SóProvas


ID
4833535
Banca
CEV-URCA
Órgão
Prefeitura de Brejo Santo - CE
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A paranoia está batendo

(artigo de Arnaldo Jabor; By admin | Abril, 2013) 


    Um dia, há muitos anos, percebi que haviam modificado a caixa grande dos Chicletes Adams (uma cor-de-rosa e outra amarela). Quem se lembra dessas saudosas embalagens? Eram caixas maiores, que tinham uma janelinha de celofane, através da qual se viam os chicletinhos chacoalhando. Assustado, notei que a janela original fora trocada por uma mentirosa abertura, desenhada com os chicletinhos impressos. Algum executivo zeloso, para fazer bonito junto aos patrões, acabara com a visão real das balinhas frescas como a brisa, deixando-nos somente um simulacro. Isso me preocupou. Entendi que se iniciava uma época comercial menos humana (talvez a pós-modernidade), mas, por outro lado, compreendi que detalhes ínfimos podem ser indícios de momentos históricos. Por isso, como vivemos a época de encrencas insolúveis, sem um futuro claro, me ligo em bobagens iluminadoras do presente.

    Por exemplo, que significa a resposta de uma telefonista, se eu lhe agradeço por uma informação e ela replica: “Imagina!…”. Que quer dizer isso? Talvez denote que eu e ela fazemos parte de um “sistema” coletivo de obrigações automáticas, sem espaço para gentilezas individuais e gratidão desnecessária. É quase uma repreensão, como se meu ‘muito obrigado’ quebrasse a lógica contínua de seu serviço. Daí a resposta: “Imagina! O senhor se acha especial?”. Aliás, “senhor” é uma novidade. Dizia-se sempre “Sr. Fulano, Sr. Sicrano…”.

   Tudo bem, mas agora usam um “senhor” no fim da frase: “Estaremos entregando a encomenda, senhor”… Ou “senhorita”. Alguém já ouviu “senhorita” no dia a dia? Isso deve ser influência do gerúndio na dublagem de filmes americanos: “Miss Williams, we’ll be sending your package soon”. Seria a nefasta influência do imperialismo cultural (esquerda) ou o crescimento de uma linguagem global (liberais). As telefonistas também dizem: “Quem deseja?” ou “O senhor Fulano não se encontra…”. Isso me desorganiza. Tenho ganas de dizer: “Todos desejam, o ser humano deseja! E o senhor Fulano não ‘se encontra’, como? Ele está em crise, perdidaço na vida?”. Nada digo, porque ela responderia: “Eu não saberia lhe informar, senhor…”. 

 Outro fenômeno moderno, ou melhor, “contemporâneo” (aliás, não aguento mais esta palavra ‘contemporâneo’, que tudo absolve e tudo explica: “Isso é uma merda, mas é supercontemporâneo!…”), é o tom dos falantes no celular. Em aeroportos, é comum mulheres discutindo a relação com o marido, falando alto, andando pela sala, até chorando, na linguagem ‘metapsicológica’ dos Big Brothers. Criou-se uma língua BBB, feita de súbitas lágrimas, acusações e queixumes, rancor dosado por perdões simultâneos, deixando escapar propositais intimidades, pontuadas por rápidas olhadas para conferir a reação dos circunstantes. Aliás, por falar em celular, e as musiquinhas? Jingle Bells ou Pour Elise tocam no bolso de um executivo, que imediatamente faz um resumo da situação da empresa aos berros. Por que não fazem um celular que aperte o saco do usuário? Ele daria um grito e gemeria discretamente: “Alô?”.

  E os dedinhos “contemporâneos” que não param nos blackberries e iPhones, com as cabeças baixas, digitando mensagens misteriosas? Isso me traz uma dolorosa solidão, pois ninguém mais presta atenção em ninguém ‘ao vivo’, como se o importante é o que não está ali, o desejo ‘não se encontra’ aqui, mas acolá, talvez na ‘nuvem’. E as notícias? São eivadas de incertezas – se a Grécia quebra ou não quebra – ou de certezas impossíveis como, por exemplo: a taxa de inflação vai ser de 6,3 ou 6,7 ao fim do ano, cai em outubro e sobe em novembro. Como podem saber? Como se mede isso? Por que não tomam medidas essenciais como cortar gastos públicos em vez dessa irritante roleta brasileira de palpites? Claro que os ‘pentelhos’ e seus aliados feudais não deixam.

  Por que as paradas gay têm três milhões e os evangélicos quatro milhões e a marcha contra a corrupção no Rio só 2.500 pessoas? É a medida clara de nossa alienação política. E as queimadas e desmatamentos? O governo fala disso como se referisse a outro país, com um lamento impotente: “O equivalente a mil campos de futebol foram queimados em um mês…”. Por que a medida ‘campos de futebol’? Para deprimir corintianos? Aliás, entristece-me ver os times de futebol com anúncios no peito dos jogadores. Sou um babaca romântico, claro. Mas os times heroicos vendendo Hyundai e Kalunga me doem.

  E os garçons simpáticos? Sempre que eu peço um guaraná, ouço invariavelmente: “Com gelo e laranja?”. Por quê? O meu guaraná indígena não basta? Sempre tenho a esperança de encontrar um “old timer” que me pisque o olho e faça a bela pergunta antiga: “Da Brahma ou da Antártica?”.

  E a demarcação das terras indígenas, e as paisagens condenadas? É politicamente incorreto ser contra 11 mil índios que dispõem de dez mil metros quadrados cada um na ‘Raposa do Sol’, índios de bermuda e relógio. Por quê? Não podemos mais admirar uma paisagem sem que um chato não diga: “Olha bem, que está acabando…”. 

  Repugnam-me células fotoelétricas em bicas de banheiros chiques. Você mete a mão ensaboada debaixo de uma bica dourada e a água não sai. Você tenta de novo, nada; até que o faxineiro te instrui a posição certa, esperando gorjeta, mas a água jorra e para, antes de lavar o sabão cor-de-rosa ou cor de diarreia. E o aparelho de secar mão que uiva como uma boca de hipopótamo? E os cremes de rosto e dentes, com a bisnaga vazia pela metade, para faturar uns reais dos otários? E as giletes turbinadas cujas caixas só têm duas unidades? E o papel higiênico ‘folha fina’, que se esgarça entre as unhas? Abomino e-mails em cascata, com as piadinhas da hora, tenho asco de pequenas besteirinhas como gente dizendo-me “bom descanso” ou “bom trabalho”, pagode careta, casais que se casam e se separam na Caras, e, pasmem, não aguento mais ‘bunda’. Isso, no bom sentido, claro, mas não aguento mais ver ‘melancias, melões e moranguinhos’ em toda parte, outdoors, revistas… A economia de consumo é embalada pelas bundas. Viram? A paranoia está batendo… Santo Deus, que será de mim?

“Isso é uma merda, mas é supercontemporâneo!…”. O Novo Acordo Ortográfico trouxe algumas dificuldades para aqueles que se aventuram na língua escrita. O termo destacado acima é exemplo disso. Das palavras abaixo, indique a que aparece em desacordo com a norma culta:

Alternativas
Comentários
  • GABARITO -A

    A regrinha é simplória, mas salva a sua pele...

    " Os iguais se repelem e os diferentes se atraem ".

    a) Arqui- inimigo;

    b) Semicírculo;

    c) Extraoficial;

    d) Anti-inflamatório;

    e) Minissaia.

    Quando o primeiro elemento termina com vogal e o segundo inicia com " r " ou "s " = duplicamos o R ou S.

    Mini + saia = Minissaia.

  • Isso em 2013... imagina como está a realidade de 2020... imagina daqui a 05 anos...

    Obs: O texto é grandinho, mas leiam, vale muito a pena.

  • O emprego do hífen está intimamente atrelado à ortografia, ou seja, a escrita correta das palavras. O enunciado fez explícita menção ao Novo Acordo Ortográfico, obrigatoriamente em voga no Brasil desde 2016. Dessa forma, faz-se imprescindível que o temos em conta.

    Inspecionemos a fim de encontrar incorreta palavra sob a óptica do Acordo:

    a) Arquiinimigo;

    Incorreto. O prefixo "aqui-" termina em vogal (i) idêntica à que inicia o elemento seguinte (inimigo), de modo que o hífen se torna elemento indispensável. Correção: "Arqui-inimigo".

    b) Semicírculo;

    Correto. O prefixo "semi-" termina em vogal (i) e o elemento seguinte se inicia com consoante diferente de "h", portanto a união é legítima;

    c) Extraoficial;

    Correto. O prefixo "extra-" termina em vogal (a) e o elemento seguinte se inicia com uma diferente, portanto a união é legítima;

    d) Anti-inflamatório;

    Correto. Consoante visto no início do comentário, esse prefixo deve ser separado por hífen do elemento seguinte se este iniciar-se com vogal "i";

    e) Minissaia.

    Correto. Em geral, se o prefixo terminar em vogal e o elemento seguinte iniciar-se com "s" ou "r", estas duas consoantes são dobradas (p.ex.: pseudossábio, suprarrelacionado).

    Letra A

  • GABA - Arquiinimigo;

    Arqui - inimigo-------- correto

  • O Vai - Vai( vogal + vogal igual, se separa)

  • Pilares do hífen: Regra Geral = palavra-base inicia com H tem hífen

    Vogais = diferentes ⇒ palavras aglutinadas/juntas. iguais ⇒ com hífen.

    Consoantes = mesma regra.

  • Eu até tava lendo o texto, mas é difícil aturar gente que se acha a filósofa contemporânea perdida no que juga ser as piadas do século.

  • Os opostos se atraem ou seja ( Os diferentes se atraem, logo os iguais se repelem ou seja há hífen nos iguais e não há hífen nos diferentes)

  • Os iguais de repelem , os diferentes se atraem

  • Vogal igual Hifen é legal!

  • Matheus Oliveira....Vc e uma fera..Obrigado vc ta praticamente em todos as questões com comentários sensacionais...Obrigado,......