SóProvas


ID
3720049
Banca
INSTITUTO AOCP
Órgão
UFRB
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A cidade caminhava devagar
Henrique Fendrich

    Então você que é o Henrique? Ah, mas é uma criança ainda. Meu filho fala muito de você, ele lê o que você escreve. Mas sente-se! Você gosta de ouvir sobre essas coisas de antigamente, não é? Caso raro, menino. A gente já não tem mais com quem falar, a não ser com os outros velhos. Só que os velhos vão morrendo, e com eles vão morrendo as histórias que eles tinham para contar. Olha, do meu tempo já são poucos por aqui. Da minha família mesmo, eu sou o último, não tenho mais irmão, cunhado, nada. Só na semana passada eu fui a dois enterros. Um foi o do velho Bubi. Esse você não deve ter conhecido. Era alfaiate, foi casado com uma prima minha. E a gente vai a esses enterros e fica pensando que dali a pouco pode ser a nossa vez. Mas faz parte, não é? É assim que a vida funciona e a gente só pode aceitar. 
    Agora, muita coisa mudou também. A cidade já é outra, nem se compara com a da minha época. As coisas caminhavam mais devagar naquele tempo. Hoje é essa correria toda, ninguém mais consegue sossegar. Mudou muita coisa, muitos costumes que a gente tinha foram ficando para trás. Olha, é preciso que se diga também que havia mais respeito. Eu vejo pelos meus próprios netos, quanta diferença no jeito que eles tratam os pais deles! Se deixar, são eles que governam a casa. Consegue ver aquele quadro ali na parede? Papai e mamãe… Eu ainda tinha que pedir bênção a eles. A gente fazia as refeições juntos todos os dias, e sempre no mesmo horário. Hoje é cada um para um lado, uma coisa estranha, sabe? Parece que as coisas mudam e a gente não se adapta. E vai a gente tentar falar algo… Ninguém ouve, olham para você como se tivessem muita pena da sua velhice.
    Aqui para cima tem um colégio. Cinco horas da tarde, eles saem em bando. A gente até evita estar na rua nesse horário. Por que você pensa que eles se preocupam com a gente? Só falta eles nos derrubarem, de tão rápido que eles andam. As calçadas são estreitas e, se a gente encontrar uma turma caminhando na nossa direção, quem você acha que precisa descer, eles ou nós, os velhos? É a gente… Nem parece que um dia eles também vão ficar velhos como a gente. A verdade é que as pessoas estão se afastando, não estão se importando mais umas com as outras. Nem os vizinhos a gente conhece mais. Faz mais de um mês que chegou vizinho novo na casa que era do Seu Erico e até agora a gente não sabe quem é que foi morar lá. A Isolda veio com umas histórias de a gente ir lá fazer amizade, mas eu falei para ela que essa gente vive em outro mundo, outros valores, e é capaz até de pensarem mal da gente se a gente for lá.
    Mas você deve achar que eu só sei reclamar, não é? Tem coisa boa também, claro que tem. Hoje as pessoas já não sofrem como na nossa época. Ali faltava tudo, a gente não tinha nem igreja para ir no domingo, imagine só. O padre aparecia uma vez a cada dois meses e olhe lá. E viajar para o centro? Só de carroça, e não tinha asfalto, não tinha nada. Se chovia, a estrada virava um lamaçal e a gente tinha que voltar. Isso mudou, hoje está melhor. Hoje tem todas essas tecnologias aí, é mais fácil tratar doença também. Olha, se eu vivesse no tempo do meu pai, acho que não teria chegado tão longe assim, porque ali não tinha os remédios que eles precisavam, né? Só que também tem essa questão da segurança, que hoje a gente não tem quase nenhuma. A gente tem até medo que alguém entre aqui em casa. São dois velhos, o que a gente vai poder fazer contra o ladrão?
    Mas vamos sentar e tomar um café, a Isolda já preparou. Tem cuque, lá da festa da igreja. Se você viesse ontem, teria encontrado meu filho, ele quem trouxe. Depois quero te mostrar o álbum de fotos do papai. Está meio gasto, as fotos estão amarelas… Mas é normal, né? São coisas de outro tempo. Do tempo em que a cidade caminhava mais devagar.

Adaptado de: <http://www.aescotilha.com.br/cronicas/henrique-fendrich/a-cidade-caminhava-devagar>  . Acesso em: 28 jun. 2019.

A respeito das formas dos verbos, informe se é verdadeiro (V) ou falso (F) o que se afirma a seguir e assinale a alternativa com a sequência correta.


( ) Em “E a gente vai a esses enterros e fica pensando que dali a pouco pode ser a nossa vez.”, a palavra “pensando” descreve uma ação que se estende em determinado período de tempo, mas, nesse contexto, ela indica o modo como é realizada a ação.

( ) Em “Você gosta de ouvir sobre essas coisas de antigamente, não é?”, a palavra “ouvir” descreve o significado principal do verbo.

( ) Em “Olha, se eu vivesse no tempo do meu pai, acho que não teria chegado tão longe assim, porque ali não tinha os remédios que eles precisavam, né?”, a forma que indica que a ação de chegar está concluída, no caso, “chegado”, está correta. O uso da forma “chego”, nessa oração, estaria menos adequado em um contexto de linguagem formal.

Alternativas
Comentários
  • Gabarito: A

    (F) Em “E a gente vai a esses enterros e fica pensando que dali a pouco pode ser a nossa vez.”, a palavra “pensando” descreve uma ação que se estende em determinado período de tempo, mas, nesse contexto, ela indica o modo como é realizada a ação.

    ➥ O verbo está no gerúndio (=ndo). Gerúndio é a forma nominal do verbo que indica continuidade, não indica modo.

    ➥ FORÇA, GUERREIROS(AS)!!

  • • O particípio regular, que é terminado em –do, é conjugado com os verbos “ter” e “haver”.

    • O particípio irregular é conjugado com os verbos “ser/estar”. 

    -A 3º alternativa está correta, pois o verbo “ter" força o particípio regular do verbo chegar(chegado).com isso, fica inapropriado a utilização da da forma verbal "chego" na oração.

    -espero ter ajudado,pessoal!! 

     

     

  • maravilhosa explicação do arthur carvalho.........

  • Achei que a segunda alternativa era falsa por entender que o "ouvir" foi empregado no sentido de "conhecer" as histórias e situações do passado.

  • Formas nominais : infinitivo , particípio e gerúndio. ( F )

  • Só complementando, a segunda assertiva,

    “Você gosta de ouvir sobre essas coisas de antigamente, não é?”, a palavra “ouvir” descreve o significado principal do verbo."

    se formos analisar, apenas a frase, de fato, poderá haver uma interpretação no sentido de saber ou interessar.

    Mas se analisarmos o contexto a qual está inserida, poderemos notar que se trata no sentido de ouvir histórias.

    "Meu filho fala muito de você, ele lê o que você escreve. Mas sente-se! Você gosta de ouvir sobre essas coisas de antigamente, não é? Caso raro, menino. A gente já não tem mais com quem falar, a não ser com os outros velhos.

  • Formas nominais do verbo: 

    Particípio - do - ido - pode funcionar como substantivos ou adjetivos 

    Ex: Os montantes investidos foram bons. 

    Gerúndio - ndo - pode funcionar como advérbio dependendo do caso.

    Ex: ela saiu de casa chorando. = O modo que ela saiu foi chorando

    Infinitivo - r - expressa um processo verbal sem indicação de tempo, como, por exemplo, falar, vender e partir. Exemplos esses que integram o chamado infinitivo impessoal, dado o seu aspecto de apenas representar uma ação.

  • Gabarito A

    O particípio regular (ADO, IDO) com os verbos "ter" e "haver" .

    O particípio irregular com os verbos "ser"/"estar" .

  • Complementação:

    O verbo CHEGAR só apresenta uma forma para o particípio, que é a forma regular CHEGADO.

    A forma verbal CHEGO só existe no presente do indicativo:

    “Eu nunca chego atrasado.”

    É inaceitável, na linguagem formal, o uso de CHEGO como particípio.

  • O uso da forma “chego”, nessa oração, estaria menos adequado em um contexto de linguagem formal.

    Achei que fosse falso porque não é menos adequado, é inadequado mesmo.

  • Verbos do tempo composto ( Ter ou Haver ) devem ser escritos de forma '' alongada '' ex: Tinha entregado.

    Verbos da locução verbal ( Ser ou Estar ) devem ser escritos de forma '' reduzida '' ex : está entregue.

  • QUE QUESTÃO DE M&RDA!