considere a forma elemento essencial à validade
daquele ato.
O
ato administrativo de convalidação tem efeitos ex tunc, retroagindo seus efeitos
ao momento em que foi originariamente praticado o ato convalidado.
A
convalidação pode recair sobre atos vinculados ou discricionários, uma vez que não
se trata de controle de mérito, e sim de controle de legalidade, relativo a
vícios sanáveis verificados nos elementos competência e forma.
Pelo
exposto,
correta a letra C, já que o vício existente no
contrato foi no elemento competência, sendo permitida a sua convalidação, a critério
da administração pública
.
D
–
ERRADA – inexiste na legislação pátria qualquer determinação
neste sentido, enquadrando-se o presente caso na hipótese de convalidação do
vínculo por vício sanável no elemento competência, conforme exposto acima.
Assim,
incorreta a assertiva.
E
–
ERRADA – a revogação é a retirada, do mundo jurídico, de um ato
válido, mas que, segundo critério discricionário da administração, tornou-se
inoportuno ou inconveniente.
Assim,
não se adequa ao caso ora analisado, já que o contrato administrativo foi
assinado por funcionário incompetente, existindo, de fato, um vício na
celebração do instrumento, sendo cabível ou a sua anulação ou a sua
convalidação, conforme exposto na letra C.
Deste
modo,
incorreta a afirmação.
Gabarito da banca e do
professor
:
letra C
(Oliveira,
Rafael Carvalho Rezende. Curso de direito administrativo / Rafael Carvalho
Rezende Oliveira. – 8. ed. – Rio de Janeiro: Método, 2020)
(Direito
administrativo descomplicado / Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. – 26. ed. –
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018)