- ID
- 4123708
- Banca
- IDECAN
- Órgão
- Prefeitura de Apiacá - ES
- Ano
- 2016
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Educação: reprovada
Há quem diga que sou otimista demais. Há quem diga que sou pessimista. Talvez eu tente apenas ser uma pessoa
observadora habitante deste planeta, deste país. Uma colunista com temas repetidos, ah, sim, os que me impactam
mais, os que me preocupam mais, às vezes os que me encantam particularmente. Uma das grandes preocupações de
qualquer ser pensante por aqui é a educação. Fala-se muito, grita-se muito, escreve-se, haja teorias e reclamações.
Ação? Muito pouca, que eu perceba. Os males foram-se acumulando de tal jeito que é difícil reorganizar o caos.
Há coisa de trinta anos, eu ainda professora universitária, recebíamos as primeiras levas de alunos saídos de escolas
enfraquecidas pelas providências negativas: tiraram um ano de estudo da meninada, tiraram latim, tiraram francês,
foram tirando a seriedade, o trabalho: era a moda do “aprender brincando”. Nada de esforço, punição nem pensar,
portanto recompensas perderam o sentido. Contaram-me recentemente que em muitas escolas não se deve mais falar
em “reprovação, reprovado”, pois isso pode traumatizar o aluno, marcá-lo desfavoravelmente. Então, por que estudar,
por que lutar, por que tentar?
De todos os modos facilitamos a vida dos estudantes, deixando-os cada vez mais despreparados para a vida e o
mercado de trabalho. Empresas reclamam da dificuldade de encontrar mão de obra qualificada, médicos e advogados
quase não sabem escrever, alunos de universidades têm problemas para articular o pensamento, para argumentar, para
escrever o que pensam. São, de certa forma, analfabetos. Aliás, o analfabetismo devasta este país. Não é alfabetizado
quem sabe assinar o nome, mas quem o sabe assinar embaixo de um texto que leu e entendeu. Portanto, a
porcentagem de alfabetizados é incrivelmente baixa.
Agora sai na imprensa um relatório alarmante. Metade das crianças brasileiras na terceira série do elementar não
sabe ler nem escrever. Não entende para o que serve a pontuação num texto. Não sabe ler horas e minutos num relógio,
não sabe que centímetro é uma medida de comprimento. Quase a metade dos mais adiantados escreve mal, lê mal,
quase 60% têm dificuldades graves com números. Grande contingente de jovens chega às universidades sem saber
redigir um texto simples, pois não sabem pensar, muito menos expressar-se por escrito. Parafraseando um especialista,
estamos produzindo estudantes analfabetos.
Naturalmente, a boa ou razoável escolarização é muito maior em escolas particulares: professores menos mal
pagos, instalações melhores, algum livro na biblioteca, crianças mais bem alimentadas e saudáveis – pois o estado não
cumpre o seu papel de garantir a todo cidadão (especialmente a criança) a necessária condição de saúde, moradia e
alimentação.
Faxinar a miséria, louvável desejo da nossa presidenta, é essencial para nossa dignidade. Faxinar a ignorância – que
é uma outra forma de miséria – exigiria que nos orçamentos da União e dos estados a educação, como a saúde, tivesse
uma posição privilegiada. Não há dinheiro, dizem. Mas políticos aumentam seus salários de maneira vergonhosa, a coisa
pública gasta nem se sabe direito onde, enquanto preparamos gerações de ignorantes, criados sem limites, nada lhes é
exigido, devem aprender brincando. Não lhes impuseram a mais elementar disciplina, como se não soubéssemos que
escola, família, a vida, sobretudo, se constroem em parte de erro e acerto, e esforço. Mas, se não podemos reprovar os
alunos, se não temos mesas e cadeiras confortáveis e teto sólido sobre nossa cabeça nas salas de aula, como exigir
aplicação, esforço, disciplina e limites, para o natural crescimento de cada um?
Cansei de falas grandiloquentes sobre educação, enquanto não se faz quase nada. Falar já gastou, já cansou, já
desiludiu, já perdeu a graça. Precisamos de atos e fatos, orçamentos em que educação e saúde (para poder ir a escola,
prestar atenção, estudar, render e crescer) tenham um peso considerável: fora isso, não haverá solução. A educação
brasileira continuará, como agora, escandalosamente reprovada.
(Lya Luft. Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/educacao-reprovada-um-artigo-de-lya-luft/.)
De acordo com o contexto, assinale a alternativa cuja palavra sublinhada apresenta o significado INCORRETO.