SóProvas


ID
3474148
Banca
INSTITUTO AOCP
Órgão
IBGE
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

TEXTO II

[4 de novembro de 1855]

Desejava dirigir uma pergunta aos meus leitores.

Mas uma pergunta é uma coisa que não se pode fazer sem um ponto de interrogação.

Ora, eu tenho uma birra muito séria a esta figurinha de ortografia, a esta espécie de corcundinha que parece estar sempre chasqueando e zombando da gente.

Com efeito, o que é um ponto de interrogação?

Se fizerdes esta pergunta a um gramático, ele vos atordoará os ouvidos durante uma hora com uma dissertação de arrepiar os cabelos.

Entretanto, não há coisa mais simples de definir do que um ponto de interrogação; basta olhar-lhe para a cara.

Vede: ?

É um pequeno anzol.

Ora, para que serve o anzol?

Para pescar.

Portanto, bem definido, o ponto de interrogação é uma parte da oração que serve para pescar.

Exemplo:

1º Quereis pescar um segredo que o vosso amigo vos oculta, e que desejais saber; deitais o anzol disfarçadamente com a ponta da língua:

– Meu amigo, será verdade o que me disseram, que andas apaixonado?

2º Quereis pescar na algibeira de algum sujeito uma centena de mil réis; preparais o cordel e lançais o anzol de repente:

– O Sr. pode emprestar-me uns duzentos mil réis aí?

3º Quereis pescar algum peixe ou peixãozinho: requebrais os olhos, adoçai a voz, e, por fim, deitais o anzol:

– Uma só palavra: tu me amas?

É preciso, porém, que se advirta numa coisa. O ponto de interrogação é um anzol, e por conseguinte serve para pescar; mas tudo depende da isca que se lhe deita.

Nenhum pescador atira à água o seu anzol sem isca; ninguém portanto diz pura e simplesmente:

– Empresta-me trezentos mil réis?

Não; é preciso que o anzol leve isca e que esta isca seja daquelas que o peixe que se quer pescar goste de engolir. 

Alguns pescadores costumam deitar um pouco de mel, e outros seguem o sistema dos índios que metiam dentro d’água certa erva que embebedava os peixes.

Assim, ou dizem:

– Meu amigo, o senhor, que é o pai dos pobres, (isca) empresta-me trezentos mil réis? (anzol).

Ou então empregam o segundo meio:

– Será possível que o benfeitor da humanidade, o homem que todos apregoam como a generosidade personificada, que o cidadão mais popular e mais estimado desta terra, que o negociante que revolve todos os dias um aluvião de bilhetes do banco, me recuse a miserável quantia de trezentos mil réis?

No meio do discurso, já o homem está tonto de tanto elogio, de maneira que, quando o outro lhe lança o anzol, é, com certeza, de trazer o peixe.

Ainda tinha muita coisa a dizer sobre esta arte de pescar na sociedade, arte que tem chegado a um aperfeiçoamento miraculoso. Fica para outra ocasião.

Por ora basta que saibam os meus leitores que o ponto de interrogação é um verdadeiro anzol.

O caniço desta espécie de anzol é a língua, e o fio ou cordel a palavra; fio elástico como não há outro no mundo. […]

Adaptado de: ALENCAR, José de. Ao correr da pena. Edição preparada por João Roberto Faria. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

Considere as pontuações dos trechos dados e assinale a alternativa INCORRETA.

Alternativas
Comentários
  • Gabarito: E

    ✓ Em “[...] requebrais os olhos, adoçai a voz, e, por fim, deitais o anzol [...]”, a vírgula antes do “e” justifica-se por haver mudança de sujeito sintático entre as orações presentes no período.

    ➥ INCORRETO. O sujeito continua sendo oculto/elíptico (2ª pessoa do plural: vós). 

    ➥ FORÇA, GUERREIROS(AS)!!

  • A vírgula na alternativa B está adequada... ou estou errado?

  • Na letra A não seria " ZEUGMA" ( Omissão de um termo JÁ dito anteriormente)

  • TRIPLO GABARITO

    Deve-se atentar às alternativas A e D.

    Na A, a vírgula indicando a elipse do verbo é opcional, segundo o consagrado gramático Celso Pedro Luft, que foi o revisor do Manual de Redação Oficial da Presidência da República. Nas palavras dele (A Vírgula: considerações sobre o seu ensino e o seu emprego. 2ª edição. 2002. Editora Ática. São Paulo. 87 páginas. ISBN 8508061382. Paginas 25-6):

    "Vírgula e verbo subentendido

    Observe a pontuação destas frases:

    (1) O pai se chamava Rodrigo Bastos: a mãe, Ana da Silva.

    (1a) O pai se chamava Rodrigo Bastos, a mãe Ana da Silva.

    Foram alternativas de questão de vestibular. Lá se mandava "selecionar a opção que corresponde ao período de pontuação correta".

    Não faço ideia de como se decidiram os candidatos, pois as duas pontuações são corretas. Mais econômica a forma (1a). O gabarito oficial deu a alternativa da forma (1).

    Questão a anular. Ou atribuir ponto também aos que assinalaram a opção (1a).

    Bem sei que as nossas gramáticas - e as apostilas por aí, via cópia... - dão essa vírgula como regra: vírgula quando há elipse ["indicar a supressão de uma palavra (geralmente o verbo) ou de um grupo de palavras" - Celso Cunha; "para marcar a supressão do verbo" - Rocha Lima].

    Regra artificial, apenas parcialmente confirmada na prática dos bons escritores. Isso é caso de vírgula facultativa. Só obrigatória em casos de ambiguidade [...]".

    Como há discórdia entre os especialistas, a alternativa é nula.

    Na D, o sujeito não é oracional. Sujeito oracional é o sujeito expresso por uma oração, algo ausente aí - o sujeito é ninguém; por definição uma oração precisa ter verbo -. Como a condição imposta pela alternativa é falsa, ela está incorreta e também serve como gabarito.

    Está provado, portanto, que a questão é nula.

  • CUIDADO

    A questão possui problemas, bem como comentários incorretos. O comentário mais curtido apenas justifica o gabarito e não analisa as demais assertivas.

    A)Em “O caniço desta espécie de anzol é a língua, e o fio ou cordel a palavra [...]”, falta uma vírgula para indicar elipse do verbo “é”.

    Correto. É consenso quando falamos em norma culta que a elipse do verbo deve ser sempre marcada por vírgula, de modo que a correta grafia seria: "e o fio ou cordel, a palavra".

    Orlando Guimarães, tu insistes em utilizar posições minoritárias para justificar posições não ortodoxas. Não podemos abandonar o consenso em detrimento de um gramático, assim fosse não haveria regra sedimentada na língua portuguesa. A assertiva é correta.

    B)Em “1º Quereis pescar um segredo que o vosso amigo vos oculta, e que desejais saber […]”, a vírgula antes do “e” está inadequada, visto que separa orações que se coordenam por adição.

    Incorreta. Embora de fato tenhamos uma oração coordenada sindética aditiva separada por virgula, a oração que a antecede é uma subordinada adjetiva restritiva com sujeito diferente das demais. O uso da virgula é defensável como modo de evitar ambiguidades dentro da construção, não sendo de todo inadequada.

    C)Em “O ponto de interrogação é um anzol, e por conseguinte serve para pescar [...]”, a vírgula deveria estar após o “e”, assim como ser utilizada após “conseguinte”, pois o sujeito dos dois verbos da oração é o mesmo, além de a expressão consecutiva ficar isolada por vírgulas.

    Correta. A proposta da assertiva é valida.

    D)Em “[…] ninguém portanto diz pura e simplesmente [...]”, a conjunção conclusiva deve ser isolada por vírgulas, pois encontra-se intercalada, após o sujeito oracional.

    Incorreta. Embora a assertiva esteja correta ao afirmar que a conjunção conclusiva deveria ser isolada, o sujeito do trecho (ninguém) não é oracional, o que a torna inválida.

    E)Em “[...] requebrais os olhos, adoçai a voz, e, por fim, deitais o anzol [...]”, a vírgula antes do “e” justifica-se por haver mudança de sujeito sintático entre as orações presentes no período.

    Incorreta. O sujeito é o mesmo nas três ações verbais da passagem.

    Possuímos três alternativas incorretas. A questão é nula.

  • Não adianta copiar o gabarito e colar aqui nos comentários. Se quer curtida vai pro instagram...

  • Ivan Lucas havia dito aqui que eu insistia em querer anular o gabarito me baseando na opinião de um único gramático. Pois bem. Transcrevo agora a opinião de MAIS UM gramático que diz ser opcional a vírgula no zeugma. Eis Napoleão Mendes de Almeida (Gramática Metódica da Língua Portuguesa, § 783):

    "A vírgula, quando não traz perigo de confusão, é usualmente empregada para indicar o zeugma do verbo: [...]

    Quando outras vírgulas já houver em partes de um período que encerrem zeugma, coloca-se ponto e vírgula entre essas partes, para maior clareza: [...]

    Quando, ao contrário, curtas e já separadas por vírgula forem as partes de um período nas quais há zeugma, desnecessário se tornará esse ponto e vírgula e também desnecessária a vírgula indicativa do zeugma: [negrito meu] "Seus movimentos eram rápidos, o olhar perscrutador, o ouvido atilado"".

  • Orlando Guimarães

    Como já disse, bloquear-me não me impede de visualizar teus comentários. Fazer isso com intuito de poder citar meu nome, sem direito de resposta, é, no mínimo, má-fé.

    Quanto ao uso de vírgula para indicar a elipse de verbos, teu posicionamento segue equivocado e baseado em má interpretação de doutrina gramatical.

    A questão Q1392876 não questiona a correção da pontuação do período, mas apenas a acentuação dos termos que lá se encontram grifados.

    Abraços.

  • Veja como é escrito o zeugma (sem vírgula!) na Q1392876

  • Ivan Lucas tua linguagem é rebuscada ó varão

  • Se possível, façam comentários mais sucintos, visto que não são todos que podem ou têm acesso ao gramático "a" ou "b".

  • Gosto da humildade do examinador Chicó, ele não consegue se ater apenas nas suas psicodelias interpretativas, ele precisa inovar gramaticalmente. O bom é que ele não deve explicações para ninguém, faz o que bem entende e ainda ri da nossa cara.