13 de maio
Eu tenho tanta dó dos meus filhos. Quando eles vêem as coisas de
comer eles bradam: Viva a mamãe. A manifestação me agrada. Mas
eu já perdi o hábito de sorrir. Dez minutos depois eles querem mais
comida. Eu mandei o João pedir um pouquinho de gordura pra Dona
Ida. Ela não tinha. Mandei-lhe um bilhete assim: “Dona Ida peço-te
se pode me arranjar um pouco de gordura, para eu fazer uma sopa
para os meninos. Hoje choveu e eu não pude ir catar papel. Agradeço.
Carolina.”
Choveu, esfriou. É o inverno que chega. E no inverno a gente come
mais. A minha filha Vera começou pedir comida. E eu não tinha. Era a
reprise do espetáculo. Eu estava com dois cruzeiros. Pretendia comprar
um pouco de farinha para fazer um virado. Fui pedir um pouco de
banha a dona Alice. Ela me deu a banha e arroz. Era 9 horas da noite
quando comemos.
E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura
atual, a fome!
JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. 10. ed. São
Paulo: Editora Ática, 2019.
Nesse fragmento, a alusão à data 13 de maio reforça a(o)